Cyberbullying: a agressão virtual também deixa marcas
E ela pode – e deve – ser denunciada
Hoje em dia, ninguém mais fala que “vai surfar pela internet”. Mas a metáfora com o mar se mantém: ambos são fascinantes e perigosos. As profundezas da rede, que chamamos de “deep web”, escondem segredos e crimes; e também não é raro um tubarão chegar à superfície para roubar senhas de cartão de crédito e aplicar outros golpes. Assim como não é tão difícil para os piratas agirem em um território tão grande e complexo.
Essa sensação de impunidade é a segurança não só dos criminosos, como também dos cyberbullies: “trolls”, “haters” e outros tipos de “valentões” da internet, que criam mandam mensagens ofensivas, deixam comentários com agressões verbais, postam montagens maldosas e até espalham memes humilhantes. Em alguns casos, essas figuras da internet também podem ser julgadas como criminosas. E não se engane: mesmo com recursos de anonimato, a internet não é “território de ninguém”.
Nesta semana, o Catraca Livre lançou a campanha #BullyingNãoÉMiMiMi. A intenção é discutirmos sobre esse problema, cuja gravidade é ainda tão menosprezada. Os repetitivos xingamentos e humilhações podem ter efeitos negativos muito sérios na vida da vítima.
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Apesar de não envolver agressões físicas, o cyberbullying também é extremamente doloroso. Com um fator a mais: na internet, a difusão dos ataques é muito maior.
“Mar de ninguém”
Se os “valentões” online pensam que nunca serão punidos, as vítimas também acreditam que nada pode ser feito. Porém, na rede, nenhuma identidade fica realmente 100% escondida. E quem sofre ataques online pode entrar com uma ação judicial, sim; mas para saber o que pode ser feito em cada caso, é preciso consultar um advogado antes.
“Temos que considerar que para algumas pessoas que foram vítimas de cyberbullying, há uma necessidade por justiça”, observa o dr. Victor Auilo Haikal, advogado especialista em Direito Digital e sócio do escritório Patricia Peck Pinheiro Advogados. “Tem esse sentimento e a sensação de ser incapaz de fazer aquilo passar”.
A Justiça sempre tem o papel de definir as intenções e a gravidade das agressões, e alguns casos de cyberbullying rendem até indenização. Porém, há casos em que o bully realmente pensa que estava só fazendo uma “brincadeira”, sem a intenção de machucar a outra pessoa. O que nunca justifica o ataque e qualifica a reclamação como um “mimimi”, é claro. “Existe a responsabilidade de quem provoca o riso”, lembra o dr. Haikal, “se sentiu dor, pergunte”.
Não importa a sua intenção: será que é uma boa ideia fazer memes com o rosto do seu amigo e espalhá-los por aí? Será que isso não faz mal a ele?
O cyberbullying tem, sim, punição
O bullying sempre existiu; só não havíamos criado um termo específico para ele. Ele pode se encaixar em diversos crimes (injúria, calúnia, difamação e ameaça, por exemplo), embora o termo em si ainda não tenha sido caracterizado como uma infração à Lei no Código Penal Brasileiro.
No entanto, quando se trata de cyberbullying, o Marco Civil – conhecido como a Constituição da internet – é de grande ajuda para as vítimas. Isso porque dentre os princípios, garantias, direitos e deveres que ele estabelece para o uso da internet no Brasil, estão:
- O direito à privacidade
A lei prevê a inviolabilidade e sigilo de suas comunicações. Ninguém pode invadir as suas redes sociais, por exemplo. A quebra dessa barreira só pode ser feita mediante ordem judicial, e somente nos casos em que as informações puderem ajudar na identificação de usuários/terminais que estejam envolvidos em crimes.
- Os danos decorrentes de conteúdos gerados por terceiros
A Justiça poderá pedir a indisponibilização de conteúdos que se relacionem à honra, à reputação ou a direitos de personalidade que sejam postos na rede e criem danos. Nisso entram as montagens maldosas, comentários com ofensas e mesmo vídeos pornográficos que circulam pelas redes sociais
Estou sofrendo cyberbullying: o que eu faço?
O dr. Haikal tem algumas recomendações para as vítimas de cyberbullying. Confira:
- O primeiro passo é preservar os ataques. Ou seja: salvar o print deles, e se forem contínuos, seguir registrando.
- Nas redes sociais também é possível bloquear o agressor. “Às vezes a vítima não quer continuar recebendo as ofensas – ela também pode levar isso em conta”, diz o advogado. No entanto, quanto mais informações ela conseguir coletar sobre o agressor, mais fácil é de pegar o cyberbully. Portanto, quem optar por bloquear o agressor pode pedir ajuda aos seus amigos para coletar informações sobre ele, acompanhando as suas ações nas redes.
- Além disso, a maior parte das redes sociais permite que os usuários denunciem publicações que os incomodem. No Facebook, por exemplo, basta clicar na setinha ao canto superior direito do post e selecionar essa opção. Depois de informar os motivos da sua queixa, o site analisa se aquele conteúdo deve ser removido. “Se a publicação estiver de desacordo com os próprio termos de uso do site, ela, pode ser excluída”, explica dr. Haikal. Quando a sede desses sites não fica no Brasil, isso pode dificultar o caso – mas vale lembrar que empresas internacionais que operam em território brasileiro também devem se adaptar ao Marco Civil da Internet.
- No caso da vítima ser uma criança ou adolescente e o cyberbullying envolver o ambiente escolar, os pais e coordenadores da escola têm o papel de intervir. Como a a jornalista Vanessa Bencz contou ao Catraquinha, o agressor é a primeira vítima, e ele precisa de acolhimento também.
A importância de denunciar
Dr. Haikal aponta que infelizmente, a cultura do “forte” ainda predomina: se você não aguenta as agressões, você é o “fraco”, o que fica de “mimimi”. Há, ainda, a imagem do “dedo-duro”: ou seja, quem assiste às agressões, por vezes é ameaçado pelo bully para não denunciar o que viu.
Por isso, para o advogado, há um forte simbolismo na denúncia. “Ela mitiga a sensação de impunidade, sensibiliza as pessoas sobre como o cyberbullying é ruim e traz a sensação de conforto para a vítima”, ele conta. “Porém, a dor não tem como voltar atrás”.