‘Não desista do seu filho’, diz mãe, após mais de 40 internações

Mirela deixou a carreira de lado para se dedicar em tempo integral à filha Melissa, que tem necessidades especiais

11/05/2018 16:04 / Atualizado em 10/05/2019 15:05

“Em alguns momentos, achamos que não temos mais força, que é difícil demais suportar. Mas aí você olha para o seu filho lutando para viver, você reza com fé, vai se fortalecendo e, quando você vê… já passou”, diz Mirela Miranda Nobre, 38.

Mirela e os filhos Melissa e Cadu
Mirela e os filhos Melissa e Cadu

Formada em Turismo, Hotelaria e Inglês, esta baiana de Miguel Calmon tem dois filhos, Carlos Eduardo, 9 anos, e Melissa, 5 anos, e teve de dar uma pausa na carreira por um motivo urgente: acompanhar de perto a filha caçula, cuja rotina inclui, semanalmente, sete sessões de fisioterapia, duas de terapia ocupacional, uma de fonoaudiologia, duas aulas na Apae, além de alimentação a cada três horas e medicação das 6h às 23h.

Melissa nasceu com Síndrome de Down e uma cardiopatia congênita que faz com que ela tenha de encarar muitas cirurgias, internações e intervenções. Aos 5 meses, após o implante do marca-passo, a bebê também foi diagnosticada com paralisia cerebral.

Mirela não conhecia nada de medicina, mas como missão dada para mães é missão cumprida, resolveu aprender _ e entender _ tudo o que se passava com a menina. “Eu fiz questão de aprender tudo da área médica que envolve minha filha, desde os termos até a execução de procedimentos, como aspirar, discutir antibióticos, ler exames laboratoriais, questionar condutas. Não sou médica, mas posso dizer que de minha filha eu entendo.”

Houve vezes em que, graças a uma observação da mãe sobre a condição da filha, os médicos chegaram a decisões mais favoráveis sobre procedimentos. “Costumo falar que ela é uma faculdade de medicina completa, de neurologia a ortopedia tem um pouco de tudo, imunologia, cardiologia, radiologia, cirurgia, mais as terapias… Só sendo mãe de UTI para aprender tudo o que aprendi.”

Melissa, que é aluna da Apae de Jacobina (BA)
Melissa, que é aluna da Apae de Jacobina (BA)

Não foi só isso que as necessidades da filha ensinaram a ela. “Eu aprendi a enxergar a diferença com outros olhos. A luta de uma mãe com criança especial é diferente. Abracei a inclusão, falo e exponho nossa rotina para que as pessoas vejam que crianças com necessidades especiais sorriem, comem, brincam, choram, dormem, amam e são amadas.” E completa: “Eu me tornei mais humana, mais justa, mais segura. Mel me ajuda com o olhar e o sorriso. Sei que a força dela vem de mim, não posso fraquejar”.

E Mirela não fraqueja. Bem humorada e com pensamento positivo, acaba ajudando outras pessoas na UTI ou mesmo parentes que ficam preocupados com o estado de Melissa. Desde que ela nasceu, foram mais de 40 internações, 30 transfusões de sangue, 23 pneumonias, 8 cirurgias e 3 choques sépticos. “Eu descobri minha força ainda no InCor, em 2013, quando ela fez a primeira cirurgia. Foram tempos difíceis. Procurei me espelhar em outras mães e ouvir conselhos da equipe da UTI. Um deles: não desista do seu filho. Hoje, o que mais ouço é: ‘Vocês são guerreiras, mãe e filha!’”

Ao decidir virar “doutora em Melissa”, a carreira em turismo da baiana ficou de lado. E ela não se arrepende. “Nunca. Também não confiaria essa tarefa [cuidados com a filha] a outra pessoa. Ninguém ama Mel mais do que eu, então ninguém cuidaria com tanto amor e tanta devoção. Mas sinto saudade, sim, da minha profissão, das viagens em grupo, de atender meus clientes e organizar cada detalhe da viagem deles…”

Sempre que pode, Mirela tira um tempo para cuidar também dela mesma, seja fazendo pilates, seja para encontrar as amigas ou sair sozinha com o marido. É o caminho para manter a mente e o corpo sãos, observa.

Ser mãe, diz ela, é ter “responsabilidade por pessoinhas que dependem de você, que você ama, protege, faz tudo para vê-los bem. É amar alguém mais que a si próprio”. E, também, ficar dividida. Como quando tem de viajar a Salvador ou São Paulo para acompanhar Melissa em consultas ou internações, enquanto Cadu fica em casa, com o pai.

“O mais difícil é isso: ficar com um na UTI e deixar o outro em casa. Eu sinto falta demais de Cadu. Mas tento compensar ligando à noite para rezar com ele, estudar para a prova da escola por FaceTime… A tecnologia tem nos ajudado. Quando a saudade aperta demais nos encontramos. Não passamos mais de um mês sem nos vermos. E neste domingo, que estou com Mel em Salvador internada, ele veio para passar o Dia das Mães comigo.”

O Dia das Mães de Mirela deste ano só seria mais perfeito se combinasse com a alta de Melissa. “Só Deus pode me dar isso, a saúde de Melissa restaurada, que ela volte a respirar sozinha e tenha alta da UTI para juntas voltarmos para nossa casa, nossa doce rotina! Quem sabe um dia ensino ela a nadar, né? Ela ama piscina, bate pés e mãos…”

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