Alegrias e dramas de ser gay: Menos preconceito e mais amor!

Ser gay é maravilhoso. Ponto. Eu amo ser gay e, se pudesse escolher, nasceria gay novamente. Existe vida depois da morte? Ah, então me manda gay de novo. Daqui uma ou duas vidas pode até me mandar hétero pra eu lembrar como é, mas depois eu volto a ser gay novamente, tá.

Mas olha, vou te confessar uma coisa. Ser gay não é fácil. Eu sei que viver não é fácil, tá cada dia mais difícil pra todo mundo. O desemprego desenfreado, a passagem do transporte público custando quase 4 reais, rolando umas guerras por aqui e ali, pessoas em situação de miséria, o zika vírus, coxinhas versus petralhas, a tal da paz mundial que não chega nunca, a fome (seja a mundial ou aquela quando bate a larica), enfim. Não tá fácil pra ninguém. Mas se tá assim pra você, imagine para um gay que…

– Já nasce numa sociedade em que ser homossexual é pecado, é imoral, é errado e…
– “O filho do vizinho até pode ser, de boas, sem preconceitos. Somos todos iguais. Amo gays, adoro gays, quase todos os meus amigos são gays. MAS, filho meu gay, não!”.
– Na infância vai ter que ouvir o pai e a mãe pedindo pra você falar mais grosso, ser menos afeminado, agir mais parecido com o seu irmão e menos parecido com a sua irmã.

– Na escola vai ter bullying.
– No trabalho vai ter piada sem graça. Isso se trabalhar numa agência de publicidade modernosa. Porque se for numa “firma”, pode ser que role assédio, intimidação ou uma vida dupla.
– Na rua é chamado agressivamente de gay ou viado (Como se isso fosse alguma ofensa. Na real, só é pra quem xinga).

– Precisa ouvir que “Pode ser viado, mas não precisa ser afeminada”.
– Vive num eterno filme de terror chamado “Bolsomito, Malafaia, Feliciano e seus discípulos”.
– Não pode demonstrar afeto ou carinho em locais públicos, seja com um namorado, marido ou um cara gostoso qualquer. E não to falando de pegação, me refiro a andar de mão dada, selinho na boca ou abraço.

– É obrigado a ler que “Os deputados, numa sessão tumultuada, aprovaram o Estatuto da Família, no qual o projeto define como família a união entre um homem e uma mulher”.

– Dependendo do país em que se vive, ser gay pode ser crime e lhe custar a liberdade ou a vida.
– Se viver aqui no Brasil, não há nenhuma lei que criminalize a homofobia. Isso porque estamos falando de um dos países em que mais há agressões contra gays, travestis e transgêneros no mundo todo. Dado alarmante: muitas pessoas não denunciam, sendo assim, esses números de agressões e mortes devem ser muito maiores do que as estatísticas.

– Assiste a maior emissora de TV do país bater picos de audiência mostrando um galã transando com a mãe e a filha, o ator principal estuprando a mocinha, uma facção criminosa matando todo mundo sem dó ou piedade… mas beijo gay não pode, a tradicional família brasileira acha imoral e os anunciantes (marcas) iriam abandonar o barco e cortar os patrocínios.

– Como sabemos, o mundo pode não ser um lugar muito bem frequentado. E caminhar por ele sem o apoio da família pode ser uma jornada mais tortuosa. Eu até imagino que não deva ser fácil ter um filho gay, afinal grande parte do mundo ainda é preconceituoso e homofóbico. Sendo assim, todo pai e mãe devem ficar preocupados com a integridade física e psicológica do filho. Na cabeça de alguns pais, é assim que a gente vira gay…

Mal sabem eles que o processo é um pouco mais lento e complexo. Primeiro, a gente precisa se aceitar. Entender e digerir o fato de que ser gay é OK.

O caminho pode ser rápido e indolor ou lento e tortuoso. Tudo depende da família que você nasce, da sociedade em que você convive e até da sua cor ou classe social. Tente imaginar como é duplamente conflitante sofrer homofobia e ainda por cima sofrer racismo. Com toda certeza ser gay, pobre e negro é bem mais difícil do que ser gay, rico e branco. Os preconceitos estão por todos os lados e, se não nos unirmos, vai ficar cada vez mais difícil para todos nós que, de alguma maneira, somos oprimidos. Vou citar dois exemplos:

– O gay rico geralmente se locomove de carro (blindado) e transita em ambientes gay friendly. Ele convive com pessoas de ~mente aberta~ que, possivelmente, terão menos propensão a oprimí-lo.

– Já o gay que vive em uma condição financeira menos abastada, que usa o transporte público pra se locomover e trabalha numa “firma” (e não em agência modernosa de publicidade) terá diversos outros obstáculos sociais. Talvez, por pressão e opressão do ambiente em que ele convive, a única alternativa seja ter uma vida dupla ou “discreta fora do meio”.

No primeiro caso, ser gay é quase um privilégio. Eu mesmo já trabalhei em uma agência de conteúdo em que a dona dizia “Ai, eu adoro gays. Você são mais sensíveis e criativos”. Já no segundo caso, a exposição a situações de risco é mais intensa. É claro que isso não é uma regra absoluta.

Antes de alguém falar que não concorda, já deixo aqui registrado que ricos podem sim sofrer preconceito e que pobres podem passar brandamente por este tipo de situação. Ainda mais quando o assédio é online, no qual os agressores usam o anonimato para se esconderem com perfis falsos.

Só pra desenhar! Imagine que dois homens gays querem ir trabalhar usando saia. O primeiro vai de carro e trabalha com comunicação. O segundo vai de trem e trabalha num cartório. Qual você acha que ficará mais propenso a “se queimar ao brincar com fogo”?

E a esta altura, tentar explicar que cada um, independente da sua orientação sexual, tem o direito de vestir o que bem entender sem que seja julgado (ou agredido) por isso é quase uma utopia.

Se até aqui tudo parece drama, não se engane. Como eu disse na primeira linha deste texto, ser gay é maravilhoso. E eu nem preciso fazer uma lista exemplificando os motivos. Mas o que os “homofóbicos de plantão” precisam saber é que a gente vai continuar:

– Tombando os preconceitos!
– Arrasando na militância!
– Lacrando quem tentar passar por cima.

Não queremos ter privilégios. Não precisamos de aprovação. Não somos melhores do que ninguém.

Mas exigimos sermos tratados como iguais! Um pedido: menos preconceito e mais amor.

Por Felippe Canale

Jornalista parceiro da Catraca Livre