3 técnicas que ajudam a aprender qualquer coisa: de inglês a matemática
“Nós não fazemos o suficiente para entender o que não sabemos”, escreve Boser
Conversamos com Ulrich Boser, fellow sênior do Center for American Progress — organização de pesquisa e defesa de políticas públicas baseadas em ideias liberais sobre questões econômicas e sociais — e autor do livro “Learn Better: Mastering the Skills for Success in Life, Business and School“, para aprender truques sobre como aprender qualquer coisa.
“A habilidade de aprender de forma efetiva pode ser a mais importante da vida”, diz Boser. Os argumentos em favor de um aprendizado contínuo nunca estiveram tão fortes, seja para tentar continuar na indústria em meio à era da automação ou simplesmente para fortalecer a capacidade de refletir profundamente diante de uma avalanche de notícias a todo momento. “É como a anti-criptonita. Ela concede os poderes mágicos para ser bem sucedido em qualquer campo.”
Para aqueles que desejam aprender qualquer coisa, ao longo de suas pesquisas Boser identificou três estratégias importantes aplicáveis para todo mundo e nos deu algumas dicas. Essas estratégias podem ser divididas em 3 tipos: encontrar significado, desenvolver metacognição e aceitar o poder do esquecimento. Saiba um pouco mais sobre cada uma delas a seguir.
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Encontrar significado
Pesquisas apontam que motivação é a chave-mestre para aprender qualquer coisa. Assim, para conseguir dominar uma ideia, nós temos que torná-la importante.
“É impossível aprender se não quisermos fazer isso, para ganharmos expertise temos de ver essas habilidades e conhecimentos novos como valiosos”, afirma Boser. “Nós temos que criar significado. Aprender é encontrar sentido em algo”. Algumas pessoas pensam que nossos cérebros funcionam como computadores: nós lemos algo, nossos cérebros guardam a informação e nós a acessamos quando precisamos dela.
Mas não é assim, explica Boser. Um experimento interessante de 2002 constatou que estudantes conseguiam usar bem as fórmulas de matemática para resolver uma série de 1500 problemas de Física, mas, ainda assim, não entendiam o conceito por trás das questões que respondiam. “As pessoas podem fazer a mesma coisa milhares de vezes – literalmente – sem de fato aprendê-la”.
Nós temos que nos engajar de maneira ativa com a informação nova para que ela se fixe. Uma dica é parar para pensar “por que funciona desse jeito?”. Ações como até mesmo errar uma resposta pode ajudar a “cimentar” esse material no cérebro porque explicam o motivo para algo ser do jeito que é.
Quando estudamos algo, ainda que sublinhar ou grifar um livro possa passar a sensação de que fixamos aquilo, é mais eficaz ler um excerto e parar por dois minutos para fazer anotações sobre essa leitura breve.
Uma pesquisa de 2014 mostrou que estudantes que liam um trecho e tinham de, logo depois, relembrar o que haviam lido, seja escrevendo um parágrafo ou criando um mapa conceitual ou mapa mental, absorviam melhor a informação do que os alunos que só estudavam o texto sem apelar para técnicas ativas. No experimento foi possível entender que escrever sobre esse novo material fez com que os estudantes atribuíssem sentido a ele.
Uma boa estratégia para aprender qualquer coisa
É simples: cometa erros. Boser conta que uma vez perguntaram a ele qual era a capital da Austrália. Ele respondeu de forma confiante que era Sydney, e depois arriscou Melbourne, e aí Perth e uma lista das cidades australianas de que se lembrava (Sendo que a resposta era Canberra).
Para Boser, essa foi uma boa maneira de aprender a capital da Austrália. Ao se confundir com as respostas inicialmente, ele se tornou capaz de lembrar melhor a opção correta posteriormente. Esse é o chamado “efeito da hiper-correção”, que acontece quando temos a certeza de que sabemos algo mas, depois, percebemos que estávamos errados.
Quando somos confrontados com o nosso próprio deslize, diz Boser, “nós paramos e pensamos ‘por que eu pensava desse jeito?’ e, então, o material passa a ter mais significado”.
Na próxima vez que você encarar uma discussão complexa, veja se consegue imediatamente separar os argumentos em sua essência – por meio da escrita, ou mesmo tirando um momento para identificar as principais conclusões. Pode parecer uma técnica que consome muito tempo, mas provavelmente exigirá um período de dedicação menor do que ler alguma coisa, esquecê-la e depois precisar fazer tudo de novo para recobrar essa lembrança.
Metacognição para aprender qualquer coisa
Humanos são animais confiantes demais. Nós achamos que somos mais espertos e mais bonitos do que realmente somos, e que trabalhamos mais do que aqueles à nossa volta. E isso é, com certeza, matematicamente impossível. “Nós não fazemos o suficiente para entender o que não sabemos”, escreve Boser.
Isso acontece, em partes, porque não passamos muito tempo pensando no que fazemos e no que não sabemos. Só que, no fim das contas, exercitar a reflexão é uma forma bastante efetiva de melhorar nosso aprendizado.
A chamada “metacognição” tem dois aspectos principais, define Boser: o planejamento (“Quais são meus objetivos e como vou aprender sobre isso?”) e o monitoramento (“Há outra forma de aprender isso? Como posso medir meus avanços? Por que estou fazendo isso?”).
O pesquisador holandês Marcel Veenman descobriu que crianças com habilidades metacognitivas superavam as crianças que tinham QI alto nos testes de matemática. Em uma conversa com Boser, Veenman contou que em sua pesquisa a metacognição era responsável por 40% dos resultados do processo de aprendizagem, comparada aos 25% que ficavam a cargo do QI. Ficou claro que criar um processo para se planejar, monitorar e avaliar o processo de aprendizado gera um entendimento maior.
Um estudo mostrou que estudantes que recebiam treinamento sobre problem solving e como se planejar, monitorar e avaliar seu próprio aprendizado – se saíram melhor nos exames. Eles também aproveitaram oportunidades de aprender de forma mais independente no restante do semestre e se sentiram mais motivados do que os colegas que não receberam esse treinamento todo.
De acordo com o Educational Endowment Foundation do Reino Unido, que realiza estudos para diminuir o deficit de memorização, a metacognição está entre as duas técnicas mais eficazes para melhorar o aprendizado que já foram testadas pelo órgão.
O famoso Feedback é outra forma popular. Os alunos envolvidos em programas desenhados para melhorar a maneira como eles refletiam sobre o próprio jeito de pensar aceleraram o processo de aprendizagem em uma média de oito meses, em termos de progresso acadêmico. Os efeitos de melhora mais significativos ao longo do processo foram identificados em estudantes com pior desempenho inicial e nos mais velhos.
No mesmo sentido, um pesquisador de Stanford desenvolveu uma técnica de 15 minutos baseada em metacognição que elevou as notas de alunos de “B” para “A” (a nota máxima). Se você quer apostar em metacognição, esse talvez seja um bom lugar para começar.
O poder do esquecimento
As pessoas, em geral, esquecem 50% do que aprendem depois de um período de 24 horas. De acordo com Boser, não há nada de errado nisso. “Em resumo, as pesquisas demonstram que o esquecimento ajuda no aprendizado e que, quanto mais nos aproveitamos disso, mais aprendemos”. Isso acontece porque quando nos esquecemos temos a chance de relembrar algo. E relembrar permite que retenhamos a informação por mais tempo.
Uma prática-chave que se beneficia da nossa tendência ao esquecimento é chamada “interleaving”, que se baseia em aulas com problemas distintos operando em conjunto. Quando as aulas misturam diferentes tipos de problema, as crianças costumam aprender mais do que quando veem um tipo de cada vez.
Em termos matemáticos: os jovens geralmente têm de entender, por exemplo, uma série de enunciados que trabalham um tipo de problema específico para, em seguida, analisar outros conceitos. Com esse mecanismo, eles não precisam pensar sobre qual espécie de problema estão resolvendo e relembrar a formula de resolução. Em uma prova que mescla problemas variados, sem uma ordem determinada, os jovens passam a ser forçados a recordar as diversas formas de resolução e escolher a ideal, esquecendo e depois relembrando o conteúdo – como consequência, o absorvendo melhor.
Outro estudo conduzido por Douglas Rohrer, professor de psicologia da Universidade do Sul da Flórida, nos Estados Unidos, mostrou que as crianças que estudavam problemas desordenados se saíam melhor do que aquelas que seguiam o caminho oposto.
Pesquisadora do mesmo campo, Annie Murphy Paul afirmou em uma publicação da Scientific American, uma descrição dos resultados obtidos na Universidade do Sul da Flórida:
Depois de três meses, todos os estudantes encararam uma revisão geral, e no dia seguinte fizeram uma prova. Aqueles que tinham adotado práticas de interleaving acertaram 80% do teste, comparados com 64% de rendimento da outra parcela dos alunos, que realizava as tarefas divididas “em blocos” – uma diferença não tão significativa. Mas a vantagem do interleaving ficou mais evidente quando os estudantes foram testados um mês depois da revisão. Nesse exame, os que adotaram a prática acertaram 74%, enquanto os que realizavam as tarefas em blocos chegaram a míseros 42%.
Voltando a Boser, o pesquisador conta que “nós costumamos fazer a mesma coisa várias e várias vezes ” na hora de estudar. Entretanto, “quando se mistura tudo, o aprendizado é mais produtivo”. Ele diz que os alunos que usam uma pilha de flashcards, que divide os conceitos em fichas, por exemplo, melhoram o desempenho em 30%.
A conclusão sobre como aprender qualquer coisa
Há muitos mal-entendidos sobre processos de aprendizagem. Mas muitas pesquisas apontam que, para aprender qualquer coisa, é necessário trabalho duro. Nós podemos ser bons aprendizes por natureza se, como Boser, dedicarmos tempo a isso, elaborarmos um processo que funcione e entendermos como monitorar nosso progresso.
Este texto foi originalmente publicado pelo site Quartz, em inglês, e adaptado pelo Estudar Fora.