Oito em cada dez bebês com microcefalia nascem de mães negras
Um ano depois do surto de vírus da zika, o jornal Folha de S. Paulo fez um levantamento via Lei de Acesso à Informação e descobriu um dado importante: oito de cada dez bebês nascidos com microcefalia e outras alterações cerebrais ligadas ao vírus da zika são filhos de mulheres negras (pretas e pardas, pela nomenclatura oficial), de acordo com dados do Ministério da Saúde.
No Nordeste, região com maior incidência, o percentual mais alto é do Ceará –93,9% das mães de bebês com má-formação ligada ao zika são negras. Pelo Censo 2010 do IBGE, pretos e pardos somam 66,4% da população do Estado. No país, representam pouco mais de metade.
Os referem a 44,2% das 8.703 notificações feitas pelos Estados ao governo federal até 23 de julho –na maioria, o quesito cor/raça não foi preenchido.
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A reportagem entrevistou Jurema Werneck, médica negra e militante da ONG Criola, que trabalha para promoção de direitos das mulheres negras. Ela afirmou que a desigualdade racial entre mulheres negras e brancas se reflete também no acesso ao aborto, que, apesar de proibido para casos de microcefalia, é mais seguro e acessível para a classe média, predominantemente branca. “O Estado diz: você não pode abortar. Mas também diz que os seus filhos são problema seu”, disse Werneck, em alusão aos serviços públicos precários no Nordeste voltados a bebês com microcefalia.
A médica também afirmou que existe uma tragédia ambiental por trás da alta proliferação de mosquitos infectados com zika. “A falta de saneamento, de coleta adequada de lixo, de acesso a água encanada ocorrem nas comunidades negras”.
Ela também critica as falhas na compilação e divulgação dos dados. “Quando o governo não diz que as mulheres negras estão padecendo mais, se desresponsabiliza de fazer políticas dirigidas a esse grupo. Faz uma afirmativa genérica e pode continuar dizendo na TV que é preciso matar mosquito, e não cuidar dessas mulheres. Isso é puro racismo.”