Olhar Circular leva cinema a trabalhadores rurais e refugiados

Com tapete vermelho e telão, projeto Cine Olhar leva cinema para estudantes, trabalhadores rurais e haitianos refugiados

Em parceria com Jéssica Balbino
18/09/2018 17:18

Aos 34 anos Edson Ferreira de Lima, de Alagoas, nunca tinha ido ao cinema. A primeira experiência ocorreu no mês de agosto, com a exibição do filme “Tapete Vermelho”, no projeto Olhar Circular, que leva oficinas de fotografia, artes visuais, cultura contemporânea e exibições de cinemas a pelo menos 60 alunos com idades entre 16 e 78 anos do projeto de Educação para Jovens e Adultos (EJA), da Escola Municipal José Bonifácio, em Andradas (MG).

Com tapete vermelho, telão, cadeiras enfileiradas e pipoca, a sessão de cinema é uma novidade para muitos dos alunos, até então habituados com a vida na área rural, onde trabalham. “Foi incrível. Foi a primeira vez que assisti um filme em tela grande, assim. Adorei. Achei engraçado o filme. Muito bacana a experiência”, contou Edson.

Com tapete vermelho, telão e pipoca, estudantes vão ao cinema pela primeira vez
Com tapete vermelho, telão e pipoca, estudantes vão ao cinema pela primeira vez - Paulo Tothy

Mas a novidade do cinema não foi uma exclusividade apenas para Edson, o refugiado haitiano Jean, também vivenciou a experiência pela primeira vez.  Em um misto de francês, inglês e o pouco que já consegue falar do português, contou como foi. “Foi ótimo. Foi a primeira vez que assisti a um filme no cinema. No Haiti não via e aqui também. Estou no Brasil para trabalhar e agora para estudar e gosto do projeto”, disse.

Criado por Valéria Freitas e Larissa Freitas, o projeto é executado no município que tem pouco mais de 40 mil habitantes, segundo o censo mais recente do Instituo Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e nenhuma sala de cinema.  Por isso, a população da cidade também pode assistir aos filmes.

A escolha dos filmes fica a cargo de Larissa Freitas, que opta pelo cinema brasileiro. Na primeira sessão, foi o “Tapete Vermelho” e na segunda “Saneamento Básico”. “É o mais próximo da nossa realidade, com histórias parecidas com as nossas, próxima das nossas vivências, dialogando de forma mais simples e como nossos alunos estão iniciando os estudos agora, a questão da língua é muito importante”, destacou.

O professor de fotografia, João Fábio Matheasi, também fala sobre a experiência de dar aulas aos estudantes do EJA. “São pessoas incríveis, que têm uma carga cultural gigantesca, diferente da minha e que me ensinam muito”, comentou.

Conforme explica Valéria de Freitas, o projeto, para além do entretenimento, traz também estímulo para que os alunos permaneçam no EJA e concluam os estudos. “A secretária de Educação nos disse que em setembro costuma haver uma grande evasão e o projeto foi escolhido para tentar garantir essa permanência, estimulando os estudantes a virem à escola. Espero que o projeto possa trazer esse incentivo”, destacou.

E tem dado certo. Para o estudante José Carlos Anastácio, de 57 anos, voltar a estudar é uma vitória. “Voltar a estudar é sempre bom. A gente vai viver, aprender, aprender, aprender e morrer sem saber nada.  Cada coisa que a pessoa aprende, ela está indo para frente. Ela nunca volta. É importante cada coisa que aprendemos, seja na sala de aula, seja lá fora. Em qualquer lugar, é aprendizado”, comentou.

Sobre o projeto
O projeto Olhar Circular ocorre há oito anos e tem como objetivo estimular adolescentes a dialogar sobre cultura, patrimônio, memórias e vivências e as oficinas são voltadas a fotografia e cultura. “Vamos trabalhar as artes como meio de construção ético sociocultural em conjunto com as comunidades”, disse a produtora do projeto, Valéria Freitas.

Vale destacar que as oficinas tem mediação do fotógrafo João Fábio Matheasi e da produtora cultural Larissa Freitas. O material captado pelos alunos será publicado no site do projeto e na página do Facebook do Olhar Circular, construindo novas narrativas a partir das vivências e experiências individuais que eles terão ao longo do projeto.

No primeiro semestre deste ano, o Olhar Circular ministrou oficina a dezenas de alunos na Escola Padrão, na zona sul de Poços de Caldas. Eles inclusive fizeram fotos sobre preconceitos sofridos no dia a dia e o resultado deve ser uma exposição no final do ano. Os alunos também visitaram o Instituto Moreira Salles (IMS Poços), conhecendo exposições.

Olhar Circular
O projeto Olhar Circular ocorre desde 2008 e nas três primeiras edições realizadas através do Prêmio do BID – Banco Interamericano de Desenvolvimento e da Lei Municipal de Incentivo à Cultura de Poços de Caldas, teve a experiência de realizar oficinas abertas à população de Poços de Caldas de todas as faixas etárias e contou com a participação de adolescentes, adultos e pessoas na terceira idade. Isso provocou um intercâmbio cultural entre gerações e deu ao projeto um caráter abrangente.

Nos anos seguintes, beneficiou mais de duas mil pessoas através das oficinas e workshops realizados em Poços de Caldas e Andradas com recursos das leis Rouanet e Estadual de Incentivo à Cultura de Minas Gerais.

Neste segundo semestre o projeto ocorre com patrocínio da Icasa através da Lei Estadual de Incentivo à Cultura de Minas Gerais. A realização é da Pomar Produtora Cultural, com apoio das Secretarias Municipais de Educação e de Cultura de Andradas.

Serviço – Mais informações podem ser encontradas no  site http://olharcircular.com.br/