Da periferia ao mundo corporativo: conheça a trajetória da cabeleireira que abriu salões de beleza dentro de várias empresas de São Paulo
À frente dos salões Beleza Básica Express, Edma Pereira Tostes sonha em ensinar o ofício para meninas nas periferias
Com muito estudo, luta e trabalho, a cabeleireira Edma Pereira Tostes, de 59 anos, soube aproveitar as oportunidades que apareceram em sua vida e trilhou uma trajetória de sucesso ao abrir a rede de salões Beleza Básica Express, que mudou completamente a sua vida.
Ao longo de seus mais de 30 anos de existência, o salão especializou-se em atender diariamente a centenas de colaboradores de grandes empresas do mundo corporativo.
Mas o que torna essa história tão inspiradora é a origem cheia de dificuldades da empreendedora. Filha de um mestre de obras e de uma dona de casa, Edma e seus seis outros irmãos viviam em Belo Horizonte (MG) antes de sua família ser desestruturada pela separação dos pais.
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A jovem engravidou aos 17 anos e começou a trabalhar para poder sustentar seu filho. Na capital mineira, ela fez um curso técnico e trabalhava como projetista em uma borracharia que produzia peças para a Fiat.
Depois do divórcio dos pais, Edma, a mãe e os irmãos mudaram-se para São Paulo em busca de melhores oportunidades de emprego.
A família morou durante um curto tempo em Itapevi e estabeleceu-se na Cohab 5, na periferia de Carapicuíba, na Grande São Paulo. Como não encontrava emprego em sua área, Edma trabalhou por dois anos como uma espécie de faz-tudo na lanchonete de uma unidade do SESI.
Apesar das muitas dificuldades, ela considera que sempre teve muita sorte. “A vida em BH era muito sacrificada. Do jeito que cheguei aqui em São Paulo, se eu conseguisse um trabalho como diarista em uma casa de família já seria ótimo para mim. Eu tinha pouco estudo e a minha irmã tinha acabado de se formar. Morávamos em um lugar horrível. Mas quando consegui o trabalho no SESI, tinha um salário legal para ajudar a minha família aqui”, comenta a empreendedora.
O emprego relativamente bem remunerado na lanchonete duraria apenas dois anos – ela foi demitida em uma reestruturação da empresa. Depois disso, trabalhou ainda por dois meses em uma companhia que fabricava vasos sanitários e, como tinha curso técnico de enfermagem, conseguiu emprego no Hospital Oswaldo Cruz.
“Sempre fui muito atenta e a equipe de médicos que eu auxiliava no centro cirúrgico gostava de mim. Mas meu salário na época era muito pequeno; só dava para me manter e mais nada. Na minha família, ninguém me ajudou. Minha irmã, que hoje é advogada, estava desempregada e os outros irmãos não se importavam se as coisas faltassem em casa. Para eles, parecia ser normal não ter nem açúcar para adoçar o café”, revela.
O começo da mudança
O destino de Edma começou a mudar quando ela decidiu fazer um curso para cabeleireiros gratuito oferecido pela Prefeitura de Carapicuíba. A formação durou cinco meses e, na época, por falta de dinheiro para o transporte, ela precisava caminhar muitos quilômetros para conseguir assistir às aulas. E ainda precisava conciliar a capacitação profissional com o trabalho no hospital.
“Eu me saí muito bem na área e a minha vida nunca mais foi a mesma. Quando terminei o curso, eles me deram uma carta de recomendação para um cara que tinha acabado de chegar da Itália e estava precisando de uma assistente para abrir um salão na rua Augusta. Na época, também me aventurei a sair da casa dos meus irmãos, e, mais tarde, minha irmã veio morar comigo”, diz.
Edma conseguiu o emprego e conta que até hoje é extremamente grata ao dono do salão. “Eu aprendi tudo com esse cara. Ele sabia tudo sobre tintura e corte. E até pagou para mim a metade de um curso de Engenharia do Corte, que hoje a gente conhece como Pivot Point, uma técnica chinesa de corte de cabelo que usa matemática e ainda é super revolucionária”, explica.
“Na época, no começo dos anos 90, um cabeleireiro ganhava muito bem e meu salário era cerca de seis vezes maior do que antes. Lembro que joguei todo o meu primeiro salário na cama, com aquelas notas altas que nunca tinha recebido até então, e minha irmã nem acreditava que aquilo fosse tudo meu”, acrescenta.
A empreendedora trabalhou nesse salão por quatro anos e, quando já não tinha mais muito a aprender, o empresário italiano disse que ela já estava pronta para abrir o próprio negócio e trilhar o próprio caminho.
Como Edma atendia a muitos clientes corporativos no emprego anterior, como os funcionários dos bancos Caixa Econômica, Bradesco e Itaú, ela logo foi convidada pelo Banco Safra para abrir um pequeno salão para os colaboradores da empresa. Foi assim que nasceu o salão Beleza Básica Express na tradicional rua Augusta.
Durante muito tempo, a cabeleireira trabalhou exclusivamente para o banco. No entanto, quando o salão se mudou para um imóvel maior, em outro ponto da rua Augusta, a instituição permitiu que ela contratasse mais equipe e abrisse os serviços ao público.
A partir desse momento, o Beleza Básica atendeu no mesmo endereço muitas pessoas que trabalhavam no mundo corporativo. E vários desses preciosos clientes, sempre que mudavam de emprego, convidavam a cabeleireira para abrir um pequeno salão em sua nova empresa.
Foi assim que surgiu a oportunidade de inaugurar um salão dentro do escritório da Unilever, na avenida Faria Lima. E, quando a empresa trocou de sede para o WTorre, no Morumbi, em 2018, Edma também foi convidada a abrir uma sede por lá.
Ela investiu todas as suas economias para construir um grande salão no estacionamento desse importante edifício e logo também passou a atender por lá o público de fora da empresa.
Beleza Básica de hoje
Com a chegada da pandemia de Covid-19 em 2020, o Beleza Básica foi obrigado a deixar a sua matriz na rua Augusta, onde atuou por 28 anos. E a sede no WTorre Morumbi tornou-se o endereço principal da rede.
“Quando estávamos na Augusta, atendíamos cerca de 120 pessoas por dia. Numa semana eu estava ajudando uma amiga que também precisou fechar o salão na região, e, na outra, era eu que estava entregando o ponto, pois não conseguíamos mais de 20% daquele movimento. Tínhamos reformado todo o espaço e entregamos o imóvel dessa maneira. Hoje funciona outro salão por lá”, conta a empreendedora.
Entretanto, quando essa época mais difícil da pandemia passou, o salão começou a se reerguer. Atualmente, o Beleza Básica tem uma sede dentro da Bayer, recebendo cerca de 40 clientes todos os dias, e da EZ Towers, atendendo diariamente a 50 colabores da Amil.
Além disso, a matriz no WTower Morumbi, que recebe entre 100 e 120 clientes por dia – só as 12 manicures atendem a 17 clientes e os cabeleireiros, cerca de 15 pessoas por dia. E, recentemente, o salão também fechou uma parceria com uma empresa de depilação a laser.
E toda essa mudança também afetou a vida de Ivone, irmã da empreendedora. “Ela deixou seu emprego na Editora Globo para ajudar na administração do Beleza Básica. Acho que isso foi importante para possibilitar um crescimento profissional mais estável e sadio”, revela Edma.
A cabeleireira ainda conta que tem planos de abrir novas sedes do Beleza Básica em outras empresas. “Tenho projetos que estão esperando para montar sedes no Bradesco, em Osasco, no Parque da Cidade, no Morumbi, e na MAPFRE, na estação Berrini. Estou devendo o projeto para eles, mas ainda preciso levantar orçamento para isso, porque eu não posso abrir nada sem cuidado”, antecipa.
Ela também sonha em dar formação para jovens que moram nas periferias e sonham em se tornar cabeleireiras. “Se você perguntar para 10 donos de salão de beleza, todos estão precisando de cabeleireiro, manicure e depiladora. Falta muita gente qualificada no mercado. E aqui no Beleza Básica sou eu mesma que faço questão de dar treinamento para os colaboradores, ensinando Pivot Point e outras técnicas. Já treinei também barbeiros, já que muitos deles só sabem cortar cabelo à máquina e precisam aprender corte à tesoura. Queria muito expandir os treinamentos para fora”.
“Gostaria que esses jovens tivessem as mesmas oportunidades que eu tive. Sempre gostei muito desse nome Beleza Básica, porque eu acho que não é preciso colocar meu nome na empresa para dar certo. O que menos importa é isso. No nosso trabalho, todo mundo é importante. Todos têm que ser parceiros uns dos outros. É por isso que a coisa dá certo”, ensina a empresária.