Madrid lança seu novo EP e mantém clima melancólico e obscuro

Dupla formada por Adriano Cintra, ex-Cansei de Ser Sexy e Marina Vello, antiga vocalista do Bonde do Rolê disponibiliza "EP 01" para audição gratuita

Por: Catraca Livre

Um piano, a reverberação alta, um eco. O sintetizador agudo no fundo, a atmosfera é branda. Uma voz doce e feminina que surge para, em seguida, se encontrar com a masculina para a criação de um bonito dueto. Ambos cantam: Another day alive/ Struggling with the emptiness that took over in eyes / My voice echoes in the void it’s so hard to recognize / Defective features reflected in the mirror.” Olhos fechados e a música parece ter saído da trilha sonora do filme 500 dias com ela, ou que seja um cover modernizado de alguma da Celine Dion, sei lá. A verdade é que essa é a Enough, faixa que abre o “EP 01”, novo lançamento da Madrid, dupla formada por Adriano Cintra, ex-integrante da Cansei de Ser Sexy e Marina Vello, que era vocalista do Bonde do Rolê.

Ainda com o piano como base, The One, a número 2 já tem um aspecto diferente. Com uma pegada meio jazz no começo, ela vai se transformando em um rock mais melódico com cara daquelas baladas de dançar juntinho dos anos 80. Sendo a primeira parte cantada por ele e a segunda, por ela, a chegada dos metais ao fundo são a prova de que existe uma grande preocupação com os arranjos e que, apesar da sua vertente mais pop, a dupla se preocupa em mesclar referências para construir a obra – vide o solo de guitarra com uma distorção bem suja antes do final, em que os dois voltam a cantar juntos, enquanto a música vai sofrendo quedas e reencontros que vão desembocar na melancolia, outra vez.

“Step out into the sunlight / Come home with me /We’re going to be together/ As the sun goes away / And if you want I won’t tell anybody/ Don’t be scared”. Para ouvir na estrada – em direção ao interior, uma casa no campo num final de semana ensolarado –, a Secret flerta com o folk e lembra, em vários sentidos, o trabalho dos Carpenters, do Simon & Garfunkel e essa turma toda – lembrando que são só referências de construção, do uso dos instrumentos e da estética de voz, sem qualquer tipo de julgamento de valores. O refrão, que diz “and I don’t mind being your secret, it’s not my business if you’re ashamed” deixam a canção com um jeito ainda mais country, diferente de Don’t Tell Me Anything, que tem o típico ritmo de bateria do pop, assim como a pronúncia e entonação dos versos se aproximam ainda mais do gênero.

Se o primeiro disco da dupla, homônimo, lançado em 2012, gerou olhares tortos, suspeitas em torno do que estava por vir das mãos de músicos que tinham projetos tão diferentes, o novo trabalho mostra sua solidez e capacidade de mesclar estilos para uma composição que, em termos gerais – e seguindo a estética do conceito anterior –, soa melancólica, escura, densa.

E é essa melancolia que vai se expressar em seguida, naquela que, provavelmente, é a música mais interessante do disco. I Shot Him With a Shotgun tem mais uma vez o ritmo marcado pelo piano jazzístico, seguido por sons de palmas ao fundo e a voz da Marina marcada por um eco escuro e misterioso. Mistério esse que se reforça com a construção da letra surrealista que, ao mesmo tempo que conta uma história, parece ser só fruto do inconsciente. “I shot him with a shot gun/ But I miss him / I still miss him / We were holding hands watching the universe/ Fall apart / We didn’t exist / It’s like we’ve never been / We didn’t exist / Is this how we cease?/ We didn’t exist”. Não é preciso muito tempo para imaginar o prazer que seria escutá-la num desses bares escuros, ouvindo a mesma marcação pelos aplausos da plateia.

Depois da beleza confusa de I Shot Him With a Shotgun, chega a última e mais longa faixa do disco, com quase 5 minutos. Truth Lips Are Sealed, apesar dos barulhos e da harmonia crescente, não repete o feito, mas nem por isso estraga o prazer de ter escutado as 6 novas composições da dupla que vai começar a atrair olhares (e ouvidos) cada vez mais atentos.