O que deveria ser feito para atingir desmatamento zero no Brasil
Por Alessandra Petraglia e Heloisa Aun
O Brasil está caminhando no sentido contrário da preservação da Amazônia. Foram 55 milhões de hectares dizimados em um período de dez anos, entre 1990 e 2010. O montante equivale a uma área duas vezes maior do que o território da Alemanha. Ou seja, o único país no mundo cujo nome foi dado a partir de uma árvore, o pau-brasil, é também o que mais desmata.
Mas o caminho para reverter esse processo não é uma novidade. Isso é o que indica o estudo do Grupo de Trabalho (GT) pelo Desmatamento Zero — elaborado pelas ONGs Greenpeace, Instituto Centro de Vida, Imaflora, Imazon, Instituto Socioambiental, IPAM, TNC e WWF. O relatório “Desmatamento zero na Amazônia: como e por que chegar lá“, foi lançado na COP 23, em Bonn, na Alemanha.
O documento aponta que não há justificativa para o corte ilegal de árvores e, inclusive, mostra que a prática não é competitiva economicamente. Caso medidas fossem tomadas, o país poderia aproveitar muito mais os recursos da floresta como uma fonte de desenvolvimento e, o melhor, tudo de forma sustentável, preservando a vegetação em pé.
“A gente mostra quais são os caminhos para se chegar ao desmatamento zero, fazendo uma reflexão sobre ações que foram bem sucedidas e olhando um pouco para as lacunas”, comenta Cristiane Mazzetti, especialista em Amazônia do Greenpeace. O conteúdo foi apresentado em um momento em que as discussões sobre o clima mostram-se mais urgentes, considerando as dificuldades para conter o avanço do aquecimento global.
Segundo o estudo do GT, de todo o espaço desflorestado até hoje, 65% é utilizado para pastagem de baixa produção, com menos de um boi por hectare. Além disso, o corte de madeira tem contribuído pouco para o PIB, com um crescimento de 0,013% anualmente.
- Confira a cobertura da COP 23 neste link.
Possíveis soluções
Quatro eixos de atuação são indicados como as soluções para a recuperação e a preservação do bioma. Entre eles, a implementação de políticas ambientais mais eficientes; a adoção de melhores práticas agropecuárias; a restrição de mercado para novos produtos de desmatamento; e o engajamento público com a causa.
Segundo Mazzetti, o acirramento das medidas por parte do governo é uma das melhores alternativas para combater a derrubada ilegal. “A criação de áreas protegidas para garantir a conservação e o uso tradicional são formas de barrar o desmatamento. Inclusive, essas foram estratégias muito bem sucedidas pelo governo para reduzir a taxa de desmatamento de 2005 a 2012”, afirma.
As áreas de preservação também evitam a grilagem, prática de falsificação e envelhecimento de documentos para aquisição de terras. Este problema vai além da questão ambiental, pois influencia diretamente o índice violência no campo.
Neste ano, a MP 759, também conhecida como MP da Grilagem, foi sancionada pelo presidente Michel Temer, mesmo à revelia de ONGs outra organizações de proteção ambiental. A medida provisória prevê a ampliação do prazo para regularização das invasões e grilagens das terras públicas, o que pode abrir espaço para o aumento das ocupações irregulares.
De acordo com o diretor-geral do Serviço Florestal Brasileiro, Raimundo Deusdará Filho, para combater o desmatamento, além da recuperação e restauração, é preciso adotar o manejo florestal sustentável. “A madeira está na nossa vida e a economia florestal precisa ser fortalecida. Mas o que é o manejo florestal sustentável? É você ter a possibilidade de usar madeira, mas no ritmo que a floresta tem para se recuperar”, pontua.
Outro ponto relevante para os especialistas é o envolvimento social com a causa. Conscientizar a população sobre as potencialidades da floresta, assim como os impactos da derrubada de árvores pode acelerar os resultados positivos. A compra de madeira certificada, a proteção dos recursos naturais, o plantio de mudas são medidas simples, mas significativas para a valorização da flora e da fauna do país.
Os benefícios
O relatório aponta uma série de benefícios — ambientais, sociais e econômicos — que o desmatamento zero traria ao Brasil, como a redução de emissões de gases do efeito estufa, contribuindo com as metas climáticas, e a diminuição de doenças e mortes causadas pela poluição das queimadas.
“Existe todo um potencial econômico a ser explorado a partir da manutenção da floresta em pé, beneficiando as comunidades locais. Um projeto de desenvolvimento que fosse de fato para a Amazônia. Essas iniciativas existem, mas ainda não em grande escala”, explica a especialista em Amazônia do Greenpeace.
Além disso, os outros pontos do desmatamento zero destacados pelas organizações como positivos são: a queda de risco de mudanças climáticas e impactos na produção agropecuária; a abertura de novos mercados de commodities e manutenção daqueles mais exigentes; a redução do risco legal para empresas e produtores rurais; a diversificação de fontes de receita em florestas protegidas; a diminuição de concentração de renda e violência no campo; a queda do trabalho escravo; e a preservação dos direitos de povos tradicionais e indígenas.
- A cobertura da COP 23 é uma parceria entre o Climate Journalism e oInstituto Clima e Sociedade (iCS) para incentivar a produção de jovens jornalistas sobre temas relacionados às mudanças climáticas e a mobilidade urbana.
- As jornalistas viajaram a convite das organizações.