Dimenstein: o que vou fazer da minha vida antes de morrer

Estou com 62 e com muito saúde – graças, em parte, aos meus passeios diários de bicicleta e caminhadas a pé. Não tenho carteira de motorista.

Moro e trabalho no mesmo bairro – Vila Madalena – o que evita o trânsito da cidade de São Paulo. Cidade que, aliás, amo. Podia estar morando em Nova York, com bom apartamento e emprego. Mas preferi minha cidade.

Não fumo e não bebo: minha alimentação está na fronteira do natureba.

Mas acredito que a vida é curta. Mais curta ainda é o que chamo de vida influente. A vida influente morre quando o que falamos e fazemos já não faz mais diferença para a sociedade.

Estou no auge da minha vida influente. Mas sei que o tempo escorre.

Alcancei todo o reconhecimento que um jornalista poderia alcançar. Estive sempre associado a projetos de sucesso: Folha e CBN.

Tive o prazer de morar em Nova York, onde fui acadêmico-visitante da Universidade Columbia; e, anos depois, em Cambridge, EUA, onde desenvolvi projetos em Harvard.

Nos últimos 10 anos, fui editor-chefe da Catraca Livre, fundado com meus dois filhos – Marcos e Gabriel – como um hobby familiar.

Mas agora estou deixando as funções executivas para assumir o conselho de administração.

Afinal, Catraca Livre conseguiu sobreviver aos 3 últimos anos de crise e mudanças de algorítimos das redes sociais. Nosso alcance mensal, apenas na nossa página principal do Facebook, gira em torno de 40 milhões de pessoas diferentes.

Nunca nosso prestígio esteve tão alto, mostrando a aceitação à missão de focar na valorização do poder individual, aumentar o repertório de possibilidades das pessoas em educação, cultura, lazer, saúde e empreendedorismo.

Temos zero dívida em banco – isso mesmo, zero. Ao contrário, temos uma boa reserva para enfrentar as turbulências do mundo editorial e econômico.

Mais: nossas contas estão equilibradas. Mesmo não tendo ligação com nenhum grupo empresarial ou fundo de investimento.

Traduzindo em uma palavra: tornei-me dispensável. Até porque boa parte dos acertos se deve à equipe. E muitos dos erros se devem a mim.

Daí que posso me dedicar mais ao meu maior prazer: a comunicação como instrumento de empoderamento comunitário.

Isso significa que vou centrar minha “vida influente” no ReciproCidade, apoiando ações criativas com impacto social.

Neste ano, por exemplo, nossa maior conquista foi ter ajudado a evitar a suspensão das atividades do Instituto Baccarelli por falta dinheiro. Eles atendem 1000 crianças da maior favela de São Paulo – Heliópolis. Fizeram nascer a primeira orquestra sinfônica do mundo numa favela.

Orquestra Sinfônica de Heliópolis
Créditos: Rodson Hallen Leopoldi
Orquestra Sinfônica de Heliópolis

Além da Sinfônica de Heliópolis, o ReciproCidade apoia, com visibilidade na mídia e mobilização de recursos:

1) Orquestra Digital (transmissões de concertos pela internet), em parceria com o maestro João Carlos Martins;

2) Horas da Vida, plataforma em que médicos doam horas a entidades sociais;

3) Parque da Vila Madalena, onde está localizada a redação da Catraca Livre, para ser um polo de economia;

4) Mestres da Criatividade, que dissemina a cultura da inovação;

4) “CriaCausa”, seleção das mais criativas publicidades do Brasil e do mundo que defendem causas;

5) VilaMundo, em parceria com o Instituto Acqua, para facilitar acesso a espaços culturais de São Paulo e região do ABC.

A sede do ReciproCidade, na Vila Madalena, abriga uma galeria de arte (Choque Cultural) e realiza, na rua, apresentações gratuitas de jazz e música clássica. Ali é um dos pontos do Parque da Vila.

Sede do ReciproCidade
Sede do ReciproCidade

Jornalismo vira, assim, um hobby. Há 20 dias, criei meu blog de cidadania e política que, para minha surpresa, está com quase 600 mil leitores.

Aliás, sempre trabalhei e trabalho por prazer.

Tive a sorte divina de que meu maior prazer é a minha maior missão.

E quem tem sorte na vida profissional tem a obrigação de retribuir.