Intervenções artísticas na mídia são tema de exposição

Público pode ver trabalhos produzidos nos últimos 60 anos que foram inseridos em jornais, programas de televisão e difundidos na internet

Até 02 de dezembro de 2018

Domingo - Terça - Quarta - Quinta - Sexta - Sábado

De terça a sexta, das 10h às 21h30, aos sábados, domingos e feriados, das 10h às 18h

Grátis

Site: sescsp.org.br

Telefone: (11) 3871-7700

Nova exposição do Sesc Pompeia explora as potencialidades da arte quando se alia a mídia de massa. Em cartaz entre 29 de agosto e 2 de dezembro, a mostra “Arte-Veículo” apresenta trabalhos de artistas que realizaram intervenções artísticas em diversos meios de comunicação. A entrada é gratuita.

Sesc Pompeia
Créditos: Google Street View
Sesc Pompeia

A curadora Ana Maria Maia selecionou mais de 200 obras produzidas por 47 artistas e grupos de diferentes gerações. Entre eles, Analívia Cordeiro, Antonio Manuel, Aretha Sadick e Explode!, Cildo Meirelles, Eduardo Coutinho, Márcia X., Neide Sá, Nuno Ramos, videohackers e Yuri Firmeza.

Foram trabalhos realizados nos últimos 60 anos, período que começa com o surgimento da televisão no Brasil, na década de 1950, e vai até a popularização da internet no país, nos anos 2000, passando pelo auge dos jornais impressos.

Algumas obras serão reinseridas na imprensa, como Entre elas,  “Furos” (1989/2018), de Jac Leirner. Dentro de um projeto comissionado pelo Jornal da Tarde (SP), a artista agiu sobre o processo de impressão e fez com que as páginas recebessem pequenas fissuras. Praticamente em branco, elas carregaram apenas as marcas como narrativa e o duplo sentido do título, já que furo também significa uma notícia em primeira mão.

Para dar continuidade ao arquivo e à memória sobre intervenções midiáticas no Brasil, a “Arte-veículo” torna-se um canal permanente no YouTube. Nessa rede, serão indexados alguns trabalhos em suporte audiovisual provenientes de outras páginas. A partir de agosto de 2018, o canal também passa a receber depoimentos em vídeo de artistas e grupos participantes do projeto.

Núcleos temáticos

As obras foram divididas em sete núcleos temáticos. O primeiro deles, “Perder-se” apresenta obras em que a visibilidade do artista não é necessária. Na maior parte dos casos, esses artistas atuaram de maneira clandestina em grandes veículos, disseminando um pensamento crítico, sobretudo na época da ditadura militar.

Entre elas está “Clandestinas” (1975), de Antonio Manuel. Em caráter extraoficial, mas com a confiança de funcionários do jornal O Dia (RJ), o artista acessou a arte-final das capas de nove edições e substituiu algumas fotografias e textos, imprimindo tiragens alternativas em que notícias e ficções se misturavam. Outro destaque deste núcleo é “A Corda”, de Neide Sá (1967/2010), uma obra colaborativa em que o público constrói um varal com recortes de textos e imagens da imprensa, atribuindo novos significados ao material.

No núcleo “Sair às Ruas” estão trabalhos de artistas que fugiram das mostras tradicionais para atuar na esfera pública, deixando as páginas de cultura para ganhar espaço nas editorias de cotidiano.

Nesta seção, um dos destaques é o Grupo Manga Rosa, que apresenta “Primeiro passo, conquistar espaços” (1981-1982/2018), um outdoor que durante um ano abriu espaço para outros artistas na Rua Consolação, em frente à praça Roosevelt, dando visibilidade e escala urbana aos seus trabalhos. Também serão exibidos diferentes vídeos da TV Viva, grupo que veiculava sua programação de forma itinerante em bairros da periferia de Olinda e de Recife (PE). Um deles é o fala povo “Bom dia Déo: Quem tem medo?” (1984).

O terceiro núcleo é “Duelar”, em que os dos artistas criaram duelos simbólicos com a mídia hegemônica. “A situação” (1978), uma das primeiras obras de videoarte do Brasil, tem Geraldo Anhaia Mello como âncora de telejornal. O artista tenta divulgar uma notícia sobre o duro período vivido pelo país enquanto se embriaga em frente à câmera. Na noite de abertura da mostra e no dia 1 de dezembro, Aretha Sadick e Explode! apresentam “Vera Verão” (2017-2018), uma performance a partir da personagem vivida pelo ator Jorge Lafond na TV brasileira, alvo de estereótipos, mas também dona de um sarcasmo afiado.

Há também o núcleo “Hackear”, em que estão trabalhos feitos por artistas e grupos que, de diferentes maneiras, se alojaram nas grandes corporações para tentar minar sua força ou orientá-la para objetivos opostos. O objetivo é criar modelos de comunicação livre e em rede. A discussão abrange representantes do movimento de Mídia Tática, ocorrido no Brasil e no mundo no início dos anos 2000.

Nele está o vídeo “Barraco da Grobo” (2003), dos videohackers. Uma equipe do SPTV (TV Globo) fazia a cobertura do Festival Mídia Tática Brasil, em São Paulo, mas repórter e organizadores se desentenderam. A matéria não foi exibida na TV, mas o registro do confronto feito pela equipe do evento foi publicado na internet.

Outro núcleo é “Ouviver”, em que são mostradas intervenções artísticas que ajudaram a reverberar vozes silenciadas por muito tempo. Um dos destaques é o trabalho de Éder Oliveira: grandes retratos de jovens das periferias de Belém, suspeitos de crimes e que estampam as páginas policiais da imprensa paraense. Nesta seção também tem o trabalho “Seis dias em Ouricuri” (1976), de Eduardo Coutinho. O documentarista atuava como diretor do programa Globo Repórter (TV Globo) e, à revelia do manual de redação da emissora, que determinava planos de entrevistas curtos e objetivos, ele saia em campo para praticar escutas longas e atentas dos seus entrevistados.

Com o objetivo de questionar a noção de verdade propagada pela imprensa, nasceu o núcleo “Ficcionalizar”. Os artistas presentes nesta seção mostram como formas diferentes de narrar uma história podem criar versões subjetivas e questionáveis de verdade.

Em “Soap Opera” (1990), uma videoinstalação de Aimberê César e Márcia X., um mesmo vídeo é exibido em quatro telas diferentes, tendo alteradas as escalas de cor das imagens e a trilha sonora. Em “Souzousareta Geijutsuka” (2006), Yuri Firmeza inventou um artista para participar de um projeto no Museu de Arte Contemporânea de Fortaleza. Com a equipe do museu e uma assessoria de imprensa, ele forjou um currículo internacional e um completo material de divulgação e a farsa só foi revelada na abertura da mostra, suscitando um debate acalorado nos veículos da cidade e do país.

Frame de vídeo “Soap Opera”, de Aimberê César e Márcia X.
Créditos: Reprodução
Frame de vídeo “Soap Opera”, de Aimberê César e Márcia X.

Por fim, a última parte da exposição tem como tema “Experimentar a Linguagem”, em que são exibidos trabalhos de artistas que utilizaram redações de jornais e estúdios de TV como laboratórios de pesquisa.

Uma das pioneiras do vídeo no Brasil, Analívia Cordeiro realizou uma sequência de obras nos estúdios da TV Cultura, em São Paulo. “M3X3” (1973), a primeira delas, é uma coreografia de videodança para nove bailarinas e três câmeras. Já Nuno Ramos utilizou falas editadas de William Bonner e Renata Vasconcelos, apresentadores do Jornal Nacional (TV Globo), os fazendo “cantar” a música “Lígia” (2017), de Tom Jobim.