Alimentos cultivados por crianças viram almoço na cracolândia

Colégio em Jundiaí dá exemplo de boas práticas ao envolver educação, inclusão social, meio ambiente e cidadania

Por: Jéssica Lima

Um pedacinho do paraíso: é assim que a professora Andressa Rossi conta que ela e os demais funcionários do Colégio São Vicente de Paulo – Unidade 2 definem a área que abriga o colégio verde, destinado a educação infantil em Ivoturucaia, na cidade de Jundiaí (SP), que ensina noções de meio ambiente a 300 crianças de até 6 anos.

O projeto Escola Verde Social existe há dois anos em Jundiaí (SP) e produz cerca de 650 quilos de hortaliças por mês

A instituição dá exemplo de boas práticas ao envolver educação, inclusão social, meio ambiente e cidadania: as aulas pedagógicas se misturam ao incentivo de cultivar recursos naturais e, o mais importante, ajudar o próximo, já que parte desses alimentos são doados a pessoas em situação de rua que moram na região conhecida como cracolândia, no centro da capital paulista.

Os Colégios Vicentinos são uma rede de cinco escolas particulares e desde 2015 a unidade de Jundiaí também oferece o projeto Escola Verde Social, que dá bolsas de estudo para crianças de baixa renda e conveniadas com a prefeitura do município para serem ensinadas a plantar, colher e produzir os mais variados tipos de frutas, verduras e legumes numa área de 3.000 metros quadrados.

Esse projeto visa combater a obesidade infantil e tratar o tema na prática. “As crianças trabalham no plantio mais para a noção do consumo consciente e do ambientalismo e para ajudar na questão da alimentação saudável”, explica a diretora-adjunta da unidade, Danielle Audrey.

Ela conta que a maior dificuldade para as crianças comerem de forma saudável, hoje, é o mundo externo, por ser fácil encontrar uma alimentação pobre em nutrientes, mas que já vem pronta. “Então a mãe chega cansada, a família não quer fazer, e ela acaba dando um outro tipo de alimento. E a escola vem brigar com isso.”

Para entrar nessa “briga”, os professores e nutricionistas do colégio verde abordaram algumas táticas, do tipo dizer que “quem comer muita salada ganha a corrida”, completa Danielle.

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“Os ganhos pedagógicos são plenos porque as crianças podem vivenciar aquilo que nós ensinamos na sala de aula. Por exemplo, o plantio. Não fica só na lousa”, comenta a professora Andressa Rossi.

Os alunos Ruan, Lígia e Vinícius têm 4 anos e suas preferências são bem peculiares: O Ruan gosta de rúcula, a Lígia, de alface, e o Vinícius, de cenoura. “Eu gosto de comer beterraba para ficar forte igual o Hulk”, conta Vinícius.

São produzidos cerca de 350 quilos de hortaliças por mês que abastecem mais quatro unidades do colégio, além do Lar Nossa Senhora das Graças, que cuida de idosos, a Casa de Formação das Irmãs de São Vicente e o Centro de Convivência São Vicente de Paulo, localizado na cracolândia e que atende moradores de rua.

Este centro é administrado pela irmã Rosina e ela conta que tudo começou há 70 anos na alameda Barros, também no centro da capital, onde as irmãs já atendiam pessoas em situação de rua na própria congregação. “Eles vinham à porta pedir alimentos e se dava o que podia, mas era de uma maneira muito empírica.”

Na igreja foi feito um refeitório que ficou pequeno para atender a demanda e então as irmãs se mudaram para a alameda Dino Bueno. “Hoje nós estamos com mais de 600 atendidos diariamente e faz 20 anos que estou aqui. E a gente está sempre atendendo, sempre proporcionando alguma coisa para eles melhorarem de vida”, explica.

“Atendemos de uma maneira bastante humana e também procurando fazer com que eles saiam da estagnação que vivem porque, em geral, o idoso, sobretudo, e aqueles que estão na rua, ficam meio parados no sentido de promoção pessoal, ficam desanimados.”

O Centro de Convivência São Vicente de Paulo fica na região da cracolândia e atende cerca de 650 pessoas por dia

No centro, há espaço para eles tomarem banho, lavarem roupas, fazerem cursos, participarem de palestras, e, claro, se alimentarem com café da manhã, almoço e sopa, à tarde.

José Mendes, 58, trabalhava com construção civil, mas está desempregado e mora em uma comunidade. “Já tem um tempo que frequento aqui e sou voluntário. Presto serviço porque minha família é evangélica e acho bom. Estive fazendo uns tratamentos, a casa me apoiou e me ajudou bastante. Me ajuda, então eu presto serviço voluntário“, contou.

Já Joana Dark, 54, conheceu o lugar por um amigo. “A primeira vez que eu vim aqui eu fiquei meio assustada e falei ‘meu Deus do céu, que comida gostosa é essa?’, relembra. Hoje, ela diz que não fica mais sem ir ao centro de convivência.

Depois da primeira visita, cada pessoa precisa passar por consulta com uma assistente social e recebe uma ficha que tem o prazo de uma semana. Em cada alimentação, o dono da ficha ganha um carimbo para controle da instituição.

“Se eu não vier aqui, meu dia não está completo. Aqui eu me sinto bem. Tem feijoada, todo dia uma salada diferente, é um chocolate, é um suco, é uma fruta… Eu preciso me alimentar de verdade, eu preciso ganhar peso, entendeu? Porque eu também tomo remédio antidepressivo. Então, Deus quase me falou ‘você tem que ir para um lugar para se alimentar bem, comer feijão, comer arroz, comer carne, verdura’. E aqui tem muita verdura”, completa Joana.

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