STF nega habeas corpus a Lula, que pode ser preso

O Supremo Tribunal Federal negou, na madrugada desta quinta-feira, dia 5, habeas corpus ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, condenado em segunda instância a 12 anos e um mês pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro no caso do triplex de Guarujá (SP), numa investigação da Operação Lava Jato. O julgamento  durou quase 10 horas e meia e sofreu pressão da sociedade civil e até mesmo dos militares.

O placar final foi de 6×5, sendo que os ministros Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso, Rosa Weber, Luiz Fux e Cármen Lúcia votaram com o relator do processo, Edson Fachin, que negou o pedido da defesa do petista. Gilmar Mendes, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski, Marco Aurélio de Mello e Celso de Mello votaram a favor do habeas corpus.

Sessão do STF que vai votar o habeas corpus do ex-presidente Lula
Créditos: Divulgação
Sessão do STF que vai votar o habeas corpus do ex-presidente Lula

Ficou adiada, no entanto, uma possível mudança de posicionamento do STF sobre a tese que permite a prisão após a condenação em segunda instância.

Na abertura da sessão, a presidente da Corte, ministra Cármen Lúcia, lembrou que o “colegiado cumpre suas obrigações constitucionais de decidir em última instância causas de importância maior para o Brasil e para os cidadãos brasileiros”. “Toda decisão judicial é importante, entretanto, algumas têm eventualmente maior impacto que outras. Mas todas são tratadas pelos juízes com igual rigor e responsabilidade por este e por qualquer tribunal”, completou, num recado velado a pressões sofridas pelo colegiado.

Voto a voto

O primeiro a votar, Fachin afirmou que a proteção eficiente dos direitos fundamentais se dá também por meio do direito federal. Lembrou que o país tem sido questionado internacionalmente em relação ao respeito dos direitos humanos por conta da ineficiência do seu sistema de proteção penal.

Segundo ele, o julgamento de um pedido de habeas corpus preventivo não é o meio para modificar o que já tinha sido definido em plenário sobreo tema.

Gilmar Mendes, que pediu que seu voto fosse antecipado, mudou a forma como analisou a questão em 2009, e justificou: “Por que que estou mudando de posição? Porque isso resulta numa total injustiça. Se já temos uma justiça com várias falhas, a criminal por si só é extremamente falha. As prisões automáticas empoderam um estamento que já está mais que empoderado. O estamento dos delegados, dos promotores, dos juízes”. Para ele, prisão em segunda instância é uma “balela”. “Como que nós conseguimos olhar no espelho, nós que fazemos essa defesa retórica tão enfática dos direitos humanos?”, perguntou.

Alexandre de Moraes afirmou que não se pode conceder habeas corpus sem ilegalidade ou abuso de poder. “O que me parece importantíssimo é se é possível analisar uma posição judicial baseada no posicionamento atual do STF.”

Luís Barroso seguiu o relator, negando o pedido da defesa. Segundo ele, o sistema é feito para “prender menino pobre”. “É um erro de achar que o direito penal tem esse papel de fazer processo durar 20, 30 anos.” Disse também que as autoridades não conseguirão prender corruptos se o entendimento do Supremo sobre a prisão de condenados em segunda instância for modificada.

O voto da ministra Rosa Weber foi contrário ao habeas corpus pedido pela defesa. Destacou que a jurisprudência não pode ser instável e que se deve respeitar a colegialidade (maioria). “A decisão judicial deve se apoiar não nas preferências pessoais do magistrado, mas na melhor interpretação possível do direito objetivo, a Constituição, as leis, a tradição jurídica, a prática institucional e os valores de uma sociedade.”

Para Luiz Fux, “a presunção de inocência, ela cessa a partir do momento em que, através de decisão judicial se considera o paciente culpado”. “Um acordão condenatório, que não é ilegal, que não é injusto, assenta de forma inequívoca a culpa do réu”, afirmou o ministro, que votou contra o habeas corpus.

Dias Toffoli votou a favor do pedido de Lula e defendeu que a pena só poderia ser cumprida após o “trânsito em julgado”, ou quando todos os recursos fossem esgotados. Como isso “pode demorar muito para chegar”, disse que a execução deveria aguardar a decisão do STJ.

O ministro Ricardo Lewandowski também apoiou o habeas corpus e encaminhou seu voto na defesa do princípio da presunção de inocência. “Significa esta expressão que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória. Quer dizer que a pessoa se mantém livre, salvo naquelas situações extraordinárias, em que o magistrado de forma fundamentada decrete a prisão”, afirmou.

Marco Aurélio Mello votou a favor do pedido do ex-presidente, argumentando que ninguém pode ser considerado culpado até o trânsito em julgado. Lembrou também da hipótese de um réu preso após condenação em segunda instância ser solto depois de uma absolvição. “Ninguém devolve à pessoa, ao homem, a liberdade perdida.”

O decano do Supremo, Celso de Mello, começou sua fala mandando um recado aos militares. “Insurgências de natureza pretoriana, à semelhança do ovo da serpente, descaraterizam o poder civil ao mesmo tempo em que o desrespeitam.” E finalizou: “É preciso ressaltar que a experiência concreta que se submeteu o Brasil no regime de exceção constitui para esta e próximas gerações uma grande advertência que não pode ser ignorada”.  No que se refere ao voto, ele defendeu a concessão do habeas corpus, ligando a presunção de inocência à democracia. Segundo Mello, é limitação constitucional ao poder do Estado, a quem cabe provar que o réu é culpado.

O advogado de Lula, José Roberto Battochio, tentou, com o empate em 5×5, que o voto da presidente Cármen Lúcia não acontecesse, citando o regimento interno. A presidente, então, abriu uma votação entre os ministros, que decidiram que ela tinha o direito de votar.

Coube a Cármen Lúcia, assim, desempatar o placar e negar o pedido da defesa de Lula. Ela apontou que continuam em vigor todas as possibilidades de rever a pena por meio dos recursos possíveis. Segundo ela, o entendimento da presunção da inocência não pode levar à impunidade.

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