Tia Cida dos Terreiros, a matriarca do samba em São Mateus
Tendo lançado seu primeiro CD aos 73 anos, Maria Aparecida da Silva Trajano, mais conhecida como Tia Cida dos Terreiros, é uma baluarte ainda pouco conhecida do samba paulistano.
Uma das primeiras moradoras de São Mateus, bairro periférico da zona leste, abriu a sua casa para seus filhos e amigos fazerem samba, tornando o local um reduto do gênero há mais de duas décadas.
Foi no quintal de Tia Cida que surgiram muitos dos sambas do movimento conhecido como Berço do Samba de São Mateus, reunindo compositores e intérpretes em uma das rodas de samba mais famosas da região.
- Entre Terreiros e Quintais: o samba toma conta do Sesc Santo André em novembro
- Sesc Santo André: Música e artes cênicas se entrelaçam em uma programação que revisita o samba
- Grupo Beba do Samba traz a autenticidade envolvente da zona leste ao projeto Roda de Samba no Sesc Santo André
- Exposição em São Paulo: descubra onde curtir arte
Nascida em São Mateus no dia 26 de novembro de 1940, Tia Cida encontrou cedo uma maneira de se aproximar das tradições do gênero: foi dançando lundu com sua mãe e avó na infância que teve contato com os primeiros batuques africanos.
De origem humilde, Tia Cida teve de trabalhar desde cedo para ajudar em casa e sustentar seus filhos. Foi então doméstica, líder de movimentos populares, supervisora de saúde e, mais tarde assistente social, profissão que a acompanharia por cerca de 30 anos.
Mas o samba teve primazia em sua trajetória. Ao lado dos filhos, Tia Cida começou a percorrer rodas de samba espalhadas por São Paulo, com o intuito de garimpar o melhor das batucadas para sua vida.
Logo, a casa onde Cida morava foi incorporada ao circuito das rodas e passou a ser um dos locais de ensaio de um de seus filhos, Marcelo, também conhecido como “Tocão”, cavaquinista do extinto grupo Quinteto em Branco e Preto.
Nos anos 1990, Tia Cida recebe o título de madrinha do Berço do Samba de São Mateus, roda que traz em seu repertório composições que falam do cotidiano do bairro e da complexidade da vida na periferia, além de canções tocadas nos primórdios das rodas feitas nos quintais das “tias”.
O envolvimento cada vez maior com o gênero rendeu-lhe, entre outras alegrias, a gravação de um CD solo. Em seu primeiro trabalho, lançado em 2013, Tia Cida apresenta uma releitura de clássicos como “Lágrima Flor”, de Billy Blanco, “Nem Sei”, de Candeia, “Se Eu Tiver”, de Dolores Duran, “A Cigana”, de Dona Ivone Lara e Délcio Carvalho, além de composições dos componentes do Quinteto.
Atualmente, Tia Cida integra o Movimento Cultural Amigas do Samba, que tem como fonte de pesquisa composições e cantoras a partir da década de 1920, que trata do machismo e da violência contra a mulher. Também participa das ações promovidas pelo Instituto Cultural de Tradição e Memória do Samba de São Mateus, espaço idealizado por Yvison Pessoa com o intuito fomentar a cultura de matriz africana, resgatando a memória musical e histórica do samba e suas vertentes.
Passados 77 anos de idade e mais de 20 de carreira, Tia Cida consolida-se como uma das principais referências femininas e precursoras do samba de São Paulo, gênero que encontrou em São Mateus um ótimo terreno para ganhar corpo.
Por essas e por outras que Maria Aparecida da Silva Trajano merece todo o nosso respeito e nossa humilde homenagem.
Escute o álbum “O Samba Que Vem de Lá”, do Berço do Samba de São Mateus:
- Para celebrar o Mês da Mulher, o Samba em Rede presta homenagens diárias a personagens do gênero feminino que nos inspiram. Saiba mais sobre a campanha e leia outros perfis aqui.