“Pirataria cívica”: o que acontece quando uma comunidade tem espaço para criar

O Freespace é um experimento em que cidadãos ocupam um espaço por um mês para criarem todo o tipo de coisas e projetos que possam levar algum tipo de benefício à população

Em um espaço de 14 mil metros quadrados no distrito de Central Market, em São Francisco, EUA, é possível encontrar uma série de atividades aparentemente organizadas: pessoas montam mesas, uma programação do dia-a-dia rabiscada em giz na parede, alguém varrendo o chão, uma família examinando a montagem de uma corrediça (que em breve será instalada, mas ninguém ainda sabe onde) um bolo sendo cortado na cozinha e um monte de pessoas no grande jardim dos fundos. Nesse local funciona o Freespace, uma experiência de “civic hacking”, ou “pirataria cívica” em tradução livre.

O espaço no número 1131 da Mission St. antes e depois do hacking. A intenção da iniciativa é fornecer um local para que as pessoas pensem em usos criativos e projetos diversos.

A atividade consiste em uma intervenção feita pela população em um determinado espaço no período de um mês. O objetivo é usar inovação e tecnologia coletiva para integrar e pensar em soluções criativas para a comunidade. No espaço, por exemplo, tudo é doado ou colhido: os sofás, as mesas, a geladeira, tudo dentro da geladeira, a corrediça, a arte, os materiais de jardinagem e até mesmo o Buda gigante do século 12 sentado no segundo andar.

Pirataria

A ideia do Freespace surgiu no Dia Nacional de Civic Hacking, no começo de junho. O espaço não funciona com uma agenda específica e nem é divulgado na mídia. Durante o mês, todos os convites foram feitos no boca a boca e a maioria das pessoas chegou a seu primeiro encontro sem saber o que iria encontrar.

Segundo seus criadores, o experimento é uma forma de levar o espírito de inovação e coletividade para as pessoas que nunca vivenciaram a experiência de criação coletiva. No espaço são elaborados, compartilhados, apropriados e realizados projetos que propõem algum benefício à comunidade.

Nos murais, por exemplo, funciona o Artspace, uma iniciativa que pretende conectar grafiteiros e pintores a espaços vazios – algo semelhante com o Color+City –, enquanto no jardim fica um projeto que transforma partes de bicicletas velhas em novas bikes. Há ainda maratonas de diversas atividades tecnológicas, aulas de yoga, clubes de livros, concertos e um cultivo de flores que são distribuídas pelos arredores.

Todas essas coisas que acontecem no Freespace são temporárias, mas o objetivo é que elas continuem. Mesmo  depois que o mês de experiência tiver passado e o espaço desocupado.

Espaços livres para cidades fechadas

Enquanto os “Freespacers” percebem e aceitam a natureza efêmera da sua experiência, eles ainda estão tentando mantê-la com uma campanha de financiamento coletivo, tentando levantar US$ 25.000 para o aluguel de julho (o deste mês custou o valor simbólico de US$1). Os criadores explicam que metade de junho foi gasta apenas para arrumar o espaço e que um mês extra pode ser ótimo para os projetos que estão sendo incubados.

Os nativos reconhecem que São Francisco passa por um processo “gentrificação” – os trabalhadores muito bem pagos da indústria da tecnologia estão “precificando” os mais pobres para fora da cidade – e o espírito criativo do local vai se perdendo no caminho. O panorama é recorrente em várias cidades que estão se valorizando em todo o mundo. Mas o que o Freespace tenta mostrar é que esse espírito criativo não está perdido. Não enquanto houver “pirataria cívica” e integração de pessoas.

Por Redação