Era só alguém com fome, diz testemunha de morte de carroceiro
PM ordenou que o rapaz soltasse o pedaço de madeira que segurava e, depois da resistência do carroceiro, o policial efetuou dois disparos
Nesta quarta-feira, 12, o carroceiro Ricardo Silva Nascimento, 39, foi morto por um policial militar na rua Mourato Coelho, em Pinheiros, zona oeste de São Paulo. Segundo uma testemunha ouvida pelo Catraca Livre que não quis se identificar, por volta das 18h se iniciou uma discussão entre o carroceiro e o PM porque Nascimento estaria com fome e foi a uma pizzaria pedir comida.
A pizzaria teria chamado a polícia e, logo em seguida, dois PMs chegaram. A testemunha conta que da janela de seu apartamento, na rua Navarro de Andrade, dava para ver que o carroceiro estava alterado, mas não representava nenhum perigo ao policial.
“Minha irmã se aproximou da janela e disse que o policial apontava a arma para o rapaz, que segurava um pedaço de madeira na mão e gritava”, conta. O PM pediu para que o carroceiro soltasse o pedaço de madeira, mas o rapaz gritava e não soltava. “E foi assim que o policial deu dois tiros à queima-roupa no rapaz, que caiu morto no chão. Dois tiros versus um pedaço de madeira”, relatou.
Em seguida, segundo o relato da testemunha, ao menos oito viaturas, cinco motos e um helicóptero apareceram no local lançando luzes sobre o corpo estendido no chão. “As pessoas nos prédios começaram a chamar o policial de assassino e aí ele apontou a arma para cima. As pessoas gritaram, e eu estou paranoica, ainda nem saí de casa”, disse.
A cena do crime foi isolada. “Vi um policial tirando foto do pedaço de madeira, que estava a alguns metros do corpo do rapaz, mas não vi a perícia sendo feita. Na verdade, nem deu tempo. Cerca de 15 minutos depois dos disparos, os policiais colocaram o corpo do carroceiro dentro de uma viatura e o levaram embora”.
A testemunha já tinha visto o carroceiro pela região algumas vezes e conta que ele costumava cumprimentá-la na rua. “Eu ainda não estou acreditando no que aconteceu. Era só uma pessoa alterada que estava com fome.”
Segundo um amigo da vítima ouvido pelo “Bom Dia São Paulo”, o rapaz tinha transtorno mental, mas não era uma pessoa agressiva e trabalhava nas ruas como carroceiro havia mais de 10 anos. Os disparos foram feitos em frente a uma unidade do supermercado Pão de Açúcar.
Outro lado
Em nota, a Secretaria de Segurança Pública (SSP) informou que “tanto os dois policiais que se envolveram na ocorrência quanto a guarnição de Força Tática que prestou apoio foram recolhidos ao serviço administrativo, sendo afastados do trabalho nas ruas”.
A SSP disse ainda que o 23º Batalhão de Polícia Militar Metropolitano (BPM/M) instaurou inquérito policial militar para investigar todas as circunstâncias do fato, acompanhado pela Corregedoria. O Departamento Estadual de Homicídios e de Proteção à Pessoa (DHPP) também instaurou inquérito, ouviu testemunhas e encaminhou a arma do PM envolvido na ocorrência para perícia. A polícia também disse que vai analisar imagens de câmeras da segurança da região.
“O corpo de Ricardo Silva Nascimento, de 39 anos, foi necropsiado no Instituto Médico Legal (IML) central e liberado”, finaliza a nota.
Ato
O Pimp My Carroça, movimento que luta para dar visibilidade aos catadores de materiais recicláveis, organiza um ato na esquina da rua Mourato Coelho com a Navarro de Andrade. “Vamos, hoje, pedir por justiça: levem flores, velas, cartazes e o que melhor representar sua indignação com esse crime absurdo”, diz o movimento. A concentração está marcada para as 17h e o ato, para as 18h.
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