Byung Chul Han, filósofo: “Ficar em casa é a forma mais lúcida de resistência”
O filósofo denuncia que a hiperconexão digital e a necessidade constante de exibir cada momento nas redes sociais anularam a capacidade de descanso genuíno
O filósofo sul-coreano Byung-Chul Han, recente vencedor do Prêmio Princesa de Astúrias de Comunicação e Humanidades 2025, propõe uma forma inusitada de rebelião contra o sistema atual: permanecer em casa e cultivar o silêncio, contrariando a lógica de que protestos precisam ser barulhentos e ocupar espaços públicos, o pensador defende que a verdadeira subversão está em guardar silêncio, buscar refúgio e recuperar o controle sobre o próprio tempo.

Por que ficar em casa é considerado um ato de resistência?
Autor de obras influentes como A Sociedade do Cansaço e Vida Contemplativa, Han argumenta que o sistema econômico contemporâneo odeia o vazio e incutiu nas pessoas um medo profundo dos momentos improdutivos. Para o filósofo, o lar se transforma em um bastião de liberdade onde não é preciso prestar contas a ninguém nem testemunhar a exposição incessante das redes sociais.
A proposta de resistência através do recolhimento envolve diversos aspectos fundamentais:
- Recuperação do equilíbrio pessoal através da desconexão voluntária da hiperatividade imposta pela sociedade moderna.
- Escape da autoexploração constante que transforma cada momento livre em oportunidade de produzir ou consumir algo.
- Resgate da capacidade de escutar a si mesmo em meio ao barulho externo, permitindo reconectar com necessidades e desejos autênticos.
- Proteção contra a obrigação permanente de estar disponível, ativo e documentando cada aspecto da vida para validação externa.
Qual a crítica de Han ao capitalismo contemporâneo?
O filósofo denuncia que a hiperconexão digital e a necessidade constante de exibir cada momento nas redes sociais anularam a capacidade de descanso genuíno das pessoas. Segundo Han, o capitalismo atual transformou todos em empresários de si mesmos, fazendo com que a autoexploração seja mais eficiente que qualquer opressão externa porque vem disfarçada de liberdade e realização pessoal.
Essa dinâmica criou uma sociedade onde o vazio e o silêncio são temidos como fracassos, quando na verdade são justamente nesses períodos de aparente improdutividade que recuperamos soberania sobre nosso tempo e existência. O sistema despreza qualquer momento que não gere valor econômico ou capital social, pressionando as pessoas a estarem sempre fazendo, mostrando ou provando algo.

Como praticar essa forma de resistência no cotidiano?
Outras vozes se somam à perspectiva de Han, como a monja zen Kankyo Tannier, autora de A Magia do Silêncio, que defende que ficar em casa não significa ficar parado, e Marie Kondo, que sugere realizar desabafos criativos para reconectar com a bússola interna. O conceito de hogarterapia transforma a casa em um ambiente saudável e equilibrado que facilita uma vida mais plena.
Algumas sugestões práticas para incorporar essa filosofia incluem:
- Brincar sem culpa com filhos ou pessoas queridas, sem limites de tempo, lembrando que nascemos para jogar e não apenas trabalhar.
- Cozinhar receitas elaboradas com calma, apreciando aromas e processos como uma forma de atenção plena e terapia sensorial.
- Ler ou estudar temas desconectados do trabalho, simplesmente pelo prazer de aprender, imaginar e expandir horizontes sem objetivos produtivos.
- Criar rituais pessoais de desconexão, estabelecendo momentos sagrados onde dispositivos eletrônicos ficam desligados e a presença é total.
O que significa cultivar o silêncio sem culpa?
A proposta de Byung-Chul Han não romantiza o isolamento nem promove o afastamento permanente do mundo, mas defende o direito a um silêncio livre de culpa onde a casa funciona como espaço de liberdade autêntica. Nesse refúgio, não há necessidade de responder à mirada alheia, cumprir expectativas sociais ou justificar escolhas sobre como passar o tempo.
O filósofo afirma que o silêncio da casa é o único lugar onde ainda conseguimos nos escutar verdadeiramente, longe da cacofonia digital e das exigências constantes de performance. Essa prática contemplativa permite redescobrir ritmos próprios, necessidades reais e a capacidade de simplesmente existir sem transformar cada momento em conteúdo ou produto a ser exibido e validado externamente.