Exposição de fotomontagens reconstrói São Paulo

19/01/2010 15:12 / Atualizado em 26/02/2010 10:24

divulgaçãoUma das fotos em exposição
Uma das fotos em exposição

Até o dia 28 de fevereiro, o CCJ (Centro Cultural da Juventude Ruth Cardoso) abriga a exposição FotoFato: A Fotomontagem como Reconstrução da Cidade. Com entrada gratuita, a Mostra foi idealizada pela arquiteta Ana Carmona, que por causa de um desagrado com a cidade de São Paulo decidiu recriar e reinventar a metrópole. Em entrevista ao Catraca Livre, Ana conta dá detalhes sobre o projeto.

Quando começou a realizar a idéia da exposição e por que?
A exposição era, desde o principio, uma exigência (muito justa) do edital do ProaAC. Mas, para além da obrigação, a exposição deu um novo sentido ao meu trabalho: ela foi uma forma de mostrar a fotomontagem como uma técnica a ser apropriada pelos jovens, pelos artistas de rua, e também como uma linguagem de muito potencial de comunicação, uma forma criativa e acessível de manifestação.

Qual a proposta de fazer as fotomontagens da cidade?
De forma geral, o projeto partiu de um descontentamento com a cidade da forma como ela é hoje, e ao mesmo tempo da ideia de que ela pode ser diferente, de que precisamos usar todos os meios possíveis para transformá-la. Minha intenção era mostrar, com as montagens, uma nova cidade, inventada – mas que tem como ponto de partida a cidade real.

Como foi o processo de criação?
As fotos de São Paulo, que foram as bases para a realização das fotomontagens, são todas minhas, tiradas

Fotofato
Fotofato

especificamente para esse projeto. Desde o início, já tinha planejado fotografar alguns lugares em especial, como o bairro da Luz, a Brasilândia, o Jardim América, a Cidade Tiradentes, entre outros. Esses lugares foram escolhidos por mostrarem bem algumas características, contradições ou contrastes da metrópole: eles expressam espacialmente as diferenças entre ricos e pobres, a violência, a relação entre construção e natureza, o modo de vida na cidade. Assim, saí várias vezes para fotografar, em dias diferentes – sempre usando uma câmera digital.

As montagens foram feitas no computador, sem tesoura ou cola, mas num processo de certa forma parecido com o da fotomontagem “de antigamente”: os recursos de composição que usei, no Photoshop, são a sobreposição, a repetição de elementos tirados das fotos originais – não teve manipulação do tipo distorção, efeitos, filtros, essas coisas que são muito comuns para quem trabalha com imagem digital. Também não usei, nas montagens, nenhum outro material além das fotos – em alguns momentos pensei em usar recortes de jornais, folhetos de propaganda, mas isso seria toda uma outra pesquisa…quem sabe não desenvolvo isso mais pra frente, no futuro. Teria muito potencial crítico.

E como foram feitas as ampliações das imagens?
Já a ampliação das imagens, para a exposição, foi um outro processo técnico – tínhamos as imagens em um tamanho pequeno, e essas fotos 10×15 cm tinham que virar um cartaz, um pôster de 1x1m. Então, o que fizemos foi imprimir as montagens, pequenas mesmo, e usar o xerox para ir ampliando, de pouquinho em pouquinho. Essa técnica é muito interessante, porque é relativamente barata e cria um efeito muito bonito, em vez de pixializar as imagens, o xerox “estoura” os contornos. Além da ampliação em xerox, todos as montagens foram “lambidas” com cola nos painéis; o lambe-lambe é uma coisa que, pra mim, tem muito a ver com arte de rua: é barato, simples, permite ocupar espaços da cidade que estavam vazios ou ocupados com publicidade.

A arquitetura é a base da reconstrução das fotos? O quanto ser arquiteta influenciou esse trabalho?
Acho que ser arquiteta foi determinante para o trabalho. A arquitetura trabalha com a forma, a composição, as diversas linguagens de representação (desenho, fotografia), e ao mesmo tempo pensa os problemas urbanos. A “reconstrução da cidade” – a negação da cidade capitalista e a procura de novas formas de se viver – foi uma defesa constante na obra de vários arquitetos (dos construtivistas russos ao movimento moderno brasileiro, passando pelos alemães da Bauhaus e por Le Corbusier), ao longo do século XX. De fato, a arquitetura – entendida como a forma construída da cidade – ocupou um lugar central nas montagens, e signos urbanos como postes, fios elétricos, ruas, viadutos, cartazes, grades, barracos, grandes edifícios envidraçados, serviram de base para a maioria das montagens.

Você disse que baseou a construção das fotomontagens em artistas como o construtivista Rodchenko e o alemão John Heartfield. Onde vc vê a linha de convergência de seu trabalho com os deles?
Acho que a convergência está num entendimento da arte como forma de intervenção na realidade – Heartfield faz isso de maneira crítica, irônica e por vezes cruel, em suas fotomontagens; os trabalhos de Rodchenko, por sua vez, são a verdadeira propaganda, pois esse artista quer contribuir, pela arte, com a transformação do modo de vida, idéia-chave para a União Soviética em seus primeiros anos.

Qual a sensação que você imagina criar nas pessoas quando elas olham as fotomontagens? Existe esse pensamento de interação com o público?
A interação e a participação do público são, para mim, muito importantes. Tento fazer isso não apenas mostrando os meus trabalhos, mas também expondo um pouco da história da fotomontagem e propondo que o público faça as suas próprias montagens, em dois painéis que fazem parte da exposição.

FotoFato: A Fotomontagem como Reconstrução da Cidade