“Minha dor não é mimimi”: Familiares de vítimas da covid levam histórias de dor e sofrimento à CPI
Se estes relatos não te causam indignação, reflita sobre sua existência
Familiares de vítimas da covid-19 e pessoas que tiveram a doença causada pelo novo coronavírus contaram histórias de dor e sofrimento em depoimentos prestados, nesta segunda-feira, 18, à CPI do Senado que investiga as falhas do governo federal no enfrentamento à pandemia.
“Nossa dor não é mimimi, não é normal, nós não somos palhaços”, disse, emocionado, o taxista Márcio Antônio Silva, que perdeu o filho de 25 anos para a Covid-19 em abril do ano passado.
Márcio Antônio ficou conhecido em todo país por recolocar cruzes nas areias das praias de Copacabana, no Rio de Janeiro, que foram derrubadas por um bolsonarista. As placas faziam parte de um ato organizado pela ONG Rio de Paz, em homenagem às vítimas da covid-19.
- A merda que vai continuar no seu bolso se Bolsonaro for reeleito
- Como foi o primeiro debate presidencial das Eleições de 2022
- Mario Frias ataca Paulo Gustavo e insinua que ator não morreu de covid
- Saiba quais são os 11 crimes que a CPI da Covid deve indiciar Bolsonaro
Durante seu depoimento, o taxista cobrou um pedido de desculpas do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) às vítimas e aos seus familiares. Ele também cobrou o mandatário pelas frases minimizando o sofrimento, como quando Bolsonaro disse que as pessoas tinham que parar de “frescura” e “mimimi” e respondeu “e daí?”, ao ser questionado sobre o número de óbitos por covid no Brasil.
“Eu acho que nós merecíamos um pedido de desculpa da maior autoridade do país. Porque não é questão política – se é de um partido, se é de outro. Nós estamos falando de vidas de pessoas. Cada depoimento aqui, eu acho que, em cada depoimento, um sentiu o depoimento do outro e acrescentou o que o outro tinha para falar, entendeu? Então, a nossa dor não é mimimi, nós não somos palhaços, entendeu? É real, sabe?”, afirmou o taxista visivelmente abalado.
Kátia dos Santos perdeu o pai e a mãe para a Covid em março desde ano, e lamentou que ambos não tenham conseguido tomar a vacina a tempo. A mãe de Kátia ainda foi tratada no hospital com o chamado “kit Covid” formado por medicamentos sem eficácia contra a doença, mas defendido por Bolsonaro como forma de tratar a doença.
“Faltou, na verdade, o trabalho do governo, que deveria ser mais sério, de tratar com mais seriedade toda essa pandemia que nós passamos e estamos passando ainda aqui no Brasil”, disse ela.
“Quando a gente vê um presidente da República imitando uma pessoa com falta de ar, isso para nós é muito doloroso. Se ele tivesse ideia do mal que ele faz para a nação, além de todo o mal que ele já fez, ele não faria isso”, completou.
Katia dos Santos contou os últimos momentos com a mãe no hospital. “‘Filha, eu estou com sede, eu quero água’. E a enfermeira dizia que eu não podia nem tirar a máscara para dar água para ela, porque ela estava tomando a água espessa – que era espessada com um material que eles colocam para deixar ela mais grossinha, para não engasgar. E aí a enfermeira falou que a situação dela estava bem complicada, e eu peguei uma gaze e molhei a boca dela para aliviar um pouco a sede dela”, contou.
“Por isso é que eu falo que quando a gente vê um presidente da República imitando uma pessoa com falta de ar, isso para nós é muito doloroso. Se ele tivesse ideia do mal que ele faz para a nação, além de todo o mal que ele já fez, ele não faria isso”, afirmou Kátia.
A estudante Giovanna Gomes Mendes da Silva, de 19 anos, contou que perdeu a mãe e o pai e que teve de assumir a guarda da irmã, de 11 anos.
“A gente tinha os dois esteios da nossa vida, os dois pilares, as pessoas que cuidavam da gente, que sustentavam e faziam tudo. A gente não tinha essa responsabilidade. A gente passou a não ter e também a não ter quem nos ajudasse com isso. A gente teve pessoas próximas, familiares e amigos da minha mãe, que, com o pouco que tinham, eles começaram a ajudar a gente”, contou Giovanna.
A enfermeira Mayra Pires Lima, moradora de Manaus. perdeu a irmã para o coronavírus em janeiro deste ano. A capital do Amazonas viveu um colapso na rede pública de saúde que levou à morte de pacientes por falta de oxigênio. A irmã de Mayra deixou quatro crianças.
À CPI, ela relatou a dificuldade para conseguir um leito de UTI. “Em cinco dias de sintomas, na fase inflamatória da doença, ela precisava de UTI, e, infelizmente, a UTI demorou dez dias enquanto ela estava no hospital. A cidade de Manaus virou um deserto. As únicas pessoas que andavam em Manaus eram os profissionais de saúde, a polícia e os serviços essenciais, porque, se a população toda adoece, você pode mandar uma grande quantidade de oxigênio que você não vai resolver”, contou.
A enfermeira relatou ainda que acabou o oxigênio da irmã e a própria família se uniu para comprar. “Todo o oxigênio mandado pelo governo federal e por todas as pessoas que foram benfeitoras não foi o suficiente, porque era uma grande quantidade, mas infelizmente o número de doentes era bem maior do que a quantidade enviada”, contou.
O relator Renan Calheiros (MDB-AL) deve propor a responsabilização de Bolsonaro por pelo menos 11 crimes. O parecer deve ser votado na próxima terça-feira, 26.