Editora oferece capacitação profissional para moradores de rua

Além das oficinas de capacitação, o projeto promove arrecadação de donativos como itens de higiene e roupas para eventuais entrevistas de emprego

Pesquisas recentes revelam que, hoje, aproximadamente 16 mil pessoas vivem nas ruas da maior cidade do país. E no tradicional bairro do Bexiga, que concentra uma das maiores populações desabrigadas da capital paulista, o projeto “Transformando Vidas”, organizado pela editora FTD, oferece oficinas de capacitação profissional para moradores de rua, visando sua reinserção no mercado de trabalho.

O curso, que teve início no último 28 de julho e segue durante o segundo semestre, oferece aulas de tecnologia (aprenderão a mexer em power point, excel, redes sociais e todo este universo), confecção de fanzines, oficinas comportamentais, autoestima, dicas de entrevista de emprego e outras abordagens.

Além das oficinas, o projeto também conta com uma campanha de arrecadação de donativos como itens de higiene e roupas para eventuais entrevistas de emprego. Ao todo, o programa deve beneficiar cerca de 100 pessoas.

Conheça a história de Jorge, carioca de 36 anos:

Um dos beneficiados pelo projeto, Jorge, 36 anos, reflete: “o desafio é vencer a indiferença”.

“Eu me pergunto, meu Deus do céu quando isso vai acabar?

O desafio é vencer a indiferença. As pessoas procuram trabalho, mas as coisas não saem como o planejado. Se a pessoa consegue um trabalho, ela consegue o resto. O maior desafio está sendo esse.
Não quero que a minha família me veja assim. Não montei nada na minha vida, nem uma família. Não tenho filho, não tenho nada. Com essa vida que eu estou vivendo, vou ter o que?

Tem 10 anos que estou nessa situação, mas agora que eu fui acordar, querer alguma coisa. É a primeira vez que eu me sinto motivado a mudar, mas aí vem a angústia. Quero uma oportunidade, tenho uma profissão. Sou bombeiro hidráulico, ladrilhador. Quero me sentir útil.

Graças a Deus eu tô conseguindo vencer as barreiras, que é o álcool, a droga. Creio que Deus vai abençoar, que até o final do ano, eu consigo ir pro Rio passar o Natal com a minha família, e eles falarem “caramba ele tá mudando”. Aí eu olho pra mim, olho pra minha vida e penso, não tô podendo nem me ajudar, quem dirá ajudar alguém.

A rua me ensinou bastante coisa. Não só o sofrimento. É muita história que as pessoas contam… Se você olhar na rua, você vai ver muitas pessoas que já foram advogados, médicos, empresários, que já teve uma vida financeira boa. Muitas das vezes é decepção familiar, decepção com esposo ou filhos, aí a pessoa fraquejou, fraca de mente, de espírito, e taí caiu na rua.

Hoje eu tô dormindo num abrigo na Luz, mas está acabando. Tenho mais um mês. Agora eu vou ter que correr contra o tempo. Se eu cair na rua… agora que eu consegui algumas coisas. Cair na rua de novo, vai ser degradante. Vou correr contra o tempo. Preciso arrumar um emprego. Quero sair de manhã, chegar no lugar, colocar um uniforme… a pessoa está fazendo parte da sociedade, cumprindo seus deveres.

A assistente social disse que eu me cobro muito, mas isso não é se cobrar, é que eu quero realmente ter minha independência, entrar no mercado e comprar minhas coisinhas, entrar numa farmácia e escolher o produto que eu gosto de usar.

Às vezes eu vou no Ibirapuera e vejo as pessoas andando, com a família e penso daqui a pouco essa pessoa vai pra casa, vai comer uma comida quentinha e na segunda-feira vai para o seu trabalho. E eu? Eu vou continuar no mesmo trajeto, andando pela rua.

As pessoas olham pra gente e pensam, taí por que quer. Não é. Não está na vontade. Queremos sair. Cometemos alguns erros, mas isso aí… errar é humano, permanecer no erro é burrice. O obstáculo maior está sendo conseguir um emprego, alugar um quartinho e na segunda-feira ter um emprego, se dedicar, se sentir útil.

Esse é meu objetivo. Faz 1 ano e pouco que estou nessa luta aí. Tamo na luta.
Creio que vai dar certo. Tenho fé em Deus”.