Ensaio fotográfico registra faces de adolescentes trans nos EUA
A norte-americana Katherine, de 19 anos, é muita coisa: gamer, muçulmana e uma futura programadora. Mas uma coisa ela nunca foi: humana. Pelo menos é o que os seus pais costumam dizer.
No pequeno apartamento que ela divide com a sua família, Katherine é um fantasma. Ela passa todos os seus dias em um cômodo próximo à entrada da sua casa, o único lugar em que ela não encontra sua mãe, que passa o dia na cozinha, seu pai, que prefere a sala de estar e suas irmãs, que permanecem em seus quartos.
Katherine não tem um quarto. Ela dorme em uma pequena cama extra no quarto de visitas. Quando a família recebe um hóspede, ela procura um canto da casa para se acomodar e passar a noite.
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Essa tem sido a vida da jovem desde que assumiu ser transexual. Após 18 anos reprimindo a sua verdadeira identidade, ela finalmente resolveu revelar-se para seus pais.
Depois que os pais desaprovaram a verdade identidade da adolescente, Katherine foi diagnosticada com um quadro depressivo. Constantemente pensa em suicídio. E ela não está sozinha. Um estudo feito pela ‘Youth Suicide Program’ descobriu que mais de 50% dos adolescentes trans já tentaram se matar com 20 anos de idade.
O número de transexuais que afirmam que foram expulsos de casa após revelarem suas identidades também é alarmante. Estima-se que dos 1.6 milhões de indivíduos em situação de rua dos Estados Unidos, 40% são transexuais. As informações são de um estudo realizado pela ‘Trans Equality’.
No começo do mês de julho, Katherine encontrou 10 outros adolescentes transexuais. O site norte-americano Mashable realizou um ensaio fotográfico com esses jovens. Assim como Katherine, os adolescentes estão passando por uma fase de transição. A moda e a aparência são ‘ferramentas’ essenciais para eles terem voz.
A série de fotografia mostra como esses jovens estão redefinindo o que é ser trans nos Estados Unidos. Em cada foto, eles se apresentam com suas verdadeiras identidades para o mundo pela primeira vez.
O Estilo Catraca Livre traduziu seis histórias. Você pode ler todas aqui, em inglês.
Katherine, 19 anos
“O ensino médio foi um dos piores períodos da minha depressão. Por conta disso, minhas memórias são totalmente bloqueadas.
Quando eu finalmente assumi minha identidade, tive medo de perder tudo. No entanto, eu não podia mais me reprimir.
Hoje, eu sou o verdadeiro ostracismo social. Eu não tenho voz.
Eu costumava me imaginar como uma mulher, com longos cabelos. Mas, por causa da depressão, eu não posso ver essa menina. Eu não posso senti-la, não posso sê-la”.
Charlie, 12 anos
“O tanto que eu lembro da minha vida, sempre fui feminina. Eu costumava me vestir como princesa e correr por ai com um pequeno salto que se comprava por apenas um dólar. Em um primeiro momento eu pensava: ‘Por que tenho que me identificar com um menino? Por que tenho que ser um menino se eu quero ser uma menina?’ Era muito confuso.
Na terceira série o meu pai raspou minha cabeça. Foi um período muito difícil. Ele não aceitava. Ele costumava mentir para mim, dizia que era ilegal ser transexual e que Deus não aprovava.
Os meus pais se divorciaram quando eu tinha quatro anos de idade. Na quarta série comecei a minha transição. Meu cabelo começou a crescer e eu prendia a franja com um penteado. Eu também furei as minhas orelhas. Meu pai ainda não me aceita.”
AJ, 19 anos
“As pessoas me chamam de ‘transtendência’. É quando um indivíduo finge ser trans para ser popular. É por causa disso que hoje em dia eu estou tomando hormônios, mas existem muitos transexuais que não querem passar por esse processo.
Eu gosto de ser como eu sou. É mais correto que as pessoas mudem suas percepções sobre mim, do que eu mudar quem sou para me encaixar nas percepções delas. Eu uso vestido algumas vezes, ,as isso não me faz ser ‘menos homem’. Eu definitivamente tenho um lado feminino. Eu aprecio me maquiar e ser um homem”.
Morgan, 19 anos
“Eu fui diagnosticado com depressão e ansiedade quando tinha 13 ou 14 anos. Eu sinto depressão e ansiedade pela forma com as pessoas me tratam.
Todo mundo me destrata. Eles me encaram enquanto caminho pela cidade. Um dia eu estava esperando em uma fila para poder entrar em uma piscina pública e vi um casal argumentando se eu era menino ou menina.
Eu comecei o meu tratamento com testosterona e me sinto motivado. A maior mudança é a minha voz. Os pelos faciais também estão crescendo. Recentemente, eu raspei as laterais do meu cabelo. Acredito que vai combinar com o meu bigode quando crescer”.
Chance, 18 anos
“Quando minha mãe estava grávida, os médicos disseram que ela teria um filho. Então ela começou a pensar em nomes para meninos. Quando nasci designada mulher, ela não havia pensando em um nome para mim. Ela escolheu Chance.
Ambos os meus pais são imigrantes de chineses. Eles são muito restritos e tradicionais. Quando eu contei para a minha mãe que a minha transexualidade não era uma fase, ela começou a chorar. Meu pai também não aceita muito bem a história. Mas recentemente ele começou a me tratar pelo pronome masculino”.
Quinn, 19 anos
“Eu sabia que alguma coisa não estava certa quando eu tinha três ou quatro anos de idade. Eu perguntei para a minha mãe como alguém sabia que era gay. No outro dia, eu pensei: ‘Não é isso’. Aos sete anos os médicos me diagnosticaram com transtorno de identidade de gênero. Aos 13 anos comecei a transição.
No começo, meu pai e minha madrasta não entenderam ou aceitaram o meu processo de transição. Depois, minha madrasta convenceu o meu pai a me ajudar com todos os hormônios que precisava.
Então, aos 17 anos comecei o tratamento. Foi chocante, porque comecei a ver os resultados com menos de uma semana” .