Entrevista exclusiva para a VICE com o prefeito Fernando Haddad

Texto por Débora Lopes e Peu Araújo

Fernando Haddad sai de seu gabinete abatido. Com o nariz irritado e uma cara de noite mal dormida, ele atribui o desconforto à rinite. “Tive de tirar os ternos de inverno do armário e aí já viu, né?”. A doença alérgica do prefeito de São Paulo, que constantemente pauta jornalistas e já atrapalhou seus compromissos da agenda pública, é responsável pela retirada de tapetes, cortinas e por outras mudanças no ambiente de trabalho.

Na ante-sala do quinto andar da sede administrativa de São Paulo, Haddad recebe a VICE para um papo de uma hora. Sem paletó e cercado por dois assessores, ele entorna a xícara de café preto, dispensa a taça de água servida pelo mordomo, cita Karl Marx e Gilberto Gil. Durante a conversa, falamos sobre manifestações, a visita do MPL até sua residência, Cracolândia, pixo, fluxos de funk, a presença do Exército no combate à dengue, lança-perfume, imigrantes, reeleição e outros rolês. Leia os melhores trechos da entrevista abaixo.

VICE: Tinha um brother nosso na Praça Roosevelt com a molecada do skate outro dia. Ele comentou que você colou e chamou os moleques pra trocar ideia e saber o que eles queriam, quais eram os interesses deles. Você costuma fazer isso sempre? Costuma fazer isso em regiões mais periféricas?

Fernando Haddad: Acho que, até por formação, gosto de ouvir. Pra você dar uma aula, você tem de ouvir, entre aspas, muito. Você tem de ler muito. Ler é uma forma de ouvir o que os outros estão falando. Essa percepção das pessoas do dia a dia é muito melhor do que em geral se imagina. Vou citar um exemplo: tinha um estrangulamento de trânsito lá em cima na M’boi Mirim – Jardim Capela, o pessoal chama ali. Eu fui visitar a área com os técnicos da CET, e eles estavam descrentes de que a solução pedida pela comunidade, que era a duplicação da ponte, daria resultado. O que foi pedido pela comunidade resolveu o problema para surpresa dos próprios técnicos quando voltaram lá. O que eu quero dizer com isso é que essas soluções que vêm da própria comunidade no caso da cidade são um conhecimento muito precioso. A pessoa tá morando ali há 15, 20 anos, tá olhando para aquele problema há muitos anos. Então, quando ela faz uma sugestão, você pode ter certeza de que a pista é boa. Quando eu tô na rua, gosto de ouvir as pessoas criticando, recomendando. Me dá prazer.

A VICE cobre muitas manifestações. Desde 2011, acompanhamos o MPL (Movimento Passe Livre). Diversas vezes, viemos até a Prefeitura junto com algum ato deles. Em fevereiro deste ano, o MPL celebrou um casamento de um boneco do prefeito Fernando Haddad e uma noiva catraca. No outro dia, eles foram até a sua casa, no bairro do Paraíso. Você ou sua família estava em casa nesse dia ou não?


Fernando Haddad: Eu não estava. Estava na Prefeitura ainda. Acho que, quando você mistura o público com o privado em relação a pessoas eleitas e democráticas, que têm uma trajetória democrática, é uma confusão que me lembra o pior da tradição política. Uma confusão que não leva a um bom lugar. Eu não fui o primeiro prefeito hostilizado dessa maneira por eles, mas não recomendo para as pessoas progressistas agirem dessa maneira contra nenhum político. Eu acho errado, mas penso que eles vêm de uma tradição política complicada, uma visão antiestatal. Pra minha formação de esquerda democrática, eu vejo com alguma preocupação a forma como eles se organizam, se manifestam, embora reconheça a legitimidade da reivindicação de modicidade tarifária. Acho uma bela causa e a defendi antes de conhecê-los; então, pra mim, não é novidade.

Mas, quando você está no gabinete e vê uma manifestação aqui na frente da Prefeitura, não se intimida?
Ao contrário. Já desci em manifestação e subi no caminhão pra conversar com as pessoas. Tem registro fotográfico disso. Quando fui Ministro da Educação, recebi mais manifestações do que aqui. Visitei dezenas de universidades públicas e privadas. Outro dia, eu fui à PUC (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo), no Tucarena. Tinha 400, 500 pessoas lá. Fui lá como cidadão discutir a cidade com alunos. Não tenho lembrança de um prefeito que tenha topado esse tipo de atividade. Dou aula na USP (Universidade de São Paulo) sendo prefeito, fui a outras escolas da cidade sem nenhum tipo de aparato, sem nenhum tipo de cerimônia, de protocolo.

Mas essa coisa de irem até a sua casa não assusta um pouco? De pensar na sua família, na sua mulher?

[Leia a resposta do prefeito e a entrevista completa aqui.]