Por que Roraima virou o estado que mais mata mulheres no Brasil

Segundo o relatório "Um dia vou te matar", da Human Rights Watch, Roraima tem 11,4 homicídios a cada 100 mil mulheres

Roraima é o estado com a maior taxa de homicídio de mulheres no Brasil, informou a Human Rights Watch em um estudo divulgado nesta quarta-feira, dia 21. De acordo com a organização, o grande número de casos na região reflete as falhas em todo o país para punir os agressores e proteger as vítimas de violência doméstica.

O relatório, intitulado “‘Um dia vou te matar’: impunidade em casos de violência doméstica no estado de Roraima”, faz uma análise dos problemas sistemáticos na resposta do estado ao feminicídio. A instituição levantou 31 casos de violência doméstica e entrevistou vítimas, policiais e autoridades do sistema de justiça.

Apenas um quarto das vítimas de violência doméstica denuncia a agressão no Brasil
Créditos: Getty Images/iStockphoto
Apenas um quarto das vítimas de violência doméstica denuncia a agressão no Brasil

“Muitas mulheres em Roraima sofrem abusos e violentas agressões durante anos antes de reunirem coragem suficiente para procurar a polícia. E, quando o fazem, a resposta das autoridades é péssima”, declarou à imprensa Maria Laura Canineu, diretora do Brasil na Human Rights Watch.

Entre 2010 e 2015, a taxa de homicídio feminino aumentou 139% em Roraima, chegando a 11,4 homicídios por 100 mil mulheres em 2015, o último para o qual há dados disponíveis. A média nacional é de 4,4 assassinatos para cada 100 mil mulheres, o que já é uma das taxas mais elevadas do mundo.

Segundo uma pesquisa de fevereiro de 2017, apenas um quarto das vítimas brasileiras denuncia a agressão. A instituição descobriu que mesmo quando as mulheres em Roraima contatam a polícia, enfrentam obstáculos consideráveis para terem os seus relatos ouvidos.

Falhas no atendimento

O coordenador estadual de polícia comunitária e direitos humanos da polícia militar do estado de Roraima contou à ONG que, devido à falta de efetivos, não consegue deslocar agentes para responder a todas as ligações de emergência de mulheres que relatam estar sofrendo violência doméstica.

Outras vítimas vão à delegacia, mas são orientadas a ir embora. Alguns agentes da polícia civil em Boa Vista, capital do estado, se recusam a registrar um boletim de ocorrência de violência doméstica ou solicitar medidas protetivas, concluiu o documento.

Em vez disso, eles direcionam as vítimas para a única Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher no estado, mesmo nos horários em que se encontra fechada.

Mesmo quando a polícia registra as denúncias, as mulheres têm que contar suas histórias de abusos no ambiente aberto da recepção, pois em nenhuma delegacia do estado há salas privativas para colher seus depoimentos.

Além disso, a polícia civil não consegue dar conta do volume de ocorrências que recebe. Em Boa Vista, a polícia não conduziu nenhuma investigação em 8.400 boletins de ocorrência de violência doméstica que estão acumulados.

Muitos casos se arrastam por anos e acabam arquivados em razão da prescrição dos crimes, sem que alguém seja formalmente denunciado.

Taise Campos, uma professora de 38 anos, contou à Human Rights Watch que registrou mais de 15 boletins de ocorrência para denunciar repetidos atos de agressão física e verbal por parte do ex-marido. Contudo, houve a prescrição antes que ele fosse julgado pelos supostos crimes.

Lei Maria da Penha

O Brasil tem normas abrangentes para prevenir a violência doméstica e garantir a justiça quando ocorrem abusos, estabelecidas pela Lei Maria da Penha, de 2006. Mas ainda falta implementar adequadamente muitos de seus dispositivos.

A lei previa a expansão de delegacias da mulher e de núcleos de atendimento às vítimas de violência doméstica dentro de delegacias comuns.

No entanto, essas unidades permanecem concentradas nas grandes cidades e muitas vezes são de difícil acesso para quem vive em outras regiões. Esses núcleos também estão sobrecarregados, servindo em média uma população de 210.000 mulheres cada um.

A lei permite aos juízes determinar que os suspeitos de abuso mantenham distância da residência da vítima e que não entrem em contato com ela ou seus familiares, entre outras medidas de proteção.

Saiba mais sobre o relatório neste link.

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