Antigo centro de espionagem vira galeria de arte em Berlim

Por Ligia Fascioni

A repórter (sem diploma) que divide minha alma e meu corpo com mais uma galera, resolveu que ia fazer uma matéria sobre lugares para ver Berlim de cima. Da lista que fiz, só faltavam dois que eu ainda não tinha subido. Um deles foi visitado ontem e, olha, que surpresa, viu?

Teufelsberg (que, numa tradução livre, quer dizer Montanha do Diabo) tem uma história fantástica. É que, para quem não sabe, Berlim é uma cidade plana, planíssima, planérrima. A única elevação (mínima) é no bairro Prenzlauerberg, mas quase nem dá para perceber.

Onde está Teufelsberg agora, foi construída, nos anos 1940, uma universidade técnica concebida para ser o centro da tecnologia nazista e, por conseguinte, o centro da tecnologia no mundo. Com os sonhos megalomaníacos do senhor de bigodinho transformados em poeira, a construção foi bombardeada e destruída.

Depois da 2ª Guerra, a área foi usada para depositar os restos que sobraram da cidade de Berlim. Durante 22 anos,  800 caminhões despejaram diariamente 7000 m³ de entulho no lugar, até formar a montanha de 120 m de altura que existe hoje. Imagina que impressionante: isso tudo era resto de prédios e casas que foram bombardeados!

Com a separação da cidade, os aliados pegaram esse que era o lugar mais alto da região, cobriram de terra, plantaram 1 milhão de árvores e construíram um observatório de escuta de sinais de rádio; instalaram 5 cúpulas com antenas especiais e outros equipamentos para espionagem. O centro de observação foi totalmente desativado com a queda do muro de Berlim, em 1989, pois já não tinha mais utilidade com o país unificado.

Nos anos 1990, o poder público vendeu a área a investidores que pretendiam montar um complexo residencial para apartamentos de alto padrão, com museu, memorial e vários outros projetos, mas conseguiu-se impedir a obra e a área foi declarada de proteção ambiental.

Hoje só é possível entrar no local com um guia autorizado pela associação de artistas e ambientalistas que cuida das ruínas. A visita dura cerca de uma hora e custa € 7. Vale cada centavo.

Eu já sabia disso tudo quando fui, mas não estava preparada para o que vi. Desci da estação de trem S7-Grünewald e perdi-me um pouco no meio da floresta (não há placas para achar o lugar e a caminhada é de cerca de meia hora). Achei que ia visitar umas ruínas decadentes e desfrutar uma bela vista da cidade. E só.

A questão é que eles transformaram a torre mais alta em uma baita galeria de arte especializada em grafite.  A construção é enorme e tanto a torre principal como a cúpula das outras antenas são cobertas por uma espécie de lona branca. O tecido já está puído ou rasgado, o que dá um toque meio sinistro, com os farrapos balançando ao vento que está sempre soprando no local. Os grafites estão por toda parte e alguns são espetaculares. Porque boa parte da lona já se foi, a galeria não tem paredes externas. Aliás, um dos motivos de só poder entrar com guia é que as condições de segurança são bem baixas, pois a construção é, lembremos, apenas numa ruína.