Regulamentar a inteligência artificial no Brasil: o que isso muda na educação?

Avanço da IA exige não apenas inovação, mas também cuidado e planejamento para garantir que ela seja uma aliada no processo educacional

24/09/2025 07:16

A inteligência artificial (IA) já está integrada ao cotidiano dos brasileiros — presente nos aplicativos de celular, nas redes sociais e, cada vez mais, nas salas de aula. Diante dessa transformação acelerada, o país começa a debater a criação de leis que assegurem o uso ético e responsável da tecnologia, especialmente no campo da educação.

especialistas defendem regulamentação urgente para garantir inclusão, ética e proteção de direitos nas salas de aula
especialistas defendem regulamentação urgente para garantir inclusão, ética e proteção de direitos nas salas de aula - da-kuk/iStock

Enquanto o Congresso analisa propostas para regulamentar o uso da IA, especialistas reforçam a urgência de discutir seus impactos sobre o ensino, a inclusão digital e os direitos de alunos e professores. O avanço da tecnologia exige não apenas inovação, mas também cuidado e planejamento para garantir que ela seja uma aliada no processo educacional.

As premissas da IA na educação

Um dos maiores objetivos da inteligência artificial aplicada ao ensino é a personalização do processo de estudo/aprendizagem. Em vez de um modelo único para todos, a IA permite adaptar o conteúdo ao ritmo, aos interesses e às dificuldades de cada aluno. Isso pode fazer uma enorme diferença, principalmente para estudantes que enfrentam barreiras socioeconômicas no aprendizado tradicional.

Segundo Ainhoa Marcos, vice-presidente da Odilo, empresa que desenvolve soluções educacionais com uso de tecnologia, mais do que bem-vinda, essa transformação é urgente. “A inteligência artificial está acelerando uma transformação necessária na educação: passar de modelos padronizados e rígidos para experiências verdadeiramente personalizadas”.

Essa personalização também ajuda a enfrentar um problema grave no Brasil: a desigualdade de acesso à educação. Com ferramentas baseadas em IA, é possível levar ensino de qualidade até comunidades afastadas, escolas com poucos recursos e regiões onde faltam professores, explica.

Além disso, a IA pode ajudar professores a economizar tempo com tarefas repetitivas, como corrigir provas ou montar planos de aula, permitindo que se concentrem no que mais importa: acompanhar os alunos, incentivar o pensamento crítico e cuidar do lado humano do ensino.

Desafios

Segundo a professora de Direito Administrativo na Universidade Presbiteriana Mackenzie, Ana Nery, um dos maiores desafios é o descompasso entre a velocidade das inovações tecnológicas e o tempo que o Direito leva para criar normas eficazes. “O Direito se move mais lentamente que a tecnologia, e isso cria um descompasso evidente”, afirma.

De acordo com a profissional, é fundamental construir modelos regulatórios flexíveis, que envolvam não apenas juristas, mas também especialistas em tecnologia, educadores, organizações da sociedade civil e representantes de grupos minorizados. O objetivo deve ser garantir que o uso da IA respeite os princípios democráticos e os direitos fundamentais, com foco na proteção de direitos e na inclusão, fortalecendo a educação pública e inclusiva.

Por que regulamentar é tão importante?

Regular a IA não é apenas uma questão técnica, como também é uma decisão política e social. É preciso criar regras que protejam os dados dos alunos, garantam o uso ético da tecnologia e evitem exclusões. As normas precisam envolver a comunidade educacional, os especialistas em tecnologia, o poder público e a sociedade civil.

A professora Ana Nery defende modelos de regulação mais flexíveis e participativos, que ajudem a criar um ambiente digital saudável: sem censura, mas que estabeleçam bases e horizontes éticos e pedagógicos nos quais as plataformas devem se orientar para sua atuação.

Ela explica que um bom caminho seria exigir transparência algorítmica (ou seja, saber como as decisões automatizadas estão sendo feitas) e criar canais de denúncia acessíveis, para que abusos possam ser combatidos de forma rápida.

Caminhos possíveis

Enquanto as leis ainda estão sendo debatidas no Congresso, a tecnologia continua avançando. E isso não é, necessariamente, um problema, desde que haja responsabilidade na hora de implantar essas ferramentas nas escolas.

Para Ainhoa Marcos, o futuro da IA na educação é promissor, mas ela precisa ser utilizada como aliada, e não como substituta do professor. “O professor continuará sendo insubstituível na inspiração e no acompanhamento humano, enquanto a tecnologia traz escalabilidade e personalização”, afirma.

De acordo com Marcos, o que está em jogo não é apenas o futuro da tecnologia, mas o da própria educação e de quem vai ter acesso a ela. “Se bem regulada, a inteligência artificial pode ajudar a construir um sistema de ensino mais justo, inclusivo e eficiente. Mas, se usada sem critérios, corre o risco de ampliar ainda mais as desigualdades que já existem”, pondera.