Projeto Ateliê Azu utiliza azulejos para colorir bairros de SP

13/08/2015 10:43 / Atualizado em 29/11/2016 17:14

Azulejos instalados em banheiros, cozinhas e outros cômodos da parte interna de uma casa não atraem o interesse do paulistano Elcio Torres. Para o artista plástico, lugar de azulejo é na rua, diante de todos os olhos, dando um novo significado ao cenário urbano e modificando espaços pouco atrativos.

Se você já esteve em São Paulo e conhece lugares como o Parque Domingos (próximo ao Sesc Santana), o Senac Taboão da Serra ou a estação da CPTM Comendador Ermelino, é provável que tenha visto os painéis de azulejo do Ateliê Azu, projeto fundado por Elcio no começo de 2008.

Sua mais nova intervenção urbana poderá ser vista a partir do próximo sábado, dia 15, quando será inaugurado seu trabalho na escadaria de azulejos entre as ruas Patápio Silva e Medeiros de Albuquerque, na Vila Madalena, em SP.

Os 94 degraus de uma escadaria na Vila Madalena passam por processo de revitalização
Os 94 degraus de uma escadaria na Vila Madalena passam por processo de revitalização

Nascido e criado na Penha, zona leste da cidade, Elcio não faz rodeios ao contar ao Catraca Livre sobre o início do seu projeto. Ele explica que nunca havia trabalhado com azulejos até o dia em que sua ex-mulher comprou um apartamento e quis contratar alguém para instalar a cerâmica no banheiro. Só que o preço do serviço era muito caro.

“Deixa que eu faço isso aí”, disse à esposa. Esse foi o “empurrão” necessário para que ele começasse a estudar o ramo com mais profundidade – na época, trabalhava com gravuras. “O banheiro que fiz saiu em uma revista de decoração e passei a ganhar dinheiro com isso. Foi o começo de tudo”, conta.

O Ateliê Azu está localizado na comunidade Vila Santa Inês, no extremo leste da cidade. “Estamos em uma favela a mais de 20 quilômetros do centro. O nosso desafio é trazer pessoas de outras regiões para cá e fazer com que nossos painéis na favela virem um roteiro cultural e atraiam turistas”.

É lá que fica instalada boa parte dos azulejos produzidos no Ateliê. Em 2010, por exemplo, a chamada Escadaria Monte Alegre, uma das mais utilizadas pelos pedestres da comunidade, foi revitalizada e transformada em um espaço com cores, texturas e desenhos.

A transformação da Escadaria Monte Alegre foi o primeiro trabalho do Ateliê Azu na Vila Santa Inês
A transformação da Escadaria Monte Alegre foi o primeiro trabalho do Ateliê Azu na Vila Santa Inês - Picasa

Em 2011, foi a vez de outra área na região ser renovada, a Praça Dona Neusa. “A praça não tinha nome e não tinha cor. A partir de 2011 foi nomeada por nós com o nome de Dona Neusa. Aquele espaço, como passagem e ponto de encontro, só existia por intervenção dela, que trabalhava e lutava por melhorias na vida dos moradores da Santa Inês e outros bairros da zona leste”, diz o artista.

Praça Dona Neusa após transformação
Praça Dona Neusa após transformação

Elcio gosta de lembrar que o Ateliê foi um mecanismo encontrado para fortalecer a favela, uma vez que sua empresa gera renda e emprego para os moradores dali. “Quando vou fazer um trabalho, eu preciso de mão de obra. E sempre chamo um conhecido ou vizinho da região e assim eles começam a entender o empreendedorismo”, comenta.

Foi com esse espírito que o artista conheceu o jovem Leandro Araujo, morador da favela que é seu sócio há mais de sete anos.

“Trabalhar no Ateliê mudou a minha relação com São Paulo. Antes eu ficava muito aqui na vila, hoje eu sou da cidade”, diz Leandro. “Conheci muita gente de diferentes regiões ao longo desses anos e acredito que temos que aprimorar essa troca de experiências”.

Os sócios Leandro Araujo (à esquerda) e Elcio Torres
Os sócios Leandro Araujo (à esquerda) e Elcio Torres

“Azulejo não é fim. Azulejo é meio”. Essa frase costuma ser dita pelos sócios nas muitas entrevistas que fazem à imprensa para lembrar que a cerâmica é uma forma lúdica de dar luz a questões acobertadas de São Paulo. “O azulejo é meio de discussão do lugar que vivo, meio de discussão de como eu me relaciono com meu vizinho e com minha cidade”, afirma Elcio.

Na escadaria da Vila Madalena, serão inseridas obras criadas por nove artistas que atuam em diferentes vertentes, como o poeta da periferia Sérgio Vaz, criador do famoso Sarau da Cooperifa, na zona sul de São Paulo. Uma poesia de Vaz foi gravada em azulejo e inserida em alguns degraus.

Além de sua poesia, a escadaria também receberá o trabalho de Juliana Russo, Valentina FG, Jéssica Oliveira, Elizandra Souza, Laura Guimarães, Dugueto Shabazz, KS Nei e Jorge Rezende.

Frase do artista KS Nei instalada na escadaria da Vila Madalena
Frase do artista KS Nei instalada na escadaria da Vila Madalena

A inauguração da nova escadaria será feita durante a realização de mais um encontro do projeto Passeio na Vila, no Armazém da Cidade, onde haverá uma tarde de gastronomia e jazz na rua.