Da estrada para o palco, caminhoneira protagoniza espetáculo sobre violência contra a mulher

Vítima de violência doméstica, Cássia Claro usa experiência nos palcos para conscientizar as mulheres de todo país

Quando trabalhava como costureira, Clássia Claro queria mesmo era pôr os pés na estrada, com o sonho de viajar por aí, na boleia de um caminhão. Tirou carteira de habilitação categoria “E”, largou o antigo emprego e, decidida a mudar de vida, foi em busca da sua verdadeira vocação.

Até que certo dia uma oportunidade de emprego, numa conhecida montadora norte-americana, abriria caminho para o seu destino que começava a ser escrito: assim virou caminhoneira na sua sina de andar por esse país. “Como motorista de teste a gente precisava dirigir de 300 a 600 quilômetros dependendo do dia, passando por serras e estradas mais difíceis pra testar o limite do caminhão”, lembra Cássia.

Após algum tempo viajando e vivendo aquilo que tanto imaginou, Cássia foi surpreendida por um corte em massa na empresa, que resultou na demissão de centenas de funcionários da fábrica onde trabalhava. Entre um bico e outro, voltou a ser instrutora de direção.

Cássia Claro em cena durante caravana realizada no ano passado
Cássia Claro em cena durante caravana realizada no ano passado

Não demorou muito e foi chamada para integrar a Caravana Siga Bem, projeto itinerante que leva espetáculos teatrais educativos e ações de cidadania às estradas de todo Brasil.

Há dois com a companhia que é formada só por caminhoneiros, hoje é uma das protagonistas da peça “O Cassino do Cupido” inspirada no clássico programa do Chacrinha, que aborda a violência doméstica contra a mulher.

Nos palcos, Cássia trouxe sua própria experiência interpretar a personagem “Terezinha”. “Há mais ou menos um ano eu vivia com um antigo companheiro que um dia me violentou. Mas como ele era uma pessoa trabalhadora, honesta, a princípio, não quis aceitar que ele tinha se tornado um agressor. Até que um dia fui agredida novamente, mas dessa vez na frente da minha mãe. Que depois de presenciar a agressão, passou muito mal, mas sentou com nós dois e nos ajudou a dar um basta naquela situação”, relata a atriz e caminhoneira, que hora vive com o filho de 12 anos “independente” e “feliz”.

Crédito: Fred Cursino 

A caravana segue viagem pelo Brasil com destino a diversas cidades, apresentando teatro em postos de gasolina onde param os motoristas. O projeto oferece também palestras sobre segurança, mecânica, temas ligados a utilidade pública como exploração infantil e violência contra mulher, além de corte de cabelo e até massagem.

Dividida em dois comboios, que seguem para diferentes regiões do país, a caravana levará no tema “violência contra a mulher” para pequenas comunidades Brasil afora.”Pra mim é uma satisfação muito grande relatar a violência que sofri. Eu não tenho vergonha por ter passado o que passei. E é importante falar sobre o assunto, para que um dia ele não aconteça mais. Eu quero ajudar outras mulheres, que como eu, um dia passaram por isso”, ressalta Cássia.

Cassino cupido: violência contra a mulher nos palcos

A nona edição da Caravana Siga Bem aposta em um velho conhecido para apresentar o Cassino do Cupido: o ‘velho guerreiro’ Chacrinha. Sob o tema “Cassino do Cupido”, a peça, escrita pelo jornalista Josemir Medeiros da Silva e dirigida por Tito Teijido, traz um novo desafio: conscientizar os caminhoneiros sobre a questão da violência contra a mulher. “No programa do Chacrinha tinha um quadro, que se chamava ‘Namoro na TV’. Na época, o ‘velho guerreiro queria mostrar ao público o que era ser um homem de verdade, respeitando a mulher”, explica Tito. 

Segundo ele, a peça teatral é um show, que será encenado pelos próprios caminhoneiros e produtores do projeto. Assim como no programa do Chacrinha, o “Cassino do Cupido” terá a participação de jurados e da plateia. “É um espetáculo popular, mas divertido, que traz a história de uma mulher na busca por um companheiro. Terezinha vai ao palco da Caravana para escolher um dos dois caminhoneiros, um deles faz o papel do bonitão, mas bem mau- caráter; enquanto o outro é educado, mas longe de ser bonitão. Pelo contrário, bem rústico”, esclarece.

A peça “Cassino do Cupido” teve consultoria do Instituto Patrícia Galvão, e tem como principal objetivo conscientizar os visitantes sobre a violência contra a mulher.

Balanço 2014 – Ligue 180 – Secretaria de Políticas para as Mulheres

53 mil mulheres agredidas

Em 2014, do total de 52.957 relatos de violência contra a mulher, 27.369 corresponderam a relatos de violência física (51,68%), 16.846 de violência psicológica (31,81%), 5.126 de violência moral (9,68%), 1.028 de violência patrimonial (1,94%), 1.517 de violência sexual (2,86%), 931 de cárcere privado (1,76%) e 140 de tráfico de pessoas (0,26%).

Cidades com maior número de atendimentos: Campo Grande (MS), Brasília (DF) e Vitória (ES)

Campo Grande (MS) foi a capital com a maior taxa de atendimentos registrados, seguida por Brasília (DF) e Vitória (ES). Foi em Campo Grande que a Secretaria de Políticas para as Mulheres inaugurou a primeira Casa da Mulher Brasileira, em fevereiro de 2015. Entre as unidades da federação, a maior procura pelo Ligue 180 foi no Distrito Federal, seguida por Mato Grosso do Sul e Rio de Janeiro. Em 2014, o Ligue 180 atendeu a todas as 27 unidades da federação, cobrindo 3.853 dos 5.570 municípios brasileiros (69,1%).

Estados com mais denúncias: DF, MS e RJ

O Distrito Federal é a unidade da federação com a maior taxa de registro de atendimentos no Ligue 180 em 2014. Em segundo lugar está o Mato Grosso do Sul e, em terceiro, o Rio de Janeiro.

Vínculo afetivo

Em mais de 80% dos casos, a violência foi cometida por homens com quem as vítimas têm ou tiveram algum vínculo afetivo: atuais ou ex-companheiros, cônjuges, namorados ou amantes das vítimas.

Como soube do Ligue 180?

A mídia (categoria composta por televisão, rádio, jornal, revistas e internet) teve notório papel na divulgação do Ligue 180, conforme destaques a seguir: 62% das usuárias tomaram conhecimento do Ligue 180 por meio da mídia. A televisão foi responsável por 47% da procura pelo serviço. O impacto da televisão na divulgação do Ligue 180 mais que dobrou a procura pelo serviço em relação a 2013. Houve um aumento de 113% no número de usuárias que apontaram a televisão como forma de primeiro contato com o serviço

Mapa da Violência – 2012

– Dados de feminicídio no Brasil

– De 1980 a 2010, 92.100 mulheres foram vítimas de feminicídio

– Entre 2000 e 2010, 43.654 mulheres foram assassinadas

– Apenas em 2010, 4.465 mulheres foram assassinadas (4,6 a cada 100 brasileiras). Média de mais de 12 mortes por dia

– Brasil é o 7º país com maior taxa de homicídios a cada 100 mil mulheres.

– A maior parte das vítimas tem entre 20 e 29 anos