Ataque à China é tentativa de Bolsonaro para sabotar vacinas no Brasil

A agressão de Bolsonaro ao país aliado ocorre num momento em que os esforços brasileiros deveriam ser direcionados à ampliação da vacinação

Os recentes ataques do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) à China, maior parceiro comercial e principal fornecedor de insumos para a produção de vacinas contra covid-19 no nosso país, tem como objetivo reforçar a campanha de sabotagem impetrada pelo seu governo à imunização do povo brasileiro.

Ataque à China é tentativa de Bolsonaro para sabotar vacinas no Brasil
Créditos: Reprodução
Ataque à China é tentativa de Bolsonaro para sabotar vacinas no Brasil

Em discurso na quarta-feira (5), Jair Bolsonaro insinuou que a China teria criado o coronavírus para realizar uma “guerra química”, pois, segundo ele, foi o país “que mais cresceu seu PIB”.

“É um vírus novo, ninguém sabe se nasceu em laboratório ou nasceu porque um ser humano ingeriu um animal inadequado. Mas está aí, os militares sabem que é guerra química, bacteriológica e radiológica. Será que não estamos enfrentando uma nova guerra?”, disse Bolsonaro em evento promovido pelo ministério das Comunicações, no Palácio do Planalto, no dia em que senadores ouviram o ex-ministro Nelson Teich (Saúde) na CPI da covid-19.

Em seguida, ele questionou: “qual o país que mais cresceu seu PIB? Não vou dizer para vocês”, em uma referência ao crescimento de 2,3% do Produto Interno Bruto chinês em 2020.

A agressão de Bolsonaro ao país aliado ocorre num momento em que os esforços brasileiros deveriam ser direcionados à ampliação da vacinação contra o coronavírus. Mas, com sua política negacionista, ele prefere atuar para sabotar a luta contra o vírus, mantendo a população refém da pandemia.

Das três vacinas utilizadas atualmente no Brasil – CoronaVac, AstraZeneca e Pfizer – duas, dependem diretamente da importação dos insumos vindos da China. Os contratos do Instituto Butantan com o laboratório chinês Sinovac e da Fiocruz com a multinacional Astrazeneca, prevêem a entrega de 200 milhões de doses de imunizantes, o suficiente para imunizar 100 milhões de brasileiros.

Assim como a CoronaVac, os insumos da vacina comercializada pela AstraZeneca são produzidos em indústrias farmacológicas localizadas na China.

Mas, para o negacionismo bolsonarista, é preferível atacar a nação chinesa.

Alerta

O Instituto Butantan alertou que as declarações de Bolsonaro podem dificultar a liberação de insumos pelas autoridades chinesas para fabricação no Brasil. “Todas as declarações neste sentido têm repercussão. Nós já tivemos um grande problema no começo do ano e estamos enfrentando de novo esse problema”, disse o presidente do Butantan, Dimas Covas.

Segundo ele, o governo federal “tem remado contra” os esforços pela vacina.

Covas explicou que a próxima liberação de insumos teve a data de autorização adiada do dia 10 para o dia 13. O volume inicial seria de 6 mil litros, agora a expectativa é de 2 mil litros. Para ele, as mudanças não são da produção da Sinovac e sim determinadas pelas autorizações das autoridades chinesas.

“Pode faltar [insumos]? Pode faltar. E aí nós temos que debitar isso principalmente ao nosso governo federal que tem remado contra”, disse Covas.

Ele acrescentou ainda que há várias informações mentirosas e mirabolantes no discurso do discurso do presidente, citando que teria havido uma fabricação do vírus.

O governador de São Paulo, João Doria, também fez críticas à postura de Bolsonaro e seu governo. “Diante de uma pandemia, o insumo da principal vacina que vai no braço dos brasileiros vem da China, o mal estar provocado por sucessivas declarações desastrosas do ministro da Economia Paulo Guedes e agora do presidente da República Jair Bolsonaro, e o Ministério das Relações Exteriores silencia. Que Ministério das Relações Exteriores é esse que não faz relações positivas, construtivas, com países, seja pela economia, seja pelo fato de que a China é a principal provedora de insumos para as vacinas?”, questionou.

Resposta

Diferentemente de Bolsonaro, a China procurou amenizar uma possível discussão motivada pela declaração do presidente brasileiro. O porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, Wang Wenbin, afirmou que o país asiático se “opõe firmemente a qualquer tentativa de politizar e estigmatizar o vírus”.

O diplomata ainda destacou que o verdadeiro inimigo atualmente é o vírus, e que os países devem se unir para derrotá-lo. “O vírus é o inimigo comum da humanidade. A tarefa urgente agora é que todos os países se unam na cooperação e se esforcem por uma vitória rápida e completa sobre a epidemia”, ressaltou Wang Wenbin.

Reincidência

Ainda no contexto do boicote de Bolsonaro a todos os imunizantes, vale lembrar que ele chegou a desautorizar a compra da CoronaVac, anunciada por seu próprio ministro da Saúde, na época, Eduardo Pazuello. Negou-se a se vacinar e, em uma série de entrevistas, afirmou que as vacinas provocariam doenças, deformações e até mortes.

Para obter sucesso em sua campanha antivacina, Bolsonaro também promoveu o aparelhamento da direção da Anvisa, órgão responsável pela aprovação de imunizantes. Colocou na presidência o negacionista Antônio Barra Torres, que, em plena pandemia, participava junto com ele, sem máscara, das aglomerações realizadas semanalmente na Praça dos Três Poderes.

Com Barra Torres na presidência da Anvisa, a vacina russa, Sputnik V, ainda não teve registro emergencial aprovado e a ButanVac, do Instituto Butantan, teve o pedido de início dos estudos em humanos, negado.

O governo Jair Bolsonaro ainda recusou onze ofertas formais de empresas farmacêuticas de fornecimento de vacinas contra o novo coronavírus. Das 11 negativas, seis foram dadas ao Instituto Butantan, referente ao imunizante a CoronaVac.

O diretor do órgão, Dimas Covas, enviou três ofícios ao Ministério da Saúde oferecendo a vacina, datados de 30 de julho, de 18 de agosto e 7 de outubro do ano passado, sendo este último entregue pessoalmente ao então chefe da pasta, o general Eduardo Pazuello.

Em agosto de 2020, foi dada a primeira das três negativas ao laboratório estadunidense Pfizer. Somente nesta ocasião, o Brasil perdeu 70 milhões de doses que seriam entregues já em dezembro do ano passado.