Dimenstein: os inimigos do jornalismo são inimigos do povo

Olavo de Carvalho, guru do clã Bolsonaro, escreveu nas redes sociais que nós, jornalistas, somos “inimigos do povo”.
Ele faz coro com o que pensa e sente os novos donos do poder – a começar de Jair Bolsonaro e família que imaginam os jornalistas como uma rede conspiratória de “esquerda”.
No Brasil de hoje em dia qualquer coisa o transforma em “esquerda”. Na ignorância das redes sociais, sou chamado de “comunista”, apesar de ter ojeriza a qualquer forma de regime autoritário, ser favorável à economia de mercado e ter profundas desconfianças das burocracias estatais.
O que me incomoda é chegar ao século 21 obrigado a repetir uma obviedade: jornalistas cometem erros. Mas, sem eles, não há transparência. Sem transparência, não há democracia.
Sou de uma geração de jornalistas que denunciou as arbitrariedades do regime militar. Depois as redes de corrupção dos governos eleitos: de Sarney, passando por Collor, até Lula, Dilma e Temer.
Não haveria Lavo Jato nem Mensalão se a imprensa não estivesse ao lado dos promotores e juízes.
No meu caso, além de mostrar por vários anos as falcatruas do poder, denunciei em inúmeras reportagens a violência contra crianças em adolescentes que ajudaram a colocar no topo da agenda nacional a temática da infância. Antes dessa onda evangélica contra a pedofilia, eu viajava pelo Brasil investigando a exploração sexual contra meninos e meninas que tiveram repercussão em todo o mundo.
A onda de busca de transparência ajudou a colocar Bolsonaro no poder – como sempre fizemos, seremos críticos.
Mas, agora, estamos virando “inimigos do povo” na visão de Olavo de Carvalho, expressando o que pensam os Bolsonaros – aliás, eu investiguei Olavo de Carvalho, descobri suas mentiras e irregularidades, além de frases como “cigarro faz bem para saúde” ou criticas à vacinação infantil.
Natural que o guru da ignorância tenha ódio da imprensa – afinal, estamos mostrando como ele é um charlatão, fraudando seu currículo.
Mas ele é apenas um detalhe de algo mais terrível: uma onda autoritária que não convive direito com a liberdade de expressão, indo da Rússia, Venezuela Polônia, Hungria, até Arábia Saudita e Estados Unidos, da Era Trump.
Para mim, os verdadeiros inimigos do povo são os inimigos do jornalismo: não suportam as luzes que entram pelas janelas que abrimos. Nem os holofotes que colocamos nas trevas.
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