‘Não admito ficar parada, descansando’, diz fazendeira de 85 anos
“Quando me deito sem saber minha programação do dia seguinte, enlouqueço.” A afirmação é de Maria Margarida de Almeida Cunha, a dona Meg para os mais chegados, 85 anos.
Professora aposentada de piano, português e francês, hoje dona Meg se divide entre a administração das atividades da fazenda que tem em Campos dos Goytacazes (RJ) e as coisas que “ela inventa”, como uma confraternização anual em que reúne a família toda na roça.
“Fiz uma promessa e todo ano junto filhos, netos, bisnetos e amigos nessa festa na fazenda. A gente reza uma missa, tem o almoço, tem que arrumar tudo para receber o pessoal. Eu vejo tudo o que vai precisar, compro as coisas e deixo pronto. Sou muito dinâmica, não admito ficar parada, descansando.”
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Dona Meg sempre trabalhou pelo que queria. Começou a estudar piano aos 11 anos. Aos 24, já formada, casou-se. Dava aulas de música e também para o primário. Queria fazer ensino superior, mas não havia universidade em Campos, e o marido não queria que ela ficasse viajando ao Rio para estudar. Eles combinaram então que, quando a faculdade chegasse, ela voltaria aos estudos.
A faculdade chegou a Campos, mas a vida mudara: o casal já tinha três filhos. “Meu marido estava me devendo o curso, e ele fez questão que eu estudasse.” Os dois foram à faculdade juntos: ela fez filosofia, ele, direito. Foram anos corridos, lembra dona Meg. “Minha luta foi muito grande, era tudo bem mais complicado do que hoje. Mas conseguíamos viajar bastante em família, eram viagens muito boas, para o Sul, até para a Europa.”
A família cresceu, e ela é toda orgulho ao falar sobre isso. Além dos três filhos citados acima, ela adotou outros dois. Vieram também oito netos e sete bisnetos, “cada um mais lindo do que o outro”, derrete-se. “Vibro com cada conquista da minha família.”
Além dos parentes de sangue, há os colegas. As alunas de piano, por exemplo, fizeram uma homenagem no aniversário de 80 anos da professora. “Formei umas 30 alunas em piano, que é um curso longo. São até hoje minhas amigas. Elas tocaram, cantaram e me deixaram emocionada na surpresa que organizaram.”
Quando o marido morreu, há 15 anos, dona Meg teve de assumir a fazenda, que, à época, produzia cana-de-açúcar e gado. “Como não tinha ninguém para me ajudar, tive de resumir a produção ao gado de criação e à produção de leite. A sorte é que, nos anos 90, quando não tinha nem luz nem água, eu tinha mudado de vida radicalmente e partido pra ficar mais tempo na roça.”
Ela conta que um dos seus filhos também passou a se dedicar à fazenda. “Hoje está tudo lindo, mas já ajudei até em obra. Sei o nome de cada vaca, aprendi a dar vacina, já fiz parto de bezerros e acompanho a rotina desde a madrugada, na hora de tirar o leite.”
A distância da casa em que mora à fazenda é de cerca de 50 km. Por conta de um problema em um dos olhos, os filhos a proibiram de dirigir, e isso fez com que se afastasse um pouco da lida diária. “A estrada é perigosa, não posso mais ir sozinha. Agora só vou duas vezes por semana, mas fico de olho em tudo a distância.”
É ela, por exemplo, quem programa todos os pagamentos. “Coloco tudo no débito automático. O que não dá, movimento pelo computador. A tecnologia ajuda muito. Tenho e-mail, celular, WhatsApp… Eu vivo sozinha, tenho de me virar.”
A única coisa que dona Meg não aprendeu ainda é lidar com quem diz que ela é da terceira idade. “Não gosto de nada específico para idoso. Tenho horror a baile, fila especial… Gosto de coisas para jovens, não sou idosa, não, minha filha.”