A estufa: ideias germinam em um escritório colaborativo na Vila Madalena
Impressões de um dia de trabalho em um escritório fora do normal
O primeiro pensamento que vem à cabeça ao entrar na “estufa” é a incerteza sobre que tipo de estabelecimento funciona ali. A partir de certo horário, pessoas dos mais variados tipos e estilos começam a entrar pela pequena porta de metal e tomar lugar nos diferente cômodos do sobrado, cada um batizado com o nome de um país diferente.
Na Tailândia, acontece o almoço. Ao lado, o Parede Viva e o Catarse dividem as duas mesas de Cuba, que dá acesso ao ar livre da Jamaica, onde está o quintal. No andar de cima fica a França (único ambiente com ar condicionado), onde funciona o projeto AHH! e a produtora Tilt. Fazendo fronteira com ela está o Brasil, com os artistas e as iniciativas autônomas.
Em cada um desses ambientes, bugigangas cujas funções não se sabe ao certo dividem espaço com pinturas, desenhos, cartazes promocionais, recortes de jornal, cordas, caixas, latas de tinta, fitas, livros, computadores e pessoas. Embora a maioria desses objetos pareça estar fora de contexto, aos poucos é possível perceber que tudo ocupa um lugar previamente pensado.
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“Uma vez alguém viajou e levou a única chave da porta, então nós tivemos que arrombá-la para pegar uma coisa urgente aqui dentro”, conta o grafiteiro Thiago Mundano. “Como a porta estragou, nós reaproveitamos ela como mesa. Mas como a mesa estava boa, ela virou a nova porta, que só precisou receber uma fechadura e uns grafites”, lembra.
É assim que funciona a estufa, um ambiente colaborativo em que 18 pessoas – que representam empresas e profissionais autônomos – dividem espaço e se juntam para manter seus negócios e debater projetos. “A estufa é um esforço coletivo, não tem direção nem propriedade. É a tentativa de atingir um meio termo entre um escritório colaborativo e um coletivo”, explica Caio Tendolini, autônomo. “A intenção aqui é fugir da colaboração programática necessária ao funcionamento do co-working padrão e também do anonimato de um coletivo, mas aproveitando as vantagens de cada um”, esclarece.
Sementes
Os primeiros a se estabelecerem na casa foram Marcelo Nucci, Deco Benedykt e a equipe do AHH!, há cerca de um ano e meio. Na oportunidade do financiamento do projeto do que viria a ser o documentário Belo Monte: anúncio de uma guerra, no fim de 2011, a casa apareceu como um possível QG da campanha. Em pouco tempo a estufa já havia chegado ao seu tamanho atual.
De acordo com Nucci, o custo de dividir o espaço é praticamente o mesmo de um escritório colaborativo como o Hub ou o Pto de Contato. “A diferença é a liberdade do ambiente e a vantagem de estarmos todos aqui trabalhando, de certa forma, com temas muito próximos. Isso gera uma ajuda mútua”, diz.
Nutrientes
A estufa é realmente um local de negócios. Muitas reuniões são feitas, algumas no próprio espaço, mas a maioria por videoconferência. Miniaturas de pessoas aparecem ao longo do dia nas telas dos notebooks discutindo ideias, projetos, diretrizes, iniciativas e interesses.
“Em um co-working, digamos, ‘normal’, cada pessoa produz a sua parte sem necessariamente manter um relacionamento com as outras, enquanto em um coletivo todos produzem, mas de forma anônima e em nome do geral”, diz Tendolini. “Na estufa, a ideia é que cada um se desenvolva de forma autônoma, mas usando os benefícios de ter parceiros que trabalham no mesmo local”, conclui. É daí, inclusive, que vem o nome. Ali, como em uma estufa, “todos usufruem do mesmo solo fértil, mas cada um aproveita os nutrientes para crescer individualmente”, conclui.
Galhos
Um dos grupos que compõem a estufa é o Parede Viva, projeto responsável pelo espaço cultural Puxadinho da Praça e pelo Pimp My Carroça. A comunicação entre a estufa e o Puxadinho funciona da forma antiga, com gritos por cima do muro. Vizinhos, os dois sobrados só não são totalmente geminados pelo pequeno boteco de esquina conhecido como o Bar do Corno.
Os dois espaços – e aqueles que fazem parte de seu cotidiano – buscam, além de progredir com seus negócios, tornar as pessoas cada vez mais próximas dos temas que abordam. “A gente recebe excursões de escolas do bairro, que vêm conferir a exposição Imobilidade Urbana aqui no Puxadinho”, explica Mundano. “Nessas ocasiões, nós já mostramos para eles alguns outros projetos da estufa, a arte dos becos e as outras galerias da região. Quantas pessoas conhecem bem a arte de rua da cidade? Sabem o que é um crowdfunding ou que é um teto verde?”, questiona o grafiteiro.