Dimenstein: nunca o Brasil precisou tanto de bom jornalismo

Gilberto Dimenstein defende: o jornalismo deveria descobrir políticos íntegros e preparados com a mesma intensidade que dedica a descobrir larápios

Atacado por todos os lados, o jornalismo independente tem cumprido sua missão de fiscalizar todos os poderes, auxiliando no movimento de transparência que se espalha pelo Brasil. Nunca se combateu com tanto vigor a sensação de impunidade: a imprensa está ajudando a escrever um dos mais belos capítulos de resistência da história brasileira.

Porém, essa devassa nos podres poderes tem um trágico efeito colateral: a disseminação do desalento, a desconfiança de tudo e todos. Inclusive a desconfiança da eficácia da democracia. É um espaço fértil para aventureiros de diferentes ideologias. A saída é um jornalismo radicalizado na busca da objetividade. O jornalismo desenvolveu uma eficaz técnica de apontar problemas. Não existe nenhum profissional grupo tão preparado para combater a epidemia desinformação, batizada de Fake News, que contamina a internet. Uma epidemia que, literalmente, mata: basta ver como menos pessoas estão tomando vacinas, por acredita em mentiras das redes sociais.

Mas, o jornalismo ainda deixa a desejar em mostrar soluções. Isso porque existe uma tradição do “bad news is good news”. Ou seja, só conflitos, impasses ou falhas seriam notícia. Essa é uma visão parcial. A relevância da notícia não deveria ser apenas se ela é “ruim”, mas seu impacto na vida das pessoas. Ser objetivo é mostrar problemas e soluções. Daí que, nestas eleições, não faltam notícias ruins – e devem ser disseminadas com toda profundidade.

No entando, não podemos deixar de ver o óbvio: um movimento nacional de jovens entrando na política, buscando fazer a diferença especialmente no Congresso. Sem senadores e deputados qualificados, um presidente ou governador, mesmo que bem intencionado, pouco pode fazer numa nação que exige reformas urgentes. Sem essas reformas, vamos assistir passivamente ao Brasil se atolar ainda mais na ingovernabilidade, sem recursos para educação, saúde ou segurança.

Vemos voltarem doenças que se presumiam extintas, o crescimento da mortalidade infantil, o colapso dos hospitais públicos e as cidades transformadas em praças de guerra. Tudo isso só faz aumentar ainda mais a desconfiança com o sistema representativo, gerando um círculo vicioso que afasta nossos melhores talentos da vida pública. Junto com a volta do sarampo também ouvimos a volta de pessoas pedindo a intervenção militar.

O bom jornalismo deveria dedicar seu olhar investigativo a descobrir políticos íntegros e preparados – e com a mesma intensidade que dedica a descobrir larápios. Deveríamos descobrir esses personagens, estejam em que partidos estiverem, independentemente de sua ideologia. A crise brasileira da política também é uma crise de recursos humanos. Saber quem são, nesse ambiente deteriorado, é uma notícia que o leitor, ouvinte e espectador que saber para tomar uma decisão.Tratar todos igualmente não é ser objetivo nem isento. É desconsiderar o fato objetivo de que existem políticos melhores e piores.

Se o jornalismo não conseguir mostrar essa diferença, acabará, mais cedo ou mais tarde, ajudando a abalar o próprio sistema que garante a liberdade de imprensa.