Glória Perez recebe críticas de trans por erros em ‘Ivana’

A trama da autora contém erros que desagradaram a Associação Nacional de Travestis e Transexuais, que explica o que acontece

Glória Perez
Glória Perez

A Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra) enviou uma carta com críticas à autora Glória Perez, de “A Força do Querer”, por alguns erros que a trama possui em relação a personagens travestis e transexuais, como Ivana  e Elis Miranda.

O texto, publicado no dia 8 no Facebook, é assinado pela presidente da entidade, Keila Simpson, e reconhece a importância da obra da Rede Globo quando aborda a questão da transexualidade e transmasculinidade, apesar da novela deixar a desejar em alguns pontos.

“No nosso entendimento, a personagem é um homem trans”, diz a Antra sobre Ivana, e não um transgênero.

Segundo a mesma entidade, outra falha da autora acontece ao se referir a travestis, como a personagem Elis Miranda.

“A novela se perde numa profusão de diálogos e conceitos que não ajudam em nada essa população e acaba complicando ainda mais o trabalho que temos desenvolvido ao longo de anos, que é o de tirar o estigma que esse termo representa”.

“Travestis e Mulheres Transexuais tem identidade de gênero feminina, homens Transexuais tem identidade de gênero masculina. Travestis não representam uma coisa que ela não seja, ela não é um falsete como a novela mostra em alguns diálogos, especialmente quando é associada com a identidade gay, o que também não é correto, pois gay é uma identidade masculina”, explicam.

No texto, a Antra também dá a descrição de conceitos como gay, travesti, transexual e transgênero. Veja a carta completa:

Nota Pública da ANTRA à escritora Glória PerezA Associação Nacional de Travestis e Transexuais ANTRA, existe desde os…

Posted by Antra – Associação Nacional de Travestis e Transexuais on Friday, August 4, 2017

Texto completo

Nota Pública da ANTRA à escritora Glória Perez

A Associação Nacional de Travestis e Transexuais ANTRA, existe desde os anos 90 e possui 190 instituições afiliadas em todo o Brasil e espalhadas nas cinco regiões do país.
Como a maioria dos brasileiros, a nossa população de pessoas trans, aqui leia-se: Mulheres transexuais, travestis e Homens trans, também assiste novelas, especialmente “A Força do Querer” por trazer na trama, personagens que retratam muitas das nossas realidades, falamos aqui das personagens que lidam com a temática das identidades Trans.

Sabemos que as novelas são obras de ficção, porém as novelas interferem a realidade quando levam para a casa das famílias brasileiras debates importantes para a sociedade, tornando-se mais que uma obra de ficção, mas importante canal de informação.

Foi assim com Malu Mulher que trouxe a temática da mulher e a igualdade de gênero, Barriga de aluguel que retratou a inseminação artificial e tantas outras.

A novela em tela, tem prestado um relevante serviço quando aborda a questão da transmasculinidade vivida pela personagem Ivan/Ivana, e tem prestado grande serviço de informação acerca da temática. Porém tem deixado a desejar quando a identificam como transgênero. No nosso entendimento a personagem é um homem Trans, inspirada na obra do escritor, homem trans, João W. Nery.

Agora quando se refere a Travestis a novela se perde numa profusão de diálogos e conceitos que não ajudam em nada essa população e acaba complicando ainda mais o trabalho que temos desenvolvido ao longo de anos, que é o de tirar o estigma que esse termo representa. O conceito tão mau empregado no Aurélio e que nos elimina enquanto identidades politicas, do campo das feminilidades.

Travestis e Mulheres Transexuais tem identidade de gênero feminina, homens Transexuais tem identidade de gênero masculina. Ou sejam não se reconhecem pertencentes ao gênero atribuído no nascimento.

Travestis não representam uma coisa que ela não seja, ela não é um falsete como a novela mostra nalguns diálogos, especialmente quando é associada com a identidade gay, o que também não é correto, pois gay é uma identidade masculina.

Travestis vivenciam sua Travestilidade socialmente, diariamente, 24 horas por dia, não nos “vestimos” a noite para vivenciar uma interpretação do feminino, somos parte do feminino.

Nesse sentido queremos contribuir para que a novela de fato possa ser um canal de entretenimento e também educativo diante dessa complexidade que são as identidades de pessoas Trans, população tão vulnerável devido a exclusão provocada pela transfobia.

Seguem os conceitos com os quais trabalhamos:

Gay = Homem que tem atração afetiva e sexual por outros homens. Imagem e identificação masculina com imagem e identificação masculina.

Transformista = termo em desuso, para designar homens, não necessariamente gays, que se vestiam de mulher para eventos, shows, concursos etc.

Existem ainda Drag Queens, drag King, cross dress, entre outras Expressões de gênero. Não são identidades.

Travesti = Pessoa designada no nascimento como sexo masculino, mas que transiciona do masculino para o feminino e vive 24 horas no gênero feminino. Geralmente usa hormônios e faz modificações no corpo através de intervenções cirúrgicas, mas não é uma regra.

Transexual = Pessoa que se sente não pertencer ao gênero atribuído no nascimento através do órgão genital. Algumas pessoas trans externalizam a transexualidade fazendo a transição de gênero, podendo usar hormônios e intervenções cirúrgicas, ou não, e simplesmente mudando as vestimentas e características atribuídas ao gênero ao qual entende pertencer. Essa designação vale para Mulheres transexuais e Homens trans.

Transgênero = Palavra guarda-chuva que abarca todas as expressões de gênero, transformistas, drag queens, travestis e transexuais, mas não é uma identidade políticamente construída. Não utilizamos esse conceito na nossa instituição como identidade mas temos uma discussao acerca do tema.

Esperamos assim contribuir e nos colocarmos a disposição para dialogar mais e aproveitar sobremaneira a oportunidade trazida pela autora, mas vimos através da nota expor não um incomodo pessoal, mas de inúmeras travestis por esta entidade nacional representadas Brasil afora!

Sigamos na luta pela construção de um Brasil livre da Transfobia!

Keila Simpson – Presidenta

ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE TRAVESTIS E TRANSEXUAIS ANTRA.

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O Catraca Livre traz mais explicações sobre gênero neste texto.

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