Jovens do Grajaú lançam primeira publicação de moda do bairro
Entrevistamos os criadores do projeto Perife, a primeira revista de moda do Grajáu, bairro do extremo sul da capital paulista. Confira!
No extremo sul da zona sul de São Paulo, o Grajaú é a região mais populosa da maior cidade da América Latina, com 360 mil habitantes segundo dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
A maioria dos moradores são nordestinos, o que explica a música ambiente do bairro: o Forró ou Brega – utilizados como ponto de partida para a primeira revista de moda da região, a “Perife”, lançada no mês de maio e disponível aqui.
Na edição de estreia, “Transviada Brega”, o designer gráfico Rafael Cristiano e o produtor cultural Vinicius Linhares, idealizadores do projeto, discutem gênero e criatividade de uma população marginalizada demograficamente e socialmente, mas que tem muita história para contar.
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Confira a ideia que o Catraca Livre trocou com Rafael Cristiano, idealizador do projeto:
Como é a vida de uma LGBTT na periferia de São Paulo? Quais são os principais desafios e lições ?
Acho que a vida de uma pessoa LGBTT na quebrada é ser subversiva. É não ser a cara do próprio movimento LGBTT. Acho que não posso dizer com toda a propriedade pois eu não me enquadro (hoje) em nenhuma das siglas, mas eu acompanho o movimento dentro da periferia, sempre presente em rodas que discutam as condições da gay periférica.
Além de 90% d@s meus/minhas amig@s serem e fazerem parte do movimento. A presença de negr@s é algo que não se vê muito quando se fala de direitos LGBTT nas mídias, ou nas campanhas que circulam a cidade, já na quebrada essa é a cara.
Como produzir um canal de comunicação no Grajaú? Qual o objetivo do projeto e como dialogar com o resto da cidade a partir da perspectiva do extremo sul da zona sul de SP?
Produzir um canal de comunicação no Grajaú é uma parada muito fértil, aqui é uma região que prolifera arte, artistas, posicionamento e atitude. A pergunta é porque não produzir?
Somos pessoas que não vão estar em mídias convencionais que se vê nas bancas, na televisão ou no jornalzinho do metrô, e se estiver é no lugar estereotipado de negr@ ferrad@, favelad@ escandalos@, e somos mais do que isso. Somos bem mais do que isso. Produzimos e consumimos arte, criamos e ditamos nossa moda, assumimos nossos cabelos, queremos mais, queremos subverter o lugar pré-destinado. E se isso não ocorrer nas mídias convencionais. CRIAMOS A NOSSA. É um objetivo pretensioso até. rs. Mas eu penso na PERIFE assim.
Num cenário marcado pela ausência de direitos e qualquer privilégio, distante geograficamente do centro, o que representa o poder da internet nos dias atuais ?
Eu acho a internet um importante meio de ligar as pessoas do movimento, as pessoas que podem fazer a coisa acontecer seja ela virtual ou no olho a olho. Eu vejo o uso dela como veiculação da luta.
Eu como designer não excluo a importância dela. Acho que é onde as pessoas estão hoje em dia, negar isso é quase impossível. Em resumo acho que é o lugar da onde surge as possibilidades de irmos pro olho a olho. De fazermos as coisas rodarem.
Como vocês veem as tendências da moda na periferia? De que forma os diferentes estilos influenciam vocês?
Primeiro acho que aqui tem de um tudo. Rs. Tem quem usa loja de departamento, tem quem compra e monta look nas lojas do bairro em que qualquer peça é 10 conto, tem quem garimpe os poucos brechós existentes aqui, tem quem compra as camisetas estampadas da internet, quem pega dos irmãs e irmãos mais velhos e de amig@s que não servem mais, e tem quem crie as suas próprias roupas (um dos modelos da primeira edição da Perife é costureiro, filho de costureira, e ambos criam roupas pra el@s e pras pessoas do bairro).
Eu entendo por moda criada aqui, qualquer uma delas. Entendo quem cria a partir da condição, quem cria look com referência na novela das 8, e quem inventa, mistura cor, coloca blusa por cima de blusa, bota umas toca no meio e diz: “Eu mesma que inventei.”. A moda do funk que é BEM presente aqui, com as imitações de marcas (ou alguns com as verdadeiras, rs). E com as “meninas que não sentem frio”. A galera do rock, que só sai de casa se for pra sair de preto. Somos muit@s e de muitas vertentes, a Perife quer nos colocar no centro dessas discussões. Mostrar o que criamos e como criamos.