Jovelina Pérola Negra, um testemunho de força e irreverência

Versadora e compositora talentosa, Jovelina é considerada uma influência na luta pelo reconhecimento feminino dentro do samba

16/03/2018 00:00 / Atualizado em 13/03/2020 09:32

Sambista fora dos rótulos, a carioca Jovelina Faria Belfort, mais conhecida pelo nome artístico Jovelina Pérola Negra, transformou-se na década de 1980 em uma das principais referências femininas do gênero.

Chamada de Pérola Negra em homenagem a sua cor, Jovelina pavimentou uma carreira tão densa e intensa quanto sua vida de percalços, vivida sempre no limite. Herdeira do estilo musical de Clementina de Jesus, foi, como ela, empregada doméstica antes de fazer sucesso no mundo artístico.

Integrante do glorioso Império Serrano, Jovelina ascendeu ao cume do samba após a sua estreia em disco em 1985, aos 41 anos de idade. Gravou cinco LPs em apenas quatro anos, entre 1986 e 1989, e consagrou-se no mundo do samba enquanto cantora, compositora e exímia partideira.

Considerada uma das grandes damas do samba, Jovelina é referência feminina no partido-alto e no pagode
Considerada uma das grandes damas do samba, Jovelina é referência feminina no partido-alto e no pagode

Nascida em 21 de julho de 1944, em Botafogo, no Rio de Janeiro, Jovelina cresceu cercada pela oralidade das histórias narradas por seus familiares e acostumou-se a percorrer as rodas de samba suburbanas, garimpando o melhor da música para a sua vida.

De origem humilde, sua história é um testemunho de luta e superação. De empregada doméstica a vendedora ambulante de linguiça, Jovelina nunca desistiu do sonho de se tornar cantora.

Nos anos 1980, a jovem começou a se envolver mais com o universo da música e passou a fazer shows no Vegas Sport Clube, em Coelho Neto. No mesmo ano, integrou a Escola de Samba Império Serrano, em Madureira, onde desfilou por muitos anos na Ala das Baianas. Jovelina também era pastora nas rodas promovidas pelo Botequim do Império.

Representante da geração do pagode de raiz, que revelou também Zeca Pagodinho, Jorge Aragão, Almir Guineto, Arlindo Cruz, Beto Sem Braço, Ana Clara, Fundo de Quintal, Deni de Lima, Jovelina decolou a partir do bunker do Cacique de Ramos.

Versadora sagaz nas rodas e compositora de talento, a artista debutou no mercado fonográfico aos 40 anos com uma participação na coletânea “Raça brasileira”, lançada pela RGE no ano de 1985. Nela, interpretou duas composições que fizeram história: “Bagaço da Laranja”, uma parceria com Arlindo Cruz e Zeca Pagodinho, e “Feirinha da Pavuna”, também de sua autoria.

O envolvimento cada vez maior com o samba rendeu-lhe, entre outras alegrias, a produção de cinco LPs. A sua estreia em disco solo deu-se no ano de 1985, pela gravadora RGE, com o LP “Pérola Negra”. Neste trabalho foram incluídas canções como “Pagode no Serrado”, de Marquinhos Pagodeiro e Zeca Sereno, “Boogie-Woogie da Favela”, de Serginho Meriti e o grande sucesso do disco, a faixa “Menina Você Bebeu”, de autoria de Arlindo Cruz, Acyr Marques e Beto Sem Braço.

Escute o álbum “Pérola Negra”: 

Em 1987, lançou seu segundo álbum, “Luz do Repente”, que além da emblemática faixa título, de Maquinho PQD, Arlindo Cruz e Franco, Jovelina gravou as canções “Filosofia de Bar” (Everaldo da Viola), “Sem Amor Sou Ninguém”, de Dona Ivone Lara e Délcio Carvalho, “Banho de Felicidade”, de Adalto Magalha e Wilson Moreira e “Feira de São Cristóvão”, de Beto Sem Braço e Bandeira Brasil.

No ano seguinte, gravou o álbum “Sorriso Aberto” com as brasas “Precipício”, de Beto Sem Braço, “Elos da Raça”, de Caprí e Silvio Modesto, “Samba Valente”, de Arlindo Cruz, Sombrinha e Acyr Marques, além da faixa título, obra-prima de Guará.

Lançou mais quatro discos recheados de sucessos. São eles: Amigos Chegados”, de 1989, “Sangue Bom”, de 1991, “Vou na Fé”, de 1993 e por fim, “Samba Guerreiro”, de 1996.

Mas seu triunfo durou menos do que gostaríamos. Após onze anos de sucesso, a caminhada gloriosa de Jovelina foi subitamente interrompida no dia 2 de novembro de 1998 devido a um infarto fulminante.

Autora de uma obra musical original em que mistura composições alegres e jocosas – festejando a boêmia e a malandragem sadia com críticas às realidades política e social do país -, Jovelina será para sempre celebrada por sua forte identidade vocal, irreverência e por fortalecer a luta pelo reconhecimento feminino dentro do samba.

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