Marcha da Maconha celebra legalização do debate
por André Nicolau e Brunno Marchetti
No lugar das cenas de violência, que marcaram os últimos anos de manifestação, o que se registrou na última Marcha da Maconha, no dia 19 de maio, foram momentos de entusiasmo e celebração. Em 2012, foi comemorada uma vitória, a primeira num processo de reivindicação que pede o fim da guerra ao tráfico: a permissão para realizar a marcha legalmente.
Entre os milhares de manifestantes, estava o neurobiologista Renato Filev, 27, um dos organizadores do movimento, que alia dedicação profissional e militância. “Com a neurobiologia, busco difundir os valores benéficos e também os efeitos colaterais do consumo de Cannabis na minha prática dentro do movimento social”. E conclui: “é evidente que meu ativismo não influencia na produção dos resultados de minha pesquisa, porém pode influenciar na formulação das minhas hipóteses”.
Foi por meio dos estudos, que o especialista em sistemas canabinóides começou a desconfiar de que as razões para a proibição poderiam ir além de questões científicas. “Percebi que essa era uma discussão sobretudo política, econômica e socio-cultural”, reflete Filev. “Eu não poderia entrar nela utilizando-me apenas de conhecimento ciêntífico”. Por isso, a partir de 2007, começou a participar das primeiras reuniões da chamada Global Marijuana March, que sucedeu as violentas repressões das antigas Passeatas Verdes.
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Para outra militante do movimento, Gabriela Moncau, 22 anos, a conquista não veio por acaso. Diante dos episódios de conflitos que precederam o êxito do último sábado, a jornalista destaca o esforço desempenhado pelo coletivo na busca por respeito, tolerância e diálogo com o Estado.
A frase “As flores venceram o canhão”, estampada no peito e em muitas bandeiras hasteadas na passeata, faz alusão ao histórico de excessos e desrespeito cometidos pelas autoridades paulistas em 2010 e 2011.
Em ambas as ocasiões, manifestantes e jornalistas foram atacados pelas forças policiais em cenas que lembravam uma praça de guerra. “É importantíssimo lembrar que, se hoje podemos comemorar a marcha na rua, com adesão de diferentes setores da sociedade, foi porque lutamos pela nossa liberdade”, destaca Gabriela. A militante ressalta ainda duas vitórias: a liberação do Supremo Tribunal Federal (STF) e a vitória como movimento social.
Mas Gabriela chama a atenção para o fato de que, apesar do saldo favorável, o momento é para reflexão e construção de um caminho que busque novas vitórias no futuro. “Ainda é preciso avançar. Temos que mudar cada vez mais esse estigma de que lutamos meramente pela legalização de uma substância psicoativa. A sociedade precisa saber que a nossa luta não é só pelo fim da guerra às drogas, mas pelo fim do genocídio que mata milhares de pessoas em todo país”.
“Amanhã vai ser maior?”
A despeito do impasse neste diálogo, Renato Fliev atenta para possibilidade do governo brasileiro assumir uma posição neutra em relação à política de legalização. Mas por outro lado, destaca o papel de figuras importantes neste processo de discussão: “é importante ressaltar o papel de liderança de brasileiros em comissões internacionais sobre o tema como o ex-preseidente Fernando Henrique Cardoso”.
E conclui: “o que nós do movimento social devemos lutar é para que haja uma regulamentação humanizada, defendendo o pequeno produtor, a diminuição do acúmulo do capital em torno da planta, da proteção e informação de nossos jovens, da restrição de propagandas, do respaldo àqueles que sofrem prejuízo pela utilização da planta, além da urgente demanda da Cannabis medicinal”.