‘Não sairei das ruas’, afirma a vereadora feminista Sâmia Bomfim

A militante Sâmia Bomfim, do PSOL, foi eleita vereadora de São Paulo com 12.464 votos

19/10/2016 12:22 / Atualizado em 12/07/2018 11:28

Levar as reivindicações das ruas para os espaços de poder e mudar a política executada pelos partidos tradicionais no Brasil. Foi com esse propósito que a ativista Sâmia Bomfim (PSOL), de 27 anos, se candidatou à vereadora de São Paulo nos próximos quatro anos. A militante feminista foi a última candidata eleita para a Câmara Municipal de São Paulo, com 12.464 votos no total.

A ativista está entre as 11 mulheres que vão ocupar a Câmara. Houve um crescimento de 120% no número de vereadoras eleitas neste ano, antes eram apenas 5 representantes. Para ela, o aumento da representatividade feminina na política também é resultado do movimento feminista, que vem se fortalecendo cada vez mais.

Sâmia Bomfim decidiu entrar na política para militar dentro dos espaços de poder tradicionais
Sâmia Bomfim decidiu entrar na política para militar dentro dos espaços de poder tradicionais

Bomfim começou seu envolvimento com a política ainda na faculdade, quando estudava Letras na Universidade de São Paulo (USP). Na época, atuou no movimento estudantil e foi diretora do Centro Acadêmico e do DCE Livre da USP.

Em 2011, a futura vereadora se filiou ao PSOL e, desde então, tem se envolvido cada vez mais nas mobilizações de rua, como nos atos contra o aumento da tarifa, no movimento feminista, grupos que lutam por moradia e educação popular.

Em entrevista ao Catraca Livre, Sâmia Bomfim falou sobre suas propostas para a capital paulista e a importância do aumento de mulheres na Câmara Municipal. Confira abaixo:

1) O que te motivou a se candidatar a vereadora de São Paulo?

Diante da crise de representatividade e da falência do modelo político atual, seria necessário lançar candidaturas que expressassem outro ponto e vista sobre o que é política. Minha experiência é nas ruas, mobilizações, ocupações, todas elas organizadas de maneira independente, criativa, radical, ampla, completamente diferente da política executada pelos partidos tradicionais no Brasil, por isso a proposta de uma candidatura com esse perfil.

Além disso, sou mulher, feminista me envolvi em alguns embates com setores conservadores da política e da do sociedade. Minha candidatura poderia sintetizar todos os perfis: mobilizações de rua, feminismo, enfrentamento ao conservadorismo, sem ser um plano ou uma ação individual, mas sim um processo de construção coletiva.

2) Qual a importância do aumento do número de cadeiras ocupadas por mulheres na Câmara? 

Muito importante mais mulheres na Câmara, pois isso desnaturaliza a ideia de que nosso lugar não é na política e pode estimular mais mulheres a ocuparem as disputas políticas, bem como a forçar os partidos a valorizarem mais a formação de quadros mulheres.

Acredito que a ampliação de 9% para 20% é reflexo do fortalecimento da luta feminista do último período, mas ainda temos muito o que avançar. Poucas mulheres eleitas se mostram preocupadas e sintonizadas com o movimento de mulheres e com as pautas que defendemos. Não basta ser mulher, é preciso estar do lado certo. Nossa batalha agora deve ser para que mais mulheres feministas possam ocupar postos de poder e garantir políticas públicas feministas.

3) Quais as suas principais propostas agora eleita vereadora da Câmara Municipal? Poderia comentá-las com foco nas áreas de educação, violência contra a mulher e mercado de trabalho?

As principais pautas que defendi durante as eleições são relacionadas aos direitos das mulheres, direito à cidade e participação popular.

Na área de educação, a importância de garantir que projetos reacionários como o Escola sem Partido ou a Reforma do Ensino Médio proposta pelo governo Temer não sejam aprovadas no município. É preciso lutar por mais democracia nas escolas, professores bem remunerados, formados sob a perspectiva de gênero e de combate às opressões e mais vagas nas creches (atualmente cerca de 100 mil crianças estão fora das creches).

O tema do combate à violência contra a mulher deve ser prioridade: precisamos batalhar por um fundo municipal de combate à violência, por campanhas nas vias e equipamentos públicos de combate à violência, Casas abrigo e Centros de referência para as mulheres vítimas de violência, melhor iluminação e transporte público 24h para melhorar a sensação de segurança no período noturno, dentre outras propostas.

Na área de geração de emprego e renda, penso que é necessário especial atenção às mulheres em situação de vulnerabilidade, com políticas de geração de crédito, isenção fiscal e de incentivo a mulheres que chefiem cooperativas ou micro empresas. Também é preciso atenção ao desemprego na juventude que atualmente atinge mais de 20% em São Paulo. Os estágios não podem ser de caráter exploratório, mas de formação e capacitação, com remuneração justa.

4) De que forma a sua atuação no movimento feminista influenciou na decisão de entrar na política? Você acredita que a militância vai ajudá-la a enfrentar esse processo?

A atuação no movimento feminista foi determinante para me lançar como candidata, pois com o feminismo aprendi a ter força, coragem e a saber que as mulheres podem e devem estar em todos os lugares, ocupar os espaços que nos foram negados historicamente e falar de todos os assuntos que são monopolizados pelos figurões homens que dominam a política nacional.

Preciso me manter conectada com o movimento feminista e demais movimentos sociais para ter forças para conseguir enfrentar homens machistas, conservadores e mercenários que estão na política e na Câmara de vereadores.

5) Quais as suas expectativas e desafios para os próximos quatro anos?

Acredito que passarei por muitos enfrentamentos, pois a Câmara não é meu terreno de atuação. Pelo contrário: as Instituições e espaços de poder sempre foram meus inimigos. Precisarei de muito estômago e coragem para trabalhar num espaço dominado por interesses escusos, pela especulação imobiliária por setores ligados a Igrejas e religiosos fundamentalistas.

Não sairei das ruas e não deixarei de ser uma pessoa comum, que pega transporte público, vai nas manifestações, está junto com os movimentos sociais. Quero levar todo mundo que constrói luta nos diferentes cantos da cidade para dentro da Câmara junto comigo nesse mandato, para juntos termos força para barrar projetos conservadores e aprovar políticas públicas que visem fortalecer os direitos de todo povo.