Brasileira viaja sozinha de bike pela América do Sul

13/09/2016 11:11 / Atualizado em 07/05/2020 04:07

A Carol Emboava, do Projeto Giramérica, é dessas mulheres inspiradoras que faz a gente vibrar com as conquistas realizadas. Ela está viajando sozinha a América do Sul, percorrendo de bike por terrenos que muitos consideram loucura: longos desertos, calor batendo recorde, noites com temperaturas abaixo de zero e acampando por lugares completamente remotos.

Carol conta como é viajar sozinha numa sociedade machista e os medos e os prazeres dessa jornada! Se você ainda não conhece essa guerreira leia aqui o trecho da nossa conversa e se apaixone por ela você também.

 
 
 
 

Outsiders Brazil: Carol, como surgiu a ideia de viajar pela América do Sul de bike? E como você se preparou para ela?

Carol: A ideia de viajar de bike surgiu em uma época que eu estava em um momento de transição na minha vida, mudança de trabalho, cidade. Achei que me faria bem um ano sabático antes de me jogar de cabeça nisso tudo. Tirei os planos que estavam engavetados há mais de 10 anos e comecei a planejar. No fim das contas a viagem já se estendeu por 3 anos e não tem data pra acabar.

A preparação foi dividida em 3 partes. Física, psicológica e financeira. A primeira foi a única que não segui muito a risca. Usava a bike como meio de transporte na minha cidade e às vezes no final de semana saia para um pedal mais longo. Fui contra todas as recomendações de testar os equipamentos e fazer viagens mais curtas antes de partir.

A preparação psicológica talvez seja a mais difícil. Desapegar aos pouquinhos de tudo que nos é tão familiar não é das tarefas mais fáceis. Mas sempre foquei no meu sonho e com isso o apego diminuía, porque sabia que coisas lindas estariam por vir. E não estava enganada.

Já a parte financeira requer muito mais disciplina do que eu imaginava. Você tem que abrir mão de muita coisa se quer fazer uma viagem longa. Aquela viagem com os amigos no feriado, uma roupa nova que no fim você não vai levar nem usar por vários meses, um jantarzinho aqui, um cinema ali. Virei a pão-dura da turma. Mas todos entendiam que era por algo maior e muitas vezes até mudaram os planos para aproveitarmos todos juntos.

 
 
Outsiders Brazil: O que você aprendeu sobre você mesma nessa jornada que ainda não havia notado?

Costumo dizer que aprendi em 3 anos o que levaria uma vida inteira para entender. Viajar sozinha é uma experiência ímpar e intensa. Descobri que posso chegar onde eu quiser com minhas próprias pernas, que o perigo está muito mais na nossa mente do que ao nosso redor, que existem mais pessoas dispostas a ajudar do que a te fazer mal. Aprendi a administrar muito melhor meu dinheiro e a agradecer pelas pequenas coisas mais do que reclamar. Mas acredito que o mais importante que descobri é que meu corpo vai até onde minha mente me leva.

Muitas vezes me sentia cansada fisicamente, mas o psicológico me empurrava. E também já aconteceu o contrário, de me sentir bem fisicamente, mas não conseguir pedalar mais de 15 km porque a cabeça não ajudava. Os únicos limites foram impostos pela minha mente, aí eu descobri que sou muito mais forte do que imaginava.

Outsiders Brazil: Quais são suas motivações? O que te faz levantar do saco de dormir para pedalar quilômetros debaixo de sol ou chuva?

Eu me motivo com o novo, com a falta de rotina. Adoro acordar, sair pra pedalar e não ter ideia do que vai acontecer no meu dia, quem vou conhecer pelo caminho, onde vou dormir. Todos os dias na estrada são uma surpresa e para mim não existe motivação maior que isso. Tenho sede de conhecer, aprender e viver coisas novas.

 
 
Outsiders Brazil: Conta um pouquinho sobre a sua experiência viajando sozinha. Como é passar tanto tempo com você mesma? Já sofreu algum tipo de assédio ou abuso?
Minha experiência viajando sozinha não poderia ser melhor. Eu adoro a minha companhia, canto enquanto pedalo, converso e rio comigo mesma. Acredito que esse seja um ponto importante pra quem quer se aventurar numa viagem solo, curtir sua própria companhia e não ter medo do silêncio. As vezes ele pode assustar. Eu gosto de ser dona do meu próprio destino e não existe forma melhor de exercer isso do que viajando sozinha. Se gosto de uma cidade posso decidir ficar mais dias do que o planejado, se um lugar super badalado e recomendado não me agradou posso ir embora no dia seguinte e descobrir o próximo ponto. É uma liberdade incrível.

Adoro acampar sozinha, montar minha barraca no final do dia, preparar um café e sentar para ver o sol se pôr e as primeiras estrelas surgirem no céu. Já dormi em posto de gasolina, na beira de rios lindos, em quartéis de bombeiro, casa de árvore, estábulo de cavalo, casa de moradores locais por onde passava, em cama quentinha e confortável e em sofá frio e duro, nas estradas da Patagônia e nas areias do Deserto do Atacama. Tudo isso faz com que você valorize muito quando tem um pouco mais de conforto. Sair da caixa custa, mas uma vez lá fora você cresce e se expande tanto que é impossível voltar pro mesmo ponto, pensar como você pensava e agir como você agia antes.

Sobre assédio nunca passei por nada grave. Mas se você é mulher e está lendo isso já sabe como é viver numa sociedade machista, onde os homens acham normal mandar gracejos em alto e bom tom no meio da rua ou assoviar quando você passa. Toda mulher sabe como lidar com isso. É incômodo, sempre. Mas nada nunca passou disso.

A Carol ainda conta sobre os momentos que pensou em desistir dessa jornada, os arrependimentos que teve e como planejou seu orçamento para realizar o sonho da sua vida. Veja o depoimento completo dessa mulher guerreira clicando aqui.