Instituto Chão: muito além dos orgânicos
O Instituto Chão, conhecido por vender orgânicos a preço do produtor, propõe uma nova forma de relação com o trabalho: uma relação baseada na colaboração e na confiança
Quando agendei esse bate-papo com Juliana Braz, uma das integrantes do Instituto Chão, ela disse: “o dia mais calmo para você vir aqui e conversarmos é sexta-feira, pela manhã”. Cheguei umas 9h30, e lá estava ela: arrumando as verduras, atendendo no caixa, e tentando ao mesmo tempo tomar o café da manhã. Praticamente impossível fazer uma coisa de cada vez, já que a clientela não parava de chegar e lotava o espaço de 200 metros quadrados. Finalmente uma hora depois, conseguiu sentar-se para conversar comigo. Durante toda a entrevista, que se estendeu por mais de uma hora, o lugar permaneceu movimentado e lotado. É assim, o tempo todo.
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Por que o sucesso do Instituto Chão? Vende produtos orgânicos a preço do produtor: ou seja, se você paga R$ 2 por um pé de alface, esses R$ 2 vão direto para o pequeno agricultor. Para manter o espaço e a equipe, pede-se uma colaboração do consumidor no valor de 30% no total da compra – índice já calculado por previsão de venda. E pelo movimento, é possível ver que esse sistema dá muito certo!
O Instituto Chão está localizado na Vila Madalena, Zona Oeste de São Paulo. Abriu há um ano e, assim que estreou, já fez muito burburinho: um lugar onde você consegue comprar frutas, verduras, legumes, grãos e outros orgânicos que você não encontra no mercado, por um preço justo, tanto para consumidor mas principalmente para o produtor?!
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Juliana acompanhou essa trajetória do Chão desde o início, mas foi há seis meses que se uniu à equipe de 11 pessoas. Ela sai da Zona Sul de São Paulo e chega ao lugar por volta das 6h30, quando já tem caminhão esperando para descarregar. Arruma as folhas, varre o chão, descarrega caixas. Às 8h30 é hora de abrir as portas e receber as pessoas que já esperam no local. Às 14h30, quando o atendimento ao público é encerrado, todos se reúnem para “organizar a casa” e dar conta de toda a parte administrativa – só isso já se estende até a noite. O que ela faz no final de semana? Arruma suas coisas e se manda para um sítio onde também planta orgânicos, em Parelheiros, zona rural da cidade, região que ainda luta para manter o Cinturão Verde com mais outros 600 agricultores.
Engana-se quem pensa que a trajetória de Juliana é na agricultura. “Sou da cidade, sou urbana, trabalhei na periferia”. Psicóloga formada pela Universidade de São Paulo (USP), desde 1998 é militante da Economia Solidária – em 2014, concluiu seu doutorado no assunto. Durante 15 anos trabalhou como coordenadora no fomento de cooperativas de crédito, finanças solidárias, moeda social e outros projetos no Núcleo de Economia Solidária (Nesol-USP). O que a move é a relação que as pessoas têm com o trabalho, e como transformar o processo de produção, de lucro e principalmente de confiança. ”O mais difícil é vencer a desconfiança entre as pessoas. E o nosso trabalho está baseado nisso”.
O INSTITUTO CHÃO NA LÓGICA DA ECONOMIA SOLIDÁRIA
“Às vezes as pessoas me olham carregando caixa e devem pensar: ‘ah, não estudou, e fica aí carregando caixa’ ”, diz, entre risos. “Por que o trabalho braçal é visto dessa maneira? Tenho certeza que ganho mais que a pessoa que carrega caixas, mas queria que ela ganhasse o mesmo que eu. É a mesma lógica de pensar que para trabalhar é importante termos um banheiro limpinho na empresa, né? Então por que a pessoa que limpa banheiro ganha menos? E por que eu não posso fazer isso?”.
É assim que funciona o Instituto Chão: todos executam várias funções e ganham a mesma quantia. Sem hierarquia, chegaram a um consenso de quanto cada um deveria receber como salário. Logicamente, se uma pessoa trabalhou menos horas no mês, ganha o proporcional. Mas ninguém tem “valor” maior que o outro.
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