Após enfrentar uma experiência difícil no universo da moda, como estilista de um grande magazine, Dandara Sevilha concluiu que precisava mudar de vida.
Foi assim, em busca de vivências radicalmente diferentes das habituais, que ela descobriu, por meio de um curso, o maravilhoso mundo da cerâmica. E, de seus experimentos com a argila, nasceu a Ímpar Ateliê.
“Foi muito mágico perceber como eu poderia construir uma peça inteira do zero, com as minhas próprias mãos. Ver o que imaginei tomando forma e fazer parte de todas as etapas da produção”, conta a artesã.
Desde 2019, Dandara se dedica a fazer artes para vestir em cerâmica e porcelana de alta temperatura. E ela ainda reforça: “cada peça é ímpar, bela e imperfeita”.
Seu trabalho é poderoso, pois materializa sua conexão com os elementos da natureza, como barro, água e fogo, e com os próprios sentimentos. “Ao modelar a argila, encaro todas as minhas falhas e forças. As peças reúnem todas as emoções e dificuldades que o ser humano enfrenta ao longo da vida e os clientes sentem isso”.
Por meio do fazer artesanal, Dandara conseguiu lidar melhor com os imprevistos. “No começo, quando as coisas não saiam como planejado, eu deixava as peças de lado e nem pensava em vendê-las. Não posso dizer que superei completamente o meu perfeccionismo, mas hoje já vejo beleza nas falhas do processo. Acho importante que elas existam, pois contam a história daquele objeto, materializam todas as etapas pelas quais o barro passou para tornar-se uma jóia, uma escultura”.
E sua luta diária com as expectativas é constantemente compartilhada nas redes sociais, algo que a aproxima ainda mais dos consumidores e consumidoras que seguem o perfil da Ímpar Ateliê no Instagram.
Dando forma aos sentimentos
A artesã se inspira nas artes plásticas, no cinema, na poesia e na moda para desenvolver os produtos, mesmo que inconscientemente. Além disso, ela define seu processo criativo como intuitivo.
Primeiro ela modela a argila de maneira livre, até encontrar uma forma que goste. Depois, é preciso replicar para testar o produto, já que o resultado não pode ficar muito pesado.
“Como sou muito ansiosa e agitada, muitas vezes me pego quase que socando a argila. Isso resulta em peças extremamente manuseadas, com acabamentos mais grosseiros, porque fico aflita para terminar logo. Reflito muito sobre a vida enquanto modelo, a ponto de entrar quase que em uma meditação”.
Com as peças esculpidas, a próxima etapa é passar pela secagem natural. Dependendo do tamanho de cada item e do clima, isso pode levar entre três e 20 dias.
Após esse período, as peças atingem o chamado ponto de osso e estão aptas a entrar no forno para a queima do biscoito, responsável por retirar qualquer vestígio de umidade restante, preparando-as para a esmaltação.
Essa etapa acontece no dia seguinte depois das peças resfriarem e terem a poeira removida. Para o esmalte, Dandara opta pelo tipo vidrado que, além de garantir a cor, gera um brilho na peça semelhante a um vidro.
Finalizada essa fase, é hora de partir para a queima de alta temperatura, seguida da pintura das peças com ouro líquido, por meio de uma solução com concentração de 2%. O pincel é aplicado de forma artística em todas as peças e, para fundir essa solução, é necessária uma última queima com o forno preparado a 700ºC por 4h30.
Após o resfriamento, que leva 24h, alguns itens precisam de acabamento com retífica, para retirar quaisquer materiais indesejáveis que tenham grudado neles. Só então inicia-se a montagem das joias.
Com tantas etapas e queimas, é muito difícil ter controle absoluto sobre o resultado do trabalho. Por isso, a cerâmica se transformou em um exercício emocional para Dandara, no qual ela sempre se surpreende pela conclusão de cada peça.
“Quem costuma adquirir essa produção manual tem consciência de que existe uma história por trás de cada peça, um ser humano que depende daquele trabalho para se manter, para ser feliz. Isso faz com que aquilo que se compra seja menos efêmero, tenha mais valor e, portanto, o consumo seja mais consciente e assertivo”, reflete.