A ocupação das escolas em SP contada pelos próprios estudantes
Campanha #ocupaestudantes convida alunos a contarem suas experiências no levante contra a reorganização escolar
Há pouco mais de um mês, o Brasil acompanhou a mobilização dos estudantes paulistas, que saíram às ruas e ocuparam escolas em protesto contra o programa de reorganização escolar apresentado por Geraldo Alckmin.
Para retratar de perto o dia a dia dos milhares alunos que deram sua contribuição, colunistas de diversos meios de comunicação abrem espaço para que eles, usando suas próprias palavras, relatem a experiência que estão vivendo.
E chegou a nossa vez de abrir o espaço.
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Confira o texto assinado pela aluna Thaís Marques, aluna da Escola Estadual Castro Alves:
A ESCOLA É NOSSA, NINGUÉM TEM O DIREITO DE FECHAR
Por Thaís Marques, 17 anos, da Vila Albertina (SP)
Jovem repórter Énois
Na escola onde eu estudo, ficamos sabendo há meses que a reorganização do ensino estadual de São Paulo fecharia nosso ensino médio. No início, houve um abalo muito grande de alguns alunos e professores, mas não passou de algumas semanas. Entre manifestações e ocupações, a E.E Amenaide Braga de Queiroz, na região norte de São Paulo, deixou tudo passar em branco.
Só que eu, que sou aluna do 3º ano do ensino médio, não queria deixar isso passar em branco e tive que me aliar a outras escolas para entrar na luta. Buscando um colégio pra ocupar, acabei me encontrando a Thamara Oliveira, que é estudante da E.E Castro Alves, outra da zona norte de São Paulo. Ela me procurou pelo Facebook pedindo ajuda na divulgação da campanha de arrecadação de água para os alunos que tinham acabado de ocupar a escola. Conversa vai, conversa vem, fui convidada para conhecer e ocupar junto.
Me aliei a uma escola
No dia 21 de novembro, um sábado, fui com João Rocco, um amigo, para a E.E Castro Alves. A entrada estava repleta de faixas contra o fechamento da escola e, depois de alguns minutos esperando no portão, fomos recebidos por um dos organizadores da ocupação, o Mario Augusto, de 18 anos. Ele nos contou como foram os primeiros dias ali e nos guiou por um pequeno tour: mostrou o pátio, a cozinha, algumas salas de aula e a que estava sendo usada como dormitório.
Já fazia quase dez dias que os alunos do ensino médio e fundamental II tinham começado a ocupar a escola, no dia 12 de novembro. Durante os primeiros, os portões ficaram abertos para as aulas dos pequenos do fundamental I. Foi assim até que a vice-diretora entrou na escola e humilhou os alunos: disse que eram inúteis e não conseguiriam mudar nada. Aí resolveram fechar a escola de vez.
Os alunos recebem ajuda, colchões e cobertores da Apeoesp, o sindicato dos professores do estado de São Paulo. A comida fica por conta de doações feitas pela comunidade. “Teve um dia que um senhor passou aqui e perguntou o que estávamos comendo, falei que tinha salgadinho e bolacha. Um tempo depois ele voltou junto com a família e duas panelonas de macarrão, uma com molho e carne e outra sem carne. Foi maravilhoso ver essa colaboração das pessoas com os meninos”, disse Nilceia Fleuri, 62, diretora executiva da Apeoesp.
Os ocupantes
Nilceia está dormindo todos os dias na escola com os alunos e professores. Ela também acompanhou os alunos na audiência de conciliação com o governo do estado, no dia 19 de novembro, e disse que lá também não houve diálogo sobre as escolas que iriam fechar.
Conversei bastante com ela pra saber que as escolas fechadas vão virar Etec, escolas técnicas, ou serão usadas pela prefeitura. Muitos alunos da ocupação, no entanto, disseram que o terreno da escola pode ser privatizado. “Aqui é um bairro bom e o terreno é enorme, dá pra fazer um condomínio bem grande aqui”, disse um deles.
Izabella Cristina, de 14 anos, estava na ocupação desde o dia 18 de novembro e diz que entrou no movimento porque estuda ali há oito anos e é onde estão todos os seus amigos. “Se eu mudar de escola, não sei o que vou fazer”, diz a menina, muito tímida.
Bruno Mendes, de 16 anos, vai para a ocupação todos os dias depois do trabalho porque está preocupado em ser transferido para um colégio distante, e é a primeira vez que vê os alunos da escola unidos para uma grande causa. “Estudo há bastante tempo aqui, é perto de casa e a outra escola fica bem longe.”
Fazendo a escola
Durante a ocupação, os alunos estão tendo oficinas e aulões. Os professores abrem rodas de conversa pra debater as matérias e tentar passar conteúdo das aulas. No fim de semana, a escola fica aberta para a comunidade e eles mesmos dão oficinas.
Durante a minha visita, os alunos estavam ensinando algumas crianças da comunidade a fazerem cartazes. Além dos individuais, também fizeram um super cartaz de metro, que no final do dia foi pro muro da escola.
O clima ali é bem pacífico. Nos primeiros dias houve confronto – e foi com a polícia. No decorrer da semana, tudo foi se tranquilizando. Apesar das aulas interrompidas, a escola está aberto para todos: os meninos jogam bola na quadra e as meninas espalham cartazes pela escola, que por sinal, está em um ótimo estado.
Eles se revezam nas tarefas, limpam o pátio e até os banheiros. Os alunos estão com o pé firme no chão e não vão desistir da sua luta tão cedo, eles abraçaram o lema #nãofecheaminhaescola e irão levar isso até o fim.
A Énois é uma agência escola de jornalismo, que forma e experimenta com a galera de 14 a 21 anos, preferencialmente das periferias de São Paulo.
São Paulo, 02 de dezembro de 2015.
Reorganização
Segundo a Secretaria Estadual de Educação, o processo de reorganização tinha como objetivo criar 754 escolas de segmento único, ou seja, que atendam exclusivamente uma faixa etária de ensino. O objetivo visava a facilitação da gestão das escolas, diminuindo o conflito entre os estudantes.