Alunas da Poli-USP se unem em movimento contra o machismo

Nas redes sociais, a campanha divulga denúncias anônimas de casos de assédio e machismo envolvendo professores e alunos

29/04/2016 16:00 / Atualizado em 11/07/2018 16:20

Assédio sexual, machismo, racismo, homofobia e transfobia. Essas e outras situações de discriminação são recorrentes dentro da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP). Na instituição, que é composta majoritariamente por homens, as estudantes são frequentemente vítimas de abusos e violência de gênero.

Para lutar contra as agressões, um grupo de politécnicas se uniu e criou, nesta terça-feira, dia 26, a página no Facebook “Politécnicas (R)existem“. Além do perfil na rede social, as jovens lançaram as hashtags #MeuQueridoPolitécnico e #MeuQueridoProfessor para divulgar relatos anônimos sobre casos de machismo. Elas também espalharam essas histórias em cartazes por toda a universidade.

“Ser uma mulher politécnica, por muito tempo, foi motivo suficiente para nos ofender. Não seremos mais silenciadas! Nem por professores, nem por queridos politécnicos”, diz a descrição da página no Facebook.

Em entrevista ao Catraca Livre, a estudante B*, de 21 anos, conta que os objetivos da campanha vão além de expor o machismo. “Queremos conscientizar toda a comunidade politécnica, dando voz às mulheres em um ambiente historicamente machista e majoritariamente masculino”, afirma ela.

O grupo também quer ajudar as mulheres que precisam de apoio, auxiliando o contato com a Poli e oferecendo o suporte necessário sobre as questões relacionadas à desigualdade de gênero.

Já M*, de 22 anos, aluna de engenharia civil, relata que a gota d’água para a criação do movimento ocorreu em uma publicação no evento do Grêmio Politécnico. “Após a sugestão de troca do termo ‘sexo’ por ‘gênero’ em um questionário do evento, diversos homens fizeram comentários extremamente transfóbicos e ficamos revoltadas”.

Indignadas com a situação, as estudantes resolveram fazer um grupo no Facebook e criar a iniciativa, que foi inspirada na campanha “#MeuAmigoSecreto”. Nos relatos enviados, as jovens denunciam desde declarações machistas dos professores em sala de aula, até assédio sexual e estupro em festas e outros locais da universidade.

Agora, as organizadoras vão marcar uma reunião com os diretores da Escola Politécnica para discutir como reverter esse problema e punir os agressores.

As alunas espalharam cartazes com os relatos pela universidade
As alunas espalharam cartazes com os relatos pela universidade

Em nota, a diretoria da Poli afirma que “não tolera discriminação, desrespeito, assédio ou abuso relacionado a gênero, assim como qualquer tipo de manifestação de ódio”. Confira o texto na íntegra:

“A Diretoria da Escola Politécnica da USP não tolera discriminação, desrespeito, assédio ou abuso relacionado a gênero, assim como qualquer tipo de manifestação de ódio. As denúncias que chegam à Diretoria são sempre apuradas para que sejam tomadas as providências legais cabíveis.

Com relação ao conteúdo postado no perfil do Facebook “MeuQueridoPolitécnico”, é de suma importância que o grupo faça uma denúncia formal à Diretoria, além de procurar as instâncias legais da justiça. Informamos ainda que a Poli possui canais de comunicação para denúncias, que são recebidas pela assistente acadêmica e encaminhadas à vice-diretora da Escola, para evitar que se sintam constrangidas. Todo o processo é anônimo.

Uma minoria covarde de alunos, que se esconde atrás do anonimato para praticar crimes como os citados no perfil, merece ser responsabilizada. Mas é preciso que as denúncias sejam feitas”.

Assédio sexual: uma realidade constante

Em 2013, uma aluna foi abordada por um homem no banheiro feminino da Engenharia de Produção e sofreu uma tentativa de estupro. Na ocasião, o agressor cobriu a boca da jovem com a mão e ela reagiu com cotoveladas. Ao perceber que não teria sucesso, o estuprador fugiu.

Desde então, outros casos de abuso sexual têm ocorrido tanto no ambiente acadêmico, como em festas dos cursos. A estudante M* também já foi vítima mais de uma vez. Ela conta que, no final do ano passado, voltando de uma festa, um ex-aluno da Poli a abordou enquanto ela esperava o táxi.

“Quando o carro chegou, ele entrou comigo rapidamente e me assediou durante todo o percurso, mas o taxista não interviu. Assim que chegamos na minha casa, eu desci correndo do táxi para que ele não me seguisse”, relata.

Feminismo na Universidade

Na Poli-USP ainda não há coletivos feministas, mas existe um grupo de estudo de gênero, chamado PoliGen, que promove debates frequentes na instituição.

O próximo passo do movimento “Politécnicas (R)existem” é organizar mais reuniões presenciais para expandir o debate e incluir as mulheres que estudam na instituição. De acordo com M*, elas também pretendem criar uma frente feminista para promover a luta contra o machismo de forma mais frequente.

* As identidades das entrevistadas foram preservadas.