O céu de Kassab
O Bairro Educador e a escola de 7 h acoplada com espaços como os clubes estarão para ele como o Bolsa Família para Lula
Já está em andamento um plano da prefeitura para transformar a favela de Heliópolis numa plataforma de lançamento de uma experiência de administração pública. O modelo em construção, previsto para entrar em funcionamento no próximo ano, é um arranjo em que escolas, centros de saúde, atividades culturais, espaços esportivos, cursos profissionalizantes e projetos assistenciais formem uma única teia, concentrando recursos das mais variadas secretarias municipais.
Liderada pela comunidade, a experiência, batizada de Bairro Educador, é um dos ingredientes de um projeto desenhado pela assessoria de Gilberto Kassab (DEM) para ampliar a entrada na periferia e inovar a marca social do governo. O futuro de Kassab para novos vôos e talvez até de seu partido depende de São Paulo se transformar numa grande vitrine de soluções urbanas, especialmente nas periferias.
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Pesquisa do Ibope, concluída na semana passada, mostra que a popularidade de Kassab está no céu: 77% de ótimo e bom. Mas ele sabe que, se não inovar, seu prestígio vai perder altura, ainda mais porque se anunciam momentos mais difíceis por causa da crise mundial. Temas como Cidade Limpa, AMAs ou fim das escolas de lata não são mais novidade e perdem um pouco do encanto publicitário -essa é uma das forças do modelo em teste em Heliópolis, um antigo reduto do PT, por significar uma montagem de teias sociais.
Kassab diz que, até o final de seu mandato, quer deixar funcionando cerca de 500 unidades de clube-escola (cerca de cem já estão em funcionamento).
Antigos clubes da prefeitura, a maioria deles com baixo uso ou abandonados, atualmente se convertem em espaços complementares à sala de aula. O que se pretende, segundo o prefeito, é concentrar diversas ações, como as de esporte, informática, lazer, cultura, saúde, reforço educacional e até assistência social. Seriam, em essência, um CEU sem sala de aula, mas servindo como uma extensão da escola.
Dessa forma, de acordo com ele, seria menos difícil ampliar a jornada escolar para sete horas diárias -apesar dos avanços, ainda não se conseguiu, vamos lembrar, acabar, nem mesmo, com a escola de três turnos diurnos.
São medidas que ampliam alguns programas, ainda escassos, em que secretarias trabalham juntas. É o caso do Aprendendo com a Saúde, compartilhado pelos secretários de Educação e Saúde. Mais um exemplo são os projetos culturais dentro dos CEUs, em que se misturam as secretarias estadual e municipal da Cultura.
O clube-escola seria a montagem de uma rede mais completa num único espaço. O projeto da assessoria de Kassab vai mais longe. Em lugares estratégicos, as áreas mais vulneráveis, todo o bairro teria de se converter numa única teia, como Heliópolis, no qual se faria a gestão da porta de entrada da criança até a saída do jovem para o mercado de trabalho. Isso é o que estava por trás da insistência de Kassab em exibir, em sua propaganda eleitoral, a parceria com os cursos técnicos mantidos pelo governo estadual.
O plano se encaixa na pretensão de José Serra de mostrar como uma de suas vitrines eleitorais -a expansão do ensino técnico- é ajudada pela pressão de Lula e de seu ministro Fernando Haddad em convencer o sistema S (Senai e Senac) a abrir mais vagas gratuitas.
A proposta faz sentido. Primeiro, porque a educação deve ser em tempo integral. Segundo, porque para os pobres o atendimento deve ser também integral, cuidando ao mesmo tempo de suas necessidades -aliás, essa é a base do programa do governo federal batizado de Mais Educação, em fase de capacitação de gestores. Marta Suplicy, se eleita, faria uma articulação educativa semelhante, embora dando mais ênfase à ampliação dos CEUs. Isso é apenas o reflexo de novos consensos sobre gestão pública.
Sabemos que, em pequenas comunidades, esse tipo de gestão funciona. Mas funciona com extremas dificuldades, devido à escassez de funcionários públicos qualificados e a brigas de interesses entre os secretários e dos secretários com lideranças comunitárias, muitas delas com projetos eleitorais. Ainda nada foi testado, com essa extensão, numa cidade fragmentada, com 11 milhões de habitantes.
Pelo potencial do impacto, o programa de Bairro Educador e a implantação da escola de sete horas acoplada com espaços como os clubes estarão para Kassab como o Bolsa Família está para Lula.
PS: O Bairro Educador de Heliópolis ganhou impulso com o apoio municipal e estadual, mas, é bom que se reconheça, foi desenhado e articulado pela liderança local -mais precisamente, por Braz Nogueira, diretor de uma escola pública, convencido de que a educação é muito maior do que a sala de aula.
Tanto que ele mandou, literalmente, derrubar as paredes de sua escola. Se não houver esse tipo de gente treinada, dificilmente uma proposta daquela complexidade, envolvendo bairros pobres e os arranjos de várias secretarias nos espaços do clube-escola, irá muito longe.