Mulheres nos games: conquistas, barreiras e a luta por inclusão, respeito e igualdade

Em entrevista ao Catraca Livre, Lia Fuziy expõe os desafios das mulheres na indústria de games e a urgência de mudanças reais

Em parceria com Luis Nascimento
20/03/2025 14:00

O diálogo e a organização coletiva, como na imagem, são essenciais para fortalecer a luta por equidade, inclusão e respeito no setor.
O diálogo e a organização coletiva, como na imagem, são essenciais para fortalecer a luta por equidade, inclusão e respeito no setor. - Reprodução: Instagram @liafuziy

As mulheres estão conquistando cada vez mais espaço na indústria dos games, mas os desafios ainda são gigantes. Apesar de avanços em representatividade e iniciativas inclusivas, o machismo estrutural segue como um obstáculo para muitas profissionais e jogadoras.

Em entrevista ao Catraca Livre, Lia Fuziy, Presidente da IGDA São Paulo, Coordenadora do GameDev Toolkit e Professora na Faculdade Méliès expôs os desafios das mulheres na indústria de games e a urgência de mudanças reais.

O que mudou?
Cada vez mais mulheres estão assumindo cargos de liderança e influenciando a criação de jogos, mostrando que lugar de mulher é onde ela quiser – inclusive na produção de games. Eventos como a Women Game Jam e o Change The Game ajudam a dar visibilidade a essas profissionais e inspiram novas gerações.

Mesmo assim, o setor ainda é dominado por homens. O incentivo para jogar e explorar tecnologia costuma vir muito mais para meninos do que para meninas, o que cria uma diferença de acesso e familiaridade com os jogos desde a infância. Nos consoles e PCs, essa desigualdade é ainda maior.

“O machismo estrutural começa cedo: meninos são incentivados a jogar e explorar tecnologia, enquanto meninas frequentemente escutam que ‘não é para elas'”, destaca Lia Fuziy, presidente da IGDA São Paulo, coordenadora do GameDev Toolkit e professora na Faculdade Méliès.

Segundo a professora, no ensino superior, muitas mulheres desistem de cursos da área devido ao assédio e à falta de acolhimento. E, quando conseguem entrar no mercado, a luta é para serem levadas a sério dentro das equipes.

A representação feminina em áreas técnicas, como programação, ainda é baixa. O ambiente profissional, muitas vezes, não é seguro nem acolhedor. A falta de políticas de inclusão em muitas empresas só piora esse cenário.

Em entrevista ao Catraca Livre, Lia Fuziy expõe os desafios das mulheres na indústria de games e a urgência de mudanças reais
Em entrevista ao Catraca Livre, Lia Fuziy expõe os desafios das mulheres na indústria de games e a urgência de mudanças reais - Foto: diivulgação Instagram @liafuziy

Diversidade nos games: avançamos ou estamos no modo hard?
“Muitas empresas fazem campanhas bonitas sobre inclusão, mas, na prática, o ambiente interno continua tóxico e excludente. A diversidade precisa ser mais do que um discurso – é necessária uma mudança estrutural real”, afirma Lia.

Hoje, existem mais iniciativas que buscam incluir vozes diversas, considerando gênero, raça e orientação sexual. Eventos como o EAI Jogos, que acontece em São Paulo, são um exemplo de como a representatividade está crescendo. Antes, eventos de games eram dominados por homens, mas agora existe espaço para profissionais diversos brilharem com suas conquistas.

Isso também se reflete nos jogos que chegam ao mercado, com mais personagens representativos e narrativas inclusivas.

Mas ainda falta muito. Empresas que falam sobre diversidade precisam entender que muitas pessoas nunca tiveram a primeira oportunidade na área. Criar apenas vagas para profissionais plenos ou sênior não resolve o problema. É preciso investir em capacitação e treinamentos internos para realmente mudar o ambiente de trabalho.

Diversidade não pode ser só discurso. É preciso uma mudança estrutural real.

Machismo nos games: quando o jogo é desleal
O machismo segue sendo um obstáculo enorme para as mulheres no mundo dos games. Isso se manifesta de diversas formas: da desvalorização de ideias e exclusão de discussões importantes no ambiente de trabalho até ataques e ameaças no universo dos eSports.

No cenário competitivo, jogadoras ainda enfrentam preconceito e têm suas habilidades constantemente questionadas. A desconfiança e o machismo se manifestam de diversas formas, desde comentários depreciativos até a necessidade de provar, repetidamente, sua competência.

A desenvolvedora Lia Fuziy relembra um episódio emblemático: após ministrar uma palestra sobre programação, ouviu de um homem que “tinha cara de designer”, ignorando completamente sua especialização em código. Ao explicar que trabalhava na área, o mesmo interlocutor exigiu ver seus projetos de forma agressiva, como se sua presença precisasse ser validada.

Enquanto homens são automaticamente reconhecidos por seu envolvimento com games, mulheres seguem sendo desafiadas a justificar seu espaço. O avanço da inclusão na indústria é inegável, mas ainda há muitas fases a serem superadas. O desafio agora é garantir que esse progresso não seja apenas um “jogo salvo”, mas sim uma transformação estrutural e definitiva no setor.