Sem mandado, polícia tenta entrar na casa de participante da manifestação

Na segunda-feira, 17, poucas horas antes do manifestação contra o aumento das passagens, a Polícia Civil esteve na casa de Laura Diaz com uma denúncia anônima de que ela portava explosivos em casa.

Segundo Laura Diaz, ela estava almoçando com um grupo de amigos e esperava a chegada de mais pessoas. O interfone tocou uma vez, mas os policiais não anunciaram a presença via portaria e bateram na porta do apartamento. “Eles estavam com roupas normais e mostraram os distintivos, dizendo que tinham uma denúncia anônima de que eu portava explosivos e era uma das líderes do Movimento Passe Livre”, contou Diaz.

Polícia Civil na porta do apartamento de Laura Diaz
Polícia Civil na porta do apartamento de Laura Diaz

Como ela não portava explosivos e nem é líder do movimento, perguntou se eles tinham ordem judicial. “Eles responderam que não, mas que eu tinha que abrir a casa para revista ou então eu deveria ir para  delegacia. Eu me recusei, falei que não era criminosa, não tinha medo e chamei uma advogada”, comentou.

Para ela, a ação da polícia tem relação com a prisão dela durante a ocupação da reitoria da USP, em 2011. ” Ia ser ótimo para eles, prender alguém que esteve na reitoria, entrar na minha casa e encontrar álcool, vinagre, acetona, qualquer coisa e falar que é explosivo. Eles plantam coisas, reviram a casa”, comentou Diaz.

Segundo ela, os policiais chegaram a falar para a advogada: “Você acha que ela é boazinha? Ela estava na reitoria da USP”.

Então, os policiais pediram o RG de Laura e ela foi intimada a prestar esclarecimentos na 77ª DP, na quinta-feira, 20.

“Isso é coisa da ditadura e eles estão tentando acuar a gente. Fazer com que a gente desista e fique com medo. Por isso eles massacram nas ruas e perseguem as pessoas. Por isso prendem pessoas com vinagres”, disse Diaz.

” Cada vez mais fica claro que são eles que agem na ilegalidade e não quem se manifesta, não quem protesta. Não vamos cair nessa política do medo, da política da repressão do Haddad e do Alckmin. São Paulo está virando uma praça de guerra e o descontentamento das pessoas apareceu ontem, com milhares nas ruas”, disse.

Confira o depoimento de Laura em vídeo.

Entenda o que a polícia pode e não pode fazer

A redação do Catraca Livre entrou em contato com o advogado criminal Bruno Salles Pereira Ribeiro que explicou a existência de uma garantia constitucional chamada inviabilidade de domicílio, que é inviolável. “A polícia não pode entrar na casa da pessoa sem autorização, somente em determinadas situações”, disse Ribeiro.

“O que acontece muito é que a Polícia Militar e Civil, utilizam um subterfúgio para entrar nas casas, quando existe a afundada suspeita que está acontecendo um crime e flagrante e delito. Excepcionalmente, quando percebem que estão matando ou sequestrando, por exemplo”, explicou o advogado criminal. Mas ele lembrou que a polícia utiliza isso, principalmente na periferia, para entrar na casa das pessoas.

“A denúncia anônima é muito utilizada para autorização de uma série de medidas cautelares, as mais emblemáticas aconteceram nas operações de 2004 até 2008 da Polícia Federal, quando utilizaram as denúncias anônimas para conseguir escuta telefônica e quebra do sigilo”, conta Pereira. Depois, o advogado explicou que o STJ (Supremo Tribunal de Justiça) decidiu que somente a denúncia anônima não é suficiente para autorizar nenhuma medida cautelar.

“Não é suficiente para entrar na casa de alguém, você precisa ter mais informações. Deveriam ter ficado na frente da casa da pessoa, averiguar se houve movimentação de objetos estranhos, depois solicitar uma medida cautelar”, informou o advogado.

“Se fosse ao contrário, qualquer pessoa poderia fazer o pedido de busca e apreensão para polícia”, refletiu Ribeiro.

Resposta da Polícia Civil

A reportagem do Catraca Livre entrou em contato com a assessoria de imprensa da Polícia Civil, que informou que o caso vai ser averiguado pela Corregedoria da Polícia Civil.