Roberto Caprí pede passagem e ‘resiste para existir’

Compositor já teve sua obra gravada por nomes como Bezerra da Silva, Jovelina Pérola Negra e Zeca Pagodinho

09/05/2017 00:00 / Atualizado em 05/08/2019 09:02

Nascido em Vila Isabel no tempo em que ainda se escutava o apito das fábricas e criado no subúrbio do Engenho Novo, ambos bairros da zona norte do Rio de Janeiro, José Roberto Bezerra, mais conhecido como Caprí, migrou para São Paulo e acabou tornando-se uma das maiores referências do samba paulistano.

O gosto pela música era evidente, um reflexo do ambiente familiar e musical que o envolveu na infância. Sua lembrança mais antiga era a do pai tocando composições de samba e choro no violão de cravilha. “Eu comecei a ter intimidade com o instrumento e nunca mais parei”, conta em entrevista exclusiva ao Samba em Rede.

 Caprí concede entrevista exclusiva ao Samba em Rede
 Caprí concede entrevista exclusiva ao Samba em Rede

Para sua própria surpresa, Caprí não esperava trabalhar com o samba profissionalmente. O receio de ser discriminado pela opção musical foi o primeiro entrave antes de abraçar a sua cultura. Porém, a convivência com os sambistas, nos botequins cariocas, o fez apaixonar-se pelo gênero.

Seu primeiro entusiasta foi o músico Vadinho do Engenho Novo, um colega do bairro onde morava e frequentador da escola de samba Saturno. Em 1955, Caprí passa a integrar a ala de compositores da agremiação, onde permaneceu por muitos anos. Foi ali que o menino de apenas 14 anos deu início ao caminho como profissional.

Carreira profissional

Outros convites foram surgindo e Caprí começou a se envolver mais com o universo das escolas de samba: conheceu bambas como Nelson Cavaquinho, Mussum, Jurandir, Zagaia e Cartola no Morro de Mangueira. “Eu adorava ver o Cartola cantar. Ele era muito aplaudido. E eu, muito novo, já no meio daquela turma, Dona Neuma e Xangô da Mangueira. Ficava maravilhado com aquilo tudo”, recorda sobre seu envolvimento com o verde e rosa – até hoje sua escola do coração. 

Nos anos 1960, o jovem músico começa a frequentar a quadra do Salgueiro, onde cultivou amizade com Almir Guineto e os integrantes do grupo Originais do Samba. Décadas mais tarde, integrou os grupos Ferro de Engomar e Cura Ressaca – este ao lado de Neoci, Darcy Maravilha e Adílson Gavião.

O envolvimento cada vez maior com o samba rendeu-lhe, entre outras alegrias, a produção de dois LPs. A sua estréia em disco deu-se no ano de 1985, pela gravadora Arca Som, com o LP “O samba descontraído de Caprí“.

Em 1986, gravou seu segundo álbum intitulado “Caprí…chando no Pagode“. Desse trabalho, destaque para a música “Questão de opinião”, de Mauro Diniz e Adilson Vítor, tema de abertura do programa “O Samba Pede Passagem”, do radialista Moisés da Rocha.

Graças à proximidade com Moisés, o compositor participou do movimento “Caravana do Samba Pede Passagem” – iniciativa que reunia comunidades e representantes ligados ao samba autoral.

Nesse percurso, além de firmar parcerias com compositores do calibre de Almir Guineto, Adalto Magalha, Mário Sérgio, Adilson Gavião, Wilson Moreira e Sílvio Modesto, Caprí também foi gravado por conceituados sambistas como Bezerra da Silva, Jovelina Pérola Negra, JB Samba, Boca Nervosa, Arlindo Cruz, Sombrinha, Zeca Pagodinho e Leci Brandão.

Falta de reconhecimento

Apesar dos diversos obstáculos enfrentados para ser reconhecido, Caprí fala com um tom de esperança ao lembrar de nomes como Jônatas Petróleo e William Fialho, jovens que “realmente batalham pela música”.

Também menciona projetos sociais voluntários voltados ao desenvolvimento musical de crianças e jovens como o Sarau Samba Original e o Zumaluma, iniciativas que oferecem espaço aos compositores anônimos ou com pouco espaço nas mídias e difundem a cultura do samba.

Autor de uma obra musical original em que mistura composições alegres e jocosas – festejando a boêmia e a malandragem sadia com críticas às realidades política e social do país -, Caprí segue ativo pedindo licença para dizer que também é um dos poetas do samba. Passados 76 anos de idade e 55 de carreira, o lema do carioca que vive em São Paulo é “resistir para existir”.

Confira a entrevista na íntegra: