Eliana de Lima: ‘Os intérpretes deveriam ser mais valorizados’

A cantora conversou com o Samba em Rede sobre sua trajetória, seus projetos e seu olhar para o Carnaval hoje

21/03/2018 00:00 / Atualizado em 23/10/2019 11:07

A paulistana Eliana Maria de Lima, mais conhecida pelo nome artístico Eliana de Lima, é a intérprete de sambas-enredos que se tornaram clássicos do Carnaval paulistano. Quem é que não conhece ou nunca escutou, por exemplo, os famosos versos: “Ô ô, a menina bonita, no chão da Bahia, dançou Mariana” ou “Ê poeira, poeira, poeira, vai levantar poeira, ijexá, banguleando todo o povo se incendeia”?

“Águas Cristalinas”, de 1985, da Unidos do Peruche, e “Babalotim – A História dos Afoxés”, 1989, da Leandro de Itaquera, foram dois dos vários sambas-enredos gravados e entoados por Eliana de Lima na década de 1980.

Além dos sucessos que ficaram na memória daqueles que amam o Carnaval, Eliana também emplacou os hits “Desejo de Amar”, de Gabú e Marinheiro e “Volta Pra Ela”, de Luiz Carlos, Waldir Luz e Antônio Carlos de Carvalho; conviveu com figuras como Xixa, Mestre Lagrila e Walter Guariglio, e ainda protagonizou a luta pelo reconhecimento da mulher e a valorização do cargo de intéprete nas escolas de samba.

“Acho que os puxadores de samba deveriam ser mais valorizados. Eu fui uma das primeiras pessoas a começar a brigar por isso. Hoje está legal, mais ainda não está do jeito que tem que estar”, aponta em entrevista exclusiva ao Samba em Rede.

Isso dá uma ideia da grandeza de cantora, que, aos 56 anos de idade, consagrou-se como uma das principais referências femininas do Carnaval de São Paulo.

“Eu sempre era convidada para defender sambas-enredos, nunca era chamada para ser a puxadora oficial”, comenta em entrevista exclusiva
“Eu sempre era convidada para defender sambas-enredos, nunca era chamada para ser a puxadora oficial”, comenta em entrevista exclusiva

Nascida em 19 de setembro de 1961, Eliana aprendeu a cantar ainda na infância. Influenciada por nomes como Alcione, Beth Carvalho, Clara Nunes e Elza Soares, a menina vivia cantarolando em casa, em festas familiares e também soltava a voz em passeios de ônibus acompanhada de sua mãe.

Filha de pais religiosos, Eliana teve de superar alguns obstáculos para acessar o universo carnavalesco. Seu primeiro contato com uma escola de samba se deu em 1979, quando passou a frequentar a quadra da Cabeções de Vila Prudente: “Minha mãe era da Igreja Assembléia de Deus e a gente não podia nem ver o Carnaval na televisão. Certo dia, um primo e eu fomos escondidos conhecer uma quadra de uma escola de samba. Quando cheguei lá, vi a Silvia cantando na Cabeções e fiquei encantada. Era isso que eu queria para a minha vida”, recorda.

Dias depois, a jovem reuniu forças e coragem e decidiu voltar à quadra da Cabeções de Vila Prudente. Eliana pediu para cantar alguns sambas e a cantora não poderia ter se saído melhor: tornou-se pastora da verde e rosa da zona leste.

Apesar de ter seu talento reconhecido, por ser mulher Eliana não foi aceita como puxadora imediatamente, tendo começado a cantar nos desfiles apenas em 1980, quando defendeu o samba-enredo “Cultura, Divindade e Tradições de um Povo” para a escola de samba Príncipe Negro. “Foi um dos momentos mais incríveis da minha vida porque eu nunca tinha entrado em um estúdio. Gravei e puxei o samba-enredo da Príncipe na avenida. Depois disso, fui galgando o meu espaço”, diz.

A reação positiva das plateias e a repercussão de sua aparição estimularam Eliana a seguir pelas vias do Carnaval, buscando o seu espaço enquanto mulher e intérprete de sambas-enredo. Durante a década de 1980, Eliana cantou para quase todas as principais escolas de samba de São Paulo, como a Mocidade Alegre, Unidos do Peruche, Nenê da Vila Matilde, Rosas de Ouro, Barroca Zona Sul e Imperador do Ipiranga.

Em 1985, Eliana de Lima projetou-se pela Unidos do Peruche ao interpretar o samba-enredo “Águas Cristalinas”, assinado por Ideval Anselmo e Zelão. “O primeiro degrau da fama na minha carreira foi neste Carnaval. Depois disso fiquei vários anos na Peruche, onde eu tive até a experiência de cantar com o mestre Jamelão”, recorda.

Outro marco na carreira de Eliana foi com o samba-enredo “Babalotim – A História dos Afoxés”, composto por Xixa e Dom Marcos, pela Leandro de Itaquera, em 1989. Vale lembrar que a irreverência de Eliana também abriu espaço para outras mulheres adentrarem o universo do Carnaval, como as cantoras Marcia Inayá e Bernadete do Peruche.

Escute a canção “Desejo de Amar”, de Gabú e Marinheiro:


De lá para cá, a Rainha do Pagode já gravou 11 discos, totalizando mais de duas milhões de cópias vendidas e recebeu diversos prêmios, entre eles, o Troféu Imprensa, Prêmio Sharp e o Troféu SBT.

Na entrevista concedida ao Samba em Rede – dias antes de sua participação no projeto “Clube do Samba-Enredo” do grupo Quesito Melodia -, Eliana também falou sobre a importância do compositor Ronald Elias Balvetti, o Xixa, em sua formação e trajetória. Além de músicas, o bate-papo resgatou histórias como a do Carnaval de 1988, ocasião em que Eliana defendeu o samba-enredo “Filhos da Mãe Preta” junto do saudoso mestre Jamelão.

Confira o registro completo:

  • Para celebrar o Mês da Mulher, o Samba em Rede presta homenagens diárias a personagens do gênero feminino que nos inspiram. Saiba mais sobre a campanha e leia outros perfis aqui.