A relação entre Bolsonaro e a morte da mulher que cozinhou com álcool
Geisa Sfanini, de 32 anos, morreu porque teve 90% do corpo queimado após usar álcool ao invés de gás para cozinhar. Ela não tinha dinheiro para o botijão
Há relação entre o governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e a morte Geisa Sfanini, a mulher de 32 anos, que teve 90% do corpo queimado após usar álcool combustível para cozinhar em Osasco, na região metropolitana de São Paulo (SP).
Geisa morreu nesta segunda-feira, 27, na Unidade de Tratamento de Queimados do Hospital Geral de Vila Penteado, em São Paulo. Ela estava internada no local desde o último dia 2, após ter sofrido o acidente com o álcool, pois não tinha dinheiro para comprar o botijão.
De acordo com uma vizinha de Geisa, Mônica Teixeira de Oliveira, de 34 anos, a mulher passava por dificuldades financeiras e por isso estava sem dinheiro para comprar gás de cozinha.
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“Como as coisas apertaram, algumas vezes ela se alimentava na minha casa, ou eu mandava comida para ela, leite para o neném. Ajudava em tudo. Ela era uma pessoa incrível, cheia de sonhos e muito vaidosa apesar das dificuldades”, disse Mônica em entrevista ao portal G1.
Geisa recebia bolsa aluguel da Prefeitura de Osasco e estava desempregada. Ela sustentava seu filho, Lucas Gabriel, de oito meses, que teve 18% do corpo queimado no mesmo acidente, mas sobreviveu, com cerca de R$ 375 que recebia do Programa Bolsa Família, além de bicos como vendedora de perfume. O bebê, agora, mora com o pai.
Desde o início do ano, o preço médio do botijão de gás aos consumidores subiu quase 30%, chegando a ser vendido a até R$ 135 na região norte do país, segundo dados da Agência Nacional do Petróleo (ANP).
O preço médio estava em R$ 75,29 no final de 2020 e chegou a R$ 96,89 há10 dias. A alta é mais de 5 vezes a inflação acumulada no período, de 5,67%.
Os números falam por si e fazem parte da carestia que as famílias têm enfrentado nos últimos meses, com os também violentos aumentos do arroz, do óleo de soja, da carne, entre outros alimentos básicos, à mercê de exportações descontroladas que desabasteceram o mercado interno. Além do aumento da conta de luz que neste mês está na bandeira vermelha patamar 2.
Os aumentos do gás de cozinha refletem o absurdo da política de preços do governo Bolsonaro de atrelar os preços dos combustíveis ao mercado internacional e à variação do dólar.
Se para a gasolina e diesel essa política já atravessou a economia, com a greve dos caminhoneiros de maio de 2018 paralisando o país, quando observamos seus efeitos no gás de cozinha o impacto são imediatos e perversos, particularmente para as famílias de baixa renda que não têm como comprá-lo.
Numa medida demagógica, Bolsonaro zerou a alíquota de PIS e Cofins que incide sobre o gás de cozinha por alguns meses. Nada que pudesse fazer frente à política de preços atrelada ao mercado estrangeiro.
Desde outubro de 2016, quando o então governo de Michel Temer (MDB) resolveu implementar o Preço de Paridade de Importação (PPI), a fim de atender uma demanda dos importadores de derivados de petróleo, os preços dos combustíveis dispararam nos postos de distribuição do país.
O PPI é formado pelas cotações internacionais da gasolina, diesel, gás, etc., adicionado aos custos que importadores teriam, como frete marítimo, perda, seguro, imposto da marinha mercante (quando aplicáveis), taxa de câmbio, mais parcela fixa ao custo estimados do frete rodoviários, mais a parcela fixa equivalente ao custo estimados do armazenamento e movimentação do terminal.
Os países que não são produtores de petróleo têm que importar derivados. Eles não têm alternativa. Eles têm que utilizar o PPI, mas esse não é o caso do Brasil.
Esta política faz os preços praticados pela Petrobras dependerem, fundamentalmente, dos preços do óleo, dos derivados e da taxa de câmbio. Ou seja, o preço do botijão aqui no Brasil depende também da cotação do dólar.
Com o dólar nas alturas, a disparada dos preços que seguem essa política foi exponencial. Segundo dados do Sindicato dos Petroleiros de São Paulo, até março deste 2021, o preço da gasolina cresceu 73,3%, o diesel aumentou 54,8% e o gás de cozinha subiu 192%, enquanto nesse mesmo período, a inflação medida foi de 17,7%.
Bolsonaro, apesar de na eleição ter propagado que o botijão de gás custaria R$ 30,00, defende manter o regime PPI na Petrobrás, com o argumento de que essa modalidade de preços estimula a concorrência e competitividade no setor de derivados de petróleo. Mais um exemplo do estelionato eleitoral que leva os brasileiros, como Geisa, à morte.
“A botija de gás custando quase 10% do salário mínimo, não deveria ser assim. É um item básico e determinante para as famílias de baixa renda, principalmente”, afirmou o economista Marcelo Loyola Fraga. Para o economista, a inflação alta vai disparar ainda mais se o governo federal não fizer nada. “É um aumento atrás do outro de itens básicos, como carne, frango, gás de cozinha, energia. O governo precisa de uma política econômica definida”.
Enquanto Bolsonaro promover esse aumento desenfreado de preços e sem justificativa, pois a regulação poderia ser outra, muitas famílias continuarão a substituir o gás por fogão à lenha, carvão ou álcool, e com isso, o aumento de acidentes domésticos, como o que ceifou a vida de Geisa, é certo.