Fazenda que reproduzia escravidão para turismo é punida por MPF

A Fazenda Santa Eufrásia fazia encenação na qual negros eram escravos e a proprietária branca era sinhá

A Fazenda Santa Eufrásia

O caso da Fazenda Santa Eufrásia, que fica em Vassouras (RJ), chamou a atenção pela bizarrice e por reforçar estereótipos racistas.

Nela, turistas podiam “brincar” de serem donos de pessoas escravizadas por um dia. Em uma reportagem, é mostrado que a visitação à propriedade particular incluía uma encenação na qual a dona recebia os turistas vestida de sinhá, enquanto pessoas negras eram vestidas como escravas.

A atração era comercializada por valores entre R$ 35 e R$ 65.

A fazenda é tombada pelo Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) desde 1970 e teve escravos no século XIX. “Geralmente eu tenho uma mucama, mas ela fugiu. Ela foi pro mato. Já mandei o capitão do mato atrás dela, mas ela não voltou”, dizia na encenação Elizabeth Dolson, uma das bisnetas do coronel Horácio José de Lemos, que adquiriu a fazenda em 1895.

“Racismo? Por causa de quê? Por que eu me visto de sinhá e tenho mucamas que se vestem de mucamas? Que isso! Não! Não faço nada racista aqui”, respondeu ela à reportagem quando perguntada sobre o racismo representado na atração.

Esse não foi o mesmo entendimento do Ministério Público Federal (MPF) em Volta Redonda (RJ). Depois da repercussão do caso, o MPF abriu inquérito que apurou “a violação de direitos fundamentais na programação turística da Fazenda Santa Eufrásia, bem como a possível violação ao patrimônio histórico, tendo em vista a sua finalidade de educação e reparação simbólica de violações de direitos perpetradas no local em tempos passados”, disse a entidade pública.

Diante disso, a fazenda e o MPF ajustaram um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) para “assegurar a não realização da encenação sobre a ‘escravidão’ para turistas, bem como para estabelecer medidas reparatórias”.

O termo foi feito com base em recomendações de comunidades quilombolas, do movimento negro e de docentes da Universidade Federal Fluminense.

Entre as medidas, está proibida a encenação na fazenda ou qualquer outra plataforma. Além disso, a palavra escrava fica proibida de ser usada, sendo substituída pela expressão “pessoa escravizada”:

“Com isso, vamos contribuir para a superação da associação da imagem do negro ao ‘escravo’ em nossa sociedade e de esclarecer que africanos e seus descendentes foram escravizados e não ‘nasceram escravos’ e que ninguém ‘descende de escravos’, tratando-se de pessoas, de homens e mulheres, de seres humanos que foram criminosa e injustamente escravizados”, explica o procurador da República Julio José Araújo.

A fazenda também deverá instalar placas mostrando a história do local e a lista das 162 pessoas que foram escravizadas lá no ano de 1880, além de outros cartazes explicativos.

Outra medida que deve ser adotada é a capacitação dos funcionários por parte de lideranças negras, para mostrar a história de resistência e luta de seus antepassados.

Caso o acordo seja descumprido, será aplicada uma multa diária de R$ 5 mil.

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