Mulher que chefiou tráfico na Rocinha lança livro e grava filme

Daria um filme: aos seis anos de idade, Raquel de Oliveira experimentou a primeira droga – cola de sapateiro – para inibir a fome. Aos nove, foi vendida pela avó a um chefe do jogo do bicho. Aos 11, ganhou de presente o primeiro revólver. Anos mais tarde, chefiou o tráfico na favela da Rocinha, após a morte do companheiro, o traficante Naldo, assassinado na década de 1980. Após a morte dele, ela assumiu o controle do tráfico. Ainda este ano, a história contada pela autora no livro “A Número Um” vai parar nas telonas, roteirizada pela cineasta Ana Luiza Beraba, da Esfera Filmes.

Raquel de Oliveira lança o romance “A Número Um” onde conta a própria história

De acordo com ela, escrever foi a fuga para a vida no crime. Após iniciar um tratamento para o vício em drogas, descobriu a poesia e em seguida, conseguiu completar os estudos. Raquel possui um livro de poesia e agora, com o romance biográfico, circula entre lançamentos, festivais e palestras. No próximo dia 03 de maio ela estará na roda de conversa “Os desafios de fazer uma festa literária na favela”, no Festival Literário de Poços de Caldas, o Flipoços, ao lado de Julio Ludemir e Ecio Salles, os criadores da Festa Literária das Periferias (Flupp). “O livro é a minha história  e contá-la foi a forma de encontrar prazer, substituir o vício em drogas, me anestesiar de algum modo“, disse.

Já o filme está sendo roteirizado e as gravações devem começar em breve. O objetivo é que ele seja fiel ao livro escrito por Raquel, que destaca que o formato da obra literária surgiu após ela voltar a estudar com 44 anos e com conversas com a terapeuta, que a incentivou colocar no papel o que viveu, o que sentia. Após conhecer a Flupp, percebeu que a escrita tinha se tornado uma profissão. “Entendi que o que eu fazia mexia com os leitores, com as pessoas e passei a me dedicar a isso. O prazer da escrita substitui o da cocaína. Com a literatura, consigo fugir da dor, me anestesiar”, contou.

Agora, ela prepara-se para publicar mais um romance e dois outros livros de poesia, além de integrar o grupo de ‘Fluppenseiros’, que são frequentadores da Flupp e dos encontros com autores que ocorrem ao longo do ano em diferentes espaços do Rio de Janeiro. Aos 56 anos, ela ainda vive na Rocinha junto com três filhos e um netinho, sonha em  ser professora e prepara o mestrado.

Lançamento em intercâmbio entre Flupp e Flipoços
A ideia da mesa é trazer para o debate “Os desafios de fazer uma festa literária na Favela“, com a participação dos criadores da Flupp, Ecio Salles e Julio Ludemir. A Flupp acontece desde 2012 e já passou por quatro diferentes comunidades cariocas e reuniu milhares de pessoas no público e diferentes atrações internacionais. Em 2016, recebeu o prêmio Excellence Awards, conferido pela London Book Fair.

“A Flupp surgiu para ser um espaço de formação de novos leitores e autores na periferia das grandes cidades brasileiras. No processo de formação já publicamos 10 livros e revelamos mais de 100 autores das periferias”, comentou Ecio Salles.

Julio Ludemir e Ecio Salles, os criadores da Flupp no Rio de Janeiro

Ao lado dele, Julio Ludemir toca o evento, que realiza atualmente o Rio Poetry Slam, a primeira competição de palavra falada da América Latina, que reúne 16 países simultaneamente para competir na favela.  Júlio Ludemir nasceu no Rio de Janeiro, mas foi criado em Olinda, Pernambuco. Nunca concluiu a faculdade de jornalismo, profissão que começou a exercer na época em que o diploma não era indispensável. Tem nove livros publicados. Uma crise de emprego aos 50 anos o levou a tornar-se produtor cultural, criando a Flupp.

O bate-papo tem entrada gratuita e participação livre. Para Gisele Corrêa Ferreira, coordenadora da GSC Eventos, empresa que organiza o Flipoços, a mesa reforça a diversidade do encontro e o intercâmbio de informações. “O Flipoços tende a ser um festival plural. Admiramos muito a Flupp e o fato dela acontecer e mobilizar tanta gente numa favela. Queremos aprender também com eles, daí o convite para o Ecio e o Julio façam parte da mesa, ao lado da Raquel de Oliveira, que é fantástica, publicou através da Flupp, mas tem uma obra riquíssima a partir da própria história de vida”, destacou.

Programação
A programação do Flipoços 2017, com o lançamento da Raquel de Oliveira, pode ser conferida no site do festival www.flipocos.com